Mantido

Candidato político no Paquistão acusado de blasfêmia

O Comitê manteve a decisão da Meta de remover uma publicação que continha uma acusação de blasfêmia contra um candidato político, dado o potencial de danos iminentes no período pré-eleitoral de 2024 no Paquistão.

Tipo de decisão

Padrão

Políticas e tópicos

विषय
Eleições, Religião
Padrão da comunidade
Planejamento de dano e divulgação de crimes

Regiões/países

Localização
Paquistão

Plataforma

Plataforma
Instagram

Para ler a decisão em urdu, clique aqui.

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Resumo

O Comitê manteve a decisão da Meta de remover uma publicação contendo uma acusação de blasfêmia contra um candidato político. No período pré-eleitoral de 2024 no Paquistão, houve um potencial de danos iminentes. No entanto, o Comitê considera que não é claro que a regra pertinente da Política sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas, que impede os usuários de revelarem a identidade de uma pessoa pertencente a um “grupo sujeito a risco de exposição pública”, inclua figuras públicas acusadas de blasfêmia, no Paquistão ou em outro lugar. É preocupante que esse enquadramento não se traduza facilmente em diferentes culturas e idiomas, gerando confusão para os usuários que tentam entender as regras. A Meta deveria atualizar sua política para deixar claro que os usuários não devem publicar acusações de blasfêmia contra indivíduos identificáveis em locais onde a blasfêmia é um crime e/ou onde há riscos significativos à segurança das pessoas acusadas.

Sobre o caso

Em janeiro de 2024, um usuário do Instagram publicou um vídeo de seis segundos de um candidato que estava fazendo um discurso para as eleições de fevereiro de 2024 no Paquistão. No clipe, o candidato elogia o ex-primeiro-ministro Nawaz Sharif, afirmando que “the person after God is Nawaz Sharif” (a pessoa que vem depois de Deus é Nawaz Sharif). O vídeo tinha uma sobreposição de texto em que o usuário critica esse elogio por “crossing all limits of kufr” (ultrapassar todos os limites da kufr), alegando ser ele um infiel de acordo com os ensinamentos do islã.

Três usuários do Instagram denunciaram esse conteúdo no dia seguinte à sua publicação, e um analista humano considerou que ele não violava os Padrões da Comunidade da Meta. Os usuários que denunciaram o conteúdo não fizeram uma apelação dessa decisão. Vários outros usuários denunciaram a publicação ao longo dos dias que se seguiram, mas a Meta alegou que o conteúdo não violava suas regras, após a análise humana e o encerramento automático de algumas denúncias.

Em fevereiro de 2024, o sistema de Operações de Análise Antecipada de Alto Risco (HERO, pela sigla em inglês) da Meta identificou o conteúdo para análise adicional com base em indicações de alta probabilidade de que ele se tornasse viral. O conteúdo foi escalonado para especialistas em políticas da Meta, que o removeram por violar a regra da Política sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas baseada no conceito de “exposição pública”. A Meta define “exposição pública” como “exposição da identidade ou de locais afiliados a qualquer pessoa que supostamente seja membro de um grupo sujeito a risco de exposição pública”. De acordo com a orientação interna da Meta para analistas, as pessoas acusadas de blasfêmia no Paquistão constituem um grupo sujeito a risco de exposição pública. Quando o vídeo foi sinalizado pelo HERO e removido, já tinha sido visualizado 48 mil vezes e compartilhado mais de 14 mil vezes. Em março de 2024, a Meta encaminhou o caso ao Comitê de Supervisão.

As ofensas relacionadas com a religião são contra a lei no Paquistão, e as regras do país que regem as redes sociais exigem a remoção de conteúdos online “blasfemos”.

Principais conclusões

O Comitê considera que, dados os riscos associados com as acusações de blasfêmia no Paquistão, a remoção do conteúdo estava em conformidade com o fundamento da Política sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas para impedir “danos no meio físico”.

Não é intuitivo para os usuários que os riscos que correm certos grupos de religiões ou crenças minoritários estejam relacionados à “exposição pública”, conforme a acepção comum (em outras palavras, riscos resultantes da divulgação de um status privado). O uso do termo “exposição pública” nesse contexto gera confusão, tanto em inglês como em urdu. Também não está claro que as pessoas acusadas de blasfêmia se considerariam como membros de um “grupo” sujeito a risco de “exposição pública”, ou que os políticos pertenceriam a um “grupo sujeito a risco de exposição pública” por discursos feitos em público, especialmente durante as eleições. Resumindo, a política simplesmente não esclarece ao usuários que o vídeo seria violador.

Além disso, a política não especifica quais contextos são abrangidos por sua linha contra a exposição pública e quais grupos são considerados como sujeitos a risco. Ela também não declara explicitamente que as pessoas acusadas de blasfêmia são protegidas nos lugares onde essas acusações geram um risco iminente de danos. A Meta explicou que embora ela tenha uma lista interna de grupos sujeitos a risco de exposição pública, ela não disponibiliza essa lista publicamente, para impedir que agentes maliciosos contornem as regras. O Comitê não concorda que essa razão justifique a falta geral de clareza da política. Uma definição clara dos contextos de exposição pública e dos grupos sujeitos a esse risco informaria os potenciais alvos de alegações de blasfêmia de que essas alegações violam explicitamente as regras da Meta e serão removidas. Isso, por sua vez, poderia reforçar as denúncias por usuários acusados de blasfêmia em contextos onde a blasfêmia gera riscos legais e de segurança, incluindo o Paquistão. Uma maior especificidade da regra voltada para o público poderia também levar a uma aplicação mais precisa pelos analistas humanos.

O Comitê também está preocupado com o fato de vários analistas terem considerado o conteúdo como sendo não violador, embora vários usuários o tenham repetidamente denunciado e a orientação interna da Meta, que é mais clara, inclua explicitamente as pessoas acusadas de blasfêmia no Paquistão em seus grupos sujeitos a risco de exposição pública. Foi somente quando o sistema HERO da Meta identificou o conteúdo, aparentemente depois de ele ter se tornado viral, que o conteúdo foi escalonado para especialistas internos em políticas e considerado como violador. Portanto, os analistas em escala da Meta deveriam receber treinamento mais personalizado, especialmente em contextos como o do Paquistão.

Decisão do Comitê de Supervisão

O Comitê de Supervisão mantém a decisão da Meta de remover o conteúdo.

Ele recomenda que a Meta:

  • Atualize a Política sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas para deixar claro que os usuários não devem publicar acusações de blasfêmia contra indivíduos identificáveis em locais onde a blasfêmia é um crime e/ou há riscos significativos à segurança das pessoas acusadas de blasfêmia.
  • Treine os analistas em escala que abrangem locais onde as acusações de blasfêmia gerem um risco iminente de danos à pessoa acusada, fornecendo-lhes orientações de monitoramento mais específicas para identificarem com eficácia e levarem em consideração as nuances e o contexto em publicações que contenham esses tipos de alegações.

*Os resumos de casos fornecem uma visão geral dos casos e não têm valor de precedente.

Decisão completa sobre o caso

1. Descrição do caso e histórico

No final de janeiro de 2024, um usuário do Instagram publicou um videoclipe de seis segundos mostrando um candidato às eleições de fevereiro de 2024 no Paquistão fazendo um discurso em urdu. No clipe, o candidato elogia o ex-primeiro-ministro Nawaz Sharif, afirmando que “the person after God is Nawaz Sharif” (a pessoa que vem depois de Deus é Nawaz Sharif). O vídeo tem uma sobreposição de texto em que o usuário critica esse elogio por “crossing all limits of ‘kufr’” (ultrapassar todos os limites da “kufr”), em que “kufr” significa não acreditar em Alá, de acordo com os ensinamentos do islã.

Três usuários do Instagram denunciaram esse conteúdo no dia seguinte à sua publicação, e um analista humano considerou que ele não violava os Padrões da Comunidade da Meta. Os usuários que fizeram as denúncias não apelaram da decisão. No dia seguinte, outros dois usuários denunciaram o conteúdo. Os analistas decidiram que o conteúdo não era violador em todas as instâncias. Três dias depois da publicação, outro usuário denunciou o conteúdo. Os analistas examinaram as denúncias e concluíram que o conteúdo não violava as regras da Meta. Nos dias que se seguiram, o conteúdo foi denunciado por outros usuários mais nove vezes, mas a Meta encerrou automaticamente essas denúncias com base nas decisões anteriores. Todas as denúncias de usuários foram analisadas no mesmo dia da denúncia.

No início de fevereiro, cinco dias depois da publicação, o sistema de Operações de Análise Antecipada de Alto Risco (HERO, pela sigla em inglês) identificou o conteúdo para análise adicional com base em sinais que indicavam uma alta probabilidade de que ele se tornasse viral. O sistema HERO escalonou o conteúdo para especialistas em políticas da Meta. Eles o removeram por violar o Padrão da Comunidade sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas por “exposição pública: expor a identidade ou os locais afiliados com qualquer pessoa que seja supostamente um membro de um grupo sujeito a risco de exposição pública”. Com base na orientação interna da Meta para analistas, as pessoas acusadas de blasfêmia no Paquistão constituem um grupo sujeito a risco de exposição pública. Quando o videoclipe foi removido, já tinha sido visualizado cerca de 48 mil vezes e compartilhado mais de 14 mil vezes. No final de março de 2024, a Meta encaminhou o caso ao Comitê de Supervisão.

O Comitê observou o contexto a seguir ao tomar uma decisão.

O videoclipe foi publicado durante os preparativos para as eleições de fevereiro de 2024 no Paquistão, em que o irmão do ex-primeiro-ministro Nawaz Sharif, Shehbaz Sharif, foi eleito primeiro-ministro por mais um mandato. O candidato político que elogiou Nawaz Sharif no vídeo pertencia ao mesmo partido político dos irmãos Sharif.

Com base em uma pesquisa encomendada pelo Comitê, havia muitos vídeos online que destacavam o vídeo e ecoavam a alegação de blasfêmia. Por outro lado, há outras publicações que compartilhavam o videoclipe de seis segundos mas que contestavam a acusação de “kufr”, alegando que o clipe editado mostra o discurso completo do candidato fora de contexto. Outra publicação que incluía 60 segundos do mesmo discurso, gravado por outra câmera, foi compartilhada mais de mil vezes e visualizada cerca de 100 mil vezes. Esse vídeo mais longo fornece um contexto mais completo da referência a Alá feita pelo candidato. Neste caso, a sobreposição de texto no videoclipe alegava que a referência era blasfema.

O Paquistão criminaliza as ofensas relacionadas com a religião, de acordo com as seções 295-298 do Código Penal do Paquistão, o que inclui a profanação do Alcorão, observações depreciativas sobre o Profeta Maomé e a intenção deliberada e maliciosa de ultrajar “sentimentos religiosos”. As regras sobre as redes sociais no Paquistão (2021) exigem a remoção de todo conteúdo online que for “blasfemo” nos termos do código penal. Por causa disso, determinadas pessoas, frequentemente minorias religiosas e pessoas percebidas como críticas do islamismo, têm sido acusadas de blasfêmia por suas publicações online e condenadas à morte. Segundo o Relator Especial da ONU sobre liberdade de religião ou crença, as minorias religiosas são frequentemente alvo das leis contra blasfêmia e genericamente designadas como “blasfemadoras” ou “apóstatas” (A/HRC/55/47, parágrafo 14). No Paquistão, os muçulmanos Ahmadiyya e os cristãos estão entre esses alvos (A/HRC/40/58, parágrafo 37). O Relator Especial da ONU observou também que mesmo as pessoas pertencentes às denominações religiosas principais, inclusive dentro do islamismo, que se opõem ativamente a difamar a respectiva religião por meio de leis contra blasfêmia, correm um “risco aumentado de serem acusadas de ‘traição’
ou ‘blasfêmia’ e de serem submetidas a penalidades de retaliação” (A/HRC/28/66, parágrafo 7; consulte também o comentário público PC-29617). As acusações de blasfêmia também são usadas para intimidar opositores políticos.

Acusações de blasfêmia também têm causado linchamentos por multidões no Paquistão, as quais têm ocorrido nesse país durante décadas, embora não sempre envolvendo as redes sociais. Entre os incidentes recentes estão os seguintes:

  • Em 2021, uma multidão atacou uma fábrica de artigos esportivos e espancou e queimou um homem do Sri Lanka até causar a sua morte, após ele ter sido acusado de profanar cartazes que exibiam o nome do Profeta Maomé. Um vídeo compartilhado nas redes sociais mostrou a multidão arrastando o corpo do homem gravemente ferido antes de ser queimado até a morte, sob a aclamação de centenas de espectadores.
  • Em fevereiro de 2023, uma multidão arrebatou da custódia da polícia um homem muçulmano e o espancou até a morte após alegar que ele tinha profanado páginas do Alcorão. O vídeo do incidente circulou nas redes sociais, mostrando as pessoas arrastando o homem pelas pernas enquanto o espancavam com bastões e barras de metal.
  • Em agosto de 2023, multidões atacaram igrejas cristãs, incendiando-as e danificando casas vizinhas e itens domésticos, depois que dois párocos tinham supostamente rasgado páginas do Alcorão e escrito observações insultantes nelas. Alguns párocos tiveram que fugir de suas casas para escapar.
  • Em fevereiro de 2024, uma mulher foi salva pela polícia de um possível ataque de uma multidão após esta ter achado, por engano, que as palavras impressas em seu vestido fossem versos do Alcorão. A multidão tinha se reunido ao redor do restaurante onde a mulher estava comendo. Mais tarde ela pediu desculpas em público.
  • Em maio de 2024, um homem idoso cristão, Nazir Masih, foi atacado por uma multidão por ter supostamente profanado o Alcorão. O homem sofreu vários ferimentos na cabeça e foi levado ao hospital, onde morreu. No início de junho, uma multidão de 2.500 pessoas realizou uma manifestação para expressar apoio ao homicídio.
  • Em junho de 2024, enquanto o Comitê estava examinando este caso, um turista local foi assassinado e seu corpo foi queimado depois de ele ser acusado de profanar o Alcorão. A polícia tinha capturado o homem, mas centenas de pessoas se reuniram em torno da delegacia onde ele estava detido, exigindo que ele fosse entregue a elas. Em seguida, a multidão atacou as instalações e arrastou o homem para fora. A multidão queimou o corpo após ter espancado o homem até a morte. Até o final de junho, a polícia tinha prendido 23 pessoas envolvidas no ataque.

Também houve políticos que foram alvo de violência relacionada com blasfêmia. Um dos incidentes de mais alto perfil envolveu o ex-governador do Punjab Salman Taseer, que foi assassinado por seu próprio guarda-costas em 2011. Taseer tinha defendido a revogação das leis contra blasfêmia do Paquistão. O guarda-costas foi condenado à morte, com multidões indo para as ruas para protestar. Após a execução do guarda-costas, os manifestantes ergueram um santuário ao redor do seu túmulo. Outro incidente, ocorrido em 2011, envolveu agressores que assassinaram o ministro federal de relações com as minorias, Shahbaz Bhatti. Assim como Taseer, Bhatti tinha criticado as leis contra blasfêmia do Paquistão.

Além dos procedimentos especiais da ONU, organizações de direitos humanos e de liberdade religiosa, assim como outros governos, condenaram a violência coletiva relacionada com a blasfêmia no Paquistão decorrente de acusações de blasfêmia. Especialistas consultados pelo Comitê confirmaram que uma denúncia à polícia contra uma pessoa acusada de blasfêmia pode resultar na detenção da pessoa para protegê-la contra as multidões. No entanto, como mostrado pelo incidente de junho de 2024, a custódia da polícia pode ser insuficiente para proteger os acusados de blasfêmia contra a violência das multidões.

Apesar disso, os processos por blasfêmia continuam no Paquistão, e as publicações nas redes sociais têm constituído a base para as acusações. Por exemplo, um professor está enfrentando a sentença de morte e está preso há mais de 10 anos por uma publicação no Facebook em 2013, supostamente blasfema. Seu advogado foi assassinado em 2014 por defendê-lo. Em 2020, a polícia apresentou um caso de blasfêmia contra um defensor dos direitos humanos por uma publicação nas redes sociais. Em março de 2024, um estudante de 22 anos de idade foi acusado de blasfêmia e condenado à morte por ter supostamente enviado imagens depreciativas sobre o Profeta Maomé e suas esposas via WhatsApp. O governo paquistanês tem um histórico de monitoramento de conteúdo online por blasfêmia, e ordenou às empresas de redes sociais que restrinjam o acesso a publicações que ele considera blasfemas. O governo também se reuniu com a Meta para falar sobre publicações que ele considera blasfemas.

A Meta relatou, em seu relatório de transparência de julho de 2023 – dezembro de 2023, ter restringido o acesso no Paquistão a mais de 2.500 publicações denunciadas pela Autoridade de Telecomunicações do Paquistão por terem supostamente violado as leis locais, incluindo publicações acusadas de blasfêmia e “sentimento antirreligioso”. Essas denúncias abrangem somente os conteúdos que a Meta remove com base em uma solicitação do governo, mas que não violam as políticas da Meta sobre conteúdo (ou seja, as publicações sinalizadas pelo governo que a empresa remove por violar a regra da Meta sobre “exposição pública” não seriam incluídas nesses dados). Com base nas informações fornecidas pela Meta sobre este caso, parece não haver indicação de que o governo tenha solicitado a análise ou a remoção desse conteúdo. Como membro da Global Network Initiative, a Meta se comprometeu a respeitar a liberdade de expressão ao enfrentar restrições governamentais amplas ao conteúdo.

2. Envios de usuários

O usuário não forneceu uma declaração para este caso.

3. Políticas de conteúdo e envios da Meta

I. Políticas de conteúdo da Meta

Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas

A política sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas visa “prevenir e interromper danos no meio físico e comportamentos de imitação”, proibindo a “facilitação, organização, promoção ou aceitação de determinadas atividades prejudiciais ou criminosas direcionadas a pessoas, empresas, bens ou animais”. Duas linhas políticas nos Padrões da Comunidade lidam com “exposição pública”: a primeira é aplicada em escala, e a segunda exige “contexto adicional para a aplicação” (o que significa que essa linha política só é aplicada após o escalation). Neste caso se aplica a primeira linha política. Ela proíbe explicitamente a “exposição pública: exposição da identidade ou de locais afiliados a qualquer pessoa que supostamente seja membro de um grupo sujeito a risco de exposição pública”. Essa linha política não explica quais grupos são considerados como “grupos sujeitos a risco de exposição pública”. A segunda linha política, que só é aplicada após um escalation, também proíbe a “exposição pública: expor a identidade de uma pessoa e fazer a pessoa correr risco de danos” para uma lista específica de grupos vulneráveis, incluindo membros da comunidade LGBTQIA+, mulheres sem véu, ativistas e prisioneiros de guerra. As pessoas acusadas de blasfêmia não estão entre os grupos listados.

Segundo a orientação interna da Meta fornecida aos analistas, os “grupos sujeitos a risco de exposição pública” nos termos da primeira linha política sobre exposição pública incluem as pessoas acusadas de blasfêmia no Paquistão, além de outros locais especificados. Além disso, a “exposição pública” deve ser involuntária; uma pessoa não pode expor publicamente a si mesma (por exemplo, declarando-se como membro de um grupo sujeito a risco de exposição pública). Para violar a política da orientação interna da Meta, é irrelevante se a alegação de blasfêmia é fundamentada ou se é falsa. Uma mera alegação é suficiente para incluir a pessoa acusada no grupo “sujeito a risco” e para que o conteúdo seja removido.

Tolerância à política

A Meta pode aplicar ao conteúdo uma tolerância à política quando o fundamento (o texto que introduz cada Padrão da Comunidade) e os valores da Meta exigem um resultado diferente de uma interpretação estrita das regras (estabelecidas na seção “não publicar” e na lista de conteúdos proibidos). Em decisões anteriores, o Comitê recomendou que a Meta forneça uma explicação pública dessa tolerância à política (Produtos farmacêuticos do Sri Lanka, recomendação nº 1, Violência comunitária no estado indiano de Odisha). As recomendações pertinentes foram aceitas pela Meta e estão plenamente implementadas ou em andamento, de acordo com a última avaliação do Comitê.

II. Envios da Meta

A Meta explicou que as pessoas acusadas de blasfêmia no Paquistão foram adicionadas à sua lista interna de “grupos sujeitos a risco de exposição pública” em conformidade com a Política sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas no final de 2017, após a violência relacionada com alegações de blasfêmia no país. Como parte de suas iniciativas de integridade nas eleições de 2024 no Paquistão, a Meta priorizou o monitoramento de conteúdos que incluam acusações de blasfêmia devido ao alto risco de danos no meio físico, incluindo violência extrajudicial, decorrente dessas alegações. A Meta afirma que essas iniciativas de integridade resultaram na identificação do conteúdo, neste caso.

Na sua indicação do caso, a Meta observou a tensão entre voz e segurança nesse tipo de conteúdo durante o período de eleições. A Meta assinalou o valor de interesse público na crítica aos candidatos políticos, reconhecendo ao mesmo tempo os diversos riscos à segurança gerados pelas acusações de blasfêmia no Paquistão, como a violência e a morte contra políticos.

A Meta considerou que o texto sobreposto no videoclipe, que afirmava que o candidato eleitoral tinha “crossed all limits of kufr” (ultrapassado todos os limites da kufr), constituía uma alegação de blasfêmia. Para a Meta, esse texto insinua que o candidato político cometeu “shirk” – ou seja, a crença em mais de um Deus ou considerar qualquer coisa ou qualquer pessoa como igual a Deus – ou acusa o candidato político de violar as leis contra blasfêmia do Paquistão. Em ambos os casos, a Meta determinou que o risco de dano no meio físico superava o valor expressivo potencial do vídeo. A empresa esclareceu que se o vídeo não incluísse o texto sobreposto, ele teria permanecido na plataforma.

A Meta também forneceu uma explicação sobre o sistema HERO que ela usa para detectar conteúdos de alto risco (além das denúncias de usuários): o alto risco de um conteúdo específico depende da probabilidade de que ele se torne viral. A Meta usa diversos sinais para prever se um conteúdo se tornará viral. Esses sinais incluem a visibilidade de um conteúdo na tela de um usuário, mesmo parcialmente, o idioma da publicação e o principal país em que está sendo compartilhado no momento em que é detectado. O HERO não está vinculado a um Padrão da Comunidade específico. Além disso, a Meta não tem uma definição estática ou estabelecida para “alto efeito viral”. Em vez disso, o alto efeito viral é determinado por fatores que variam nos diferentes mercados. Como resultado, a maneira em que a Meta pondera os sinais de alto efeito viral durante eventos de alto risco, que podem incluir períodos eleitorais, varia. As equipes internas da Meta podem utilizar a contagem de visualizações durante os períodos eleitorais para lidar com riscos específicos. Portanto, o HERO identifica conteúdos relacionados com qualquer política, independentemente da probabilidade de violação de uma política.

O Comitê fez perguntas à Meta relacionadas com a regra sobre “grupos sujeitos a risco de exposição pública” da Política sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas e sua aplicação, as iniciativas da empresa para promover a integridade eleitoral no Paquistão e as solicitações do governo de remoção de conteúdos em conformidade com as leis contra blasfêmia do Paquistão e os Padrões da Comunidade da Meta. A Meta respondeu a todas as perguntas.

4. Comentários públicos

O Comitê de Supervisão recebeu três comentários públicos que cumpriam os termos para envio. Dois dos comentários foram enviados da Europa, e um do Centro e Sul da Ásia. Para ler comentários públicos enviados com consentimento de publicação, clique aqui.

Os envios abordaram os seguintes temas: a moderação da Meta de publicações contendo alegações de blasfêmia, o impacto dessas alegações e dos processos correspondentes no Paquistão, e o papel desempenhado pelas acusações de blasfêmia contra figuras públicas no Paquistão e em outros países.

5. Análise do Comitê de Supervisão

Este caso destaca a tensão entre os valores da Meta de proteção da voz, incluindo a crítica política durante as eleições, e de promoção da segurança das pessoas acusadas de blasfêmia, dadas as ameaças à vida e à liberdade que essas acusações podem gerar no Paquistão.

O Comitê analisou a decisão da Meta nesse caso em relação às políticas de conteúdo, aos valores e às responsabilidades de direitos humanos da Meta. Também avaliou as implicações desse caso quanto à abordagem mais ampla da Meta em relação à governança de conteúdo.

5.1 Conformidade com as políticas de conteúdo da Meta

I. Regras sobre conteúdo

O Comitê considera que a regra da política da Meta que proíbe revelar a identidade de qualquer pessoa que supostamente seja membro de um “grupo sujeito a risco de exposição pública” não foi violada, por não ser claro que essa regra inclua figuras públicas acusadas de blasfêmia no Paquistão ou em outro lugar.

No Paquistão, embora certos grupos de religiões ou crenças minoritários possam ser considerados como “grupos sujeitos a risco” de danos, não é intuitivo que esses riscos estejam relacionados à “exposição pública”, conforme a acepção comum (ou seja, riscos resultantes da divulgação de um status privado). Analogamente, as pessoas acusadas de blasfêmia não se consideram necessariamente como membros de um “grupo” (em comparação com indivíduos que compartilham uma característica protegida, o que incluiria as minorias religiosas). Além disso, não é intuitivo que os políticos pertençam a um “grupo sujeito a risco de exposição pública” por informações reveladas em discursos públicos, especialmente em contexto eleitoral. De fato, outras partes das regras da Meta nessa área distinguem “figuras políticas” e não lhes fornecem proteção contra determinadas formas de “exposição pública”.

O Comitê considera que, embora a orientação interna para analistas contenha orientações de monitoramento mais específicas que listam os “grupos sujeitos a risco de exposição pública” (ou, mais precisamente, os contextos) cobertos pela política, a política voltada para o público não contém os elementos básicos que proibiriam claramente o conteúdo neste caso.

No entanto, no exercício de sua função de adjudicação e supervisão, o Comitê considera que a leitura da proibição estabelecida pela Política sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas à luz do fundamento da política justifica a remoção do conteúdo, conclusão essa que é reforçada pela análise de direitos humanos abaixo. De acordo com o fundamento da política, o Padrão da Comunidade sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas tem o objetivo de “prevenir e interromper danos no meio físico”, inclusive proibindo as pessoas de “facilitar, organizar, promover ou aceitar determinadas atividades prejudiciais ou criminosas direcionadas a pessoas”. A Meta permite debater a legalidade ou gerar reconhecimento de atividades prejudiciais ou criminosas, desde que a publicação não defenda nem coordene atos danosos. Neste caso, o Comitê considera que a remoção do conteúdo está alinhada com o fundamento da política de prevenir dano no meio físico, dados os riscos legais e de segurança que as acusações de blasfêmia podem gerar no Paquistão. A publicação do usuário não pode ser interpretada como uma publicação que gera reconhecimento ou discute a legalidade da blasfêmia no Paquistão. Na verdade, ela faz o contrário: acusa alguém de blasfêmia em um lugar onde esse alguém poderia enfrentar um processo e/ou correr riscos à segurança. A acusação contra o candidato político ocorreu logo antes das eleições de fevereiro de 2024 no Paquistão, quando o candidato estaria ativamente envolvido na campanha eleitoral. O potencial de dano iminente, como violência de justiceiros e processo penal, estava presente. Isso equivaleu a “facilitar” uma atividade prejudicial ou criminosa proibida pela Política sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas.

Uma minoria do Comitê considera que o conteúdo deveria ser removido com base no espírito da política. Para a minoria, essa exceção à política só deveria ser usada em via altamente excepcional, especialmente para remover conteúdo. No entanto, existem situações, como a deste caso, em que é necessário lidar com situações de risco aumentado de danos que não são expressamente proibidas nas regras específicas de “não publicar” da Meta. Esse é o caso aqui, porque o Padrão da Comunidade sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas não estabelece expressamente que as acusações de blasfêmia no Paquistão são proibidas. No entanto, a remoção está em conformidade com o espírito da política de modo geral e com seu objetivo de reduzir os danos. A minoria considera que quando a Meta remove conteúdo com base no “espírito da política”, isso deve ser documentado, de maneira que seu uso possa ser rastreado e, em seguida, formar uma base para identificar lacunas na política que devam ser resolvidas.

5.2 Conformidade com as responsabilidades da Meta relativas aos direitos humanos

O Comitê considera que a remoção do conteúdo da plataforma foi coerente com as responsabilidades da Meta com os direitos humanos, embora a Meta deva lidar com as preocupações ligadas à clareza de suas regras nessa área e à velocidade de seu monitoramento.

Liberdade de expressão (Artigo 19 do PIDCP)

O artigo 19 do PIDCP contempla a liberdade de “buscar, receber e transmitir informações e ideias de todos os tipos” e prevê uma ampla proteção da expressão, incluindo “discurso político” e comentários sobre “assuntos públicos”. Isso inclui ideias e pontos de vista que podem ser polêmicos ou profundamente ofensivos (Comentário Geral 34, parágrafo 11). O valor de expressão é particularmente alto ao se discutir assuntos de interesse público, e a liberdade de expressão é considerada como uma “condição essencial” para o exercício eficaz do direito de voto das pessoas durante as eleições (Comentário Geral 25, parágrafo 12). Todas as figuras públicas, inclusive as que exercem a mais alta autoridade política, como os chefes de estado ou de governo, estão legitimamente sujeitas a crítica e a oposição política (Comentário Geral 34, parágrafo 38).

As leis contra blasfêmia são incompatíveis com o artigo 19 do PIDCP (Comentário Geral 34, parágrafo 48). Segundo o Alto Comissariado da ONU para Direitos Humanos, o direito à liberdade de religião ou crença não inclui o direito a ter uma religião ou crença isenta de crítica ou ridiculização. Com base nisso, as leis contra blasfêmia deveriam ser revogadas (consulte o Comentário Geral 34, parágrafo 48, e A/HRC/31/18, parágrafos 59-60; Plano de ação de Rabat, relatório A/HRC/22/17/Ad.4, parágrafo 19.) De fato, as leis contra blasfêmia frequentemente cultivam a intolerância religiosa e levam à perseguição das minorias religiosas e da dissensão. Em vez de criminalizar a blasfêmia e o discurso que reflete a intolerância religiosa, em 2011 a comunidade internacional se uniu em torno da resolução 16/18 do Conselho de Direitos Humanos da ONU, que estabeleceu um kit de ferramentas úteis, compostas por medidas comprovadas ao longo do tempo, para combater a intolerância religiosa, recorrendo ao banimento de discursos apenas em casos de risco de violência iminente.

Quando um Estado aplica restrições à expressão, elas devem atender aos requisitos de legalidade, objetivo legítimo e necessidade e proporcionalidade, segundo o parágrafo 3 do Artigo 19 do PIDCP; Comentário Geral 34, parágrafos 22 e 34. Esses requisitos costumam ser chamados de "teste tripartite". O Comitê usa essa estrutura para interpretar as responsabilidades de direitos humanos da Meta de acordo com os Princípios Orientadores da ONU sobre Empresas e Direitos Humanos, com os quais a própria Meta se comprometeu em sua Política Corporativa sobre Direitos Humanos. O Comitê faz isso tanto em relação à decisão de conteúdo individual sob análise quanto ao que isso diz sobre a abordagem mais ampla da empresa à governança de conteúdo. Como afirmou o Relator Especial da ONU sobre liberdade de expressão, embora "as empresas não tenham obrigações governamentais, seu impacto é do tipo que exige que avaliem o mesmo tipo de questões sobre a proteção do direito de seus usuários à liberdade de expressão" (A/74/486, parágrafo 41).

I. Legalidade (clareza e acessibilidade das regras)

O princípio da legalidade exige que as regras que limitam a expressão sejam acessíveis e claras, formuladas com precisão suficiente para permitir que um indivíduo regule sua conduta de acordo com elas (Comentário Geral nº 34, parágrafo 25). Além disso, essas regras "podem não conceder liberdade de ação irrestrita para a restrição da liberdade de expressão aos encarregados de [sua] execução" e devem "fornecer instrução suficiente aos encarregados de sua execução para permitir-lhes determinar quais tipos de expressão são propriamente restritas e quais tipos não são," (Ibid). O Relator Especial da ONU sobre a liberdade de expressão declarou que, quando aplicadas à governação do discurso online por parte de intervenientes privados, as regras devem ser claras e específicas (A/HRC/38/35, parágrafo 46). As pessoas que usam as plataformas da Meta devem ser capazes de acessar e entender as regras, e os moderadores de conteúdo devem ter orientações claras sobre sua aplicação.

O Comitê considera que a Política sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas que proíbe identificar um membro de um grupo sujeito a risco de exposição pública não é clara para os usuários. Em primeiro lugar, o Comitê considera que o uso do termo “exposição pública” gera confusão, tanto em inglês como nos diversos idiomas em que a regra é traduzida, incluindo o urdu. Embora o termo “exposição pública” se refira, de modo geral, à revelação não consensual do status privado de outra pessoa e seja comumente usado no contexto da divulgação não consensual da orientação sexual ou da identidade de gênero de uma pessoa, esse termo é menos usado em outros contextos, como relativamente à afiliação religiosa ou a uma crença. Normalmente, as pessoas acusadas de blasfêmia não consideram que estão correndo risco de “exposição pública”. Além disso, a tradução da locução “grupo sujeito a risco de exposição pública” em outros idiomas é problemática. Por exemplo, a tradução em urdu da versão pública da política sobre exposição pública é particularmente pouco clara. Um falante de urdu no Paquistão não entenderia que “شناخت ظاہر کرنا” significa “risco de exposição pública”. Além disso, a tradução também não especifica o significado de “risco de exposição pública”. O Comitê está preocupado com o fato de que o enquadramento atual não esteja traduzido facilmente através de diferentes contextos culturais, podendo gerar confusão para os usuários que tentam entender as regras. A falta de transparência é exacerbada pelo fato de que as Diretrizes da Comunidade do Instagram não têm um vínculo claro com a política da Meta sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas, tornando mais difícil que o usuário saiba quais regras aplicar a um conteúdo que acuse alguém de blasfêmia.

Em segundo lugar, a política (voltada para o público) não especifica quais contextos são abrangidos por essa linha política e quais grupos são considerados como sujeitos a risco. Essa linha política não declara expressamente que as pessoas acusadas de blasfêmia nos lugares onde essas acusações geram um risco iminente de danos são protegidas. Isso é especialmente problemático para membros de minorias religiosas, que com maior frequência são alvos de alegações de blasfêmia, em particular em lugares onde os indivíduos podem, por motivos de segurança, manter discrição sobre sua afiliação religiosa ou suas crenças e ser vulneráveis à “exposição pública”. Para essas comunidades, é importante que as regras inspirem confiança no fato de que os conteúdos que põem diretamente em perigo a segurança delas sejam proibidos. Embora a orientação interna para analistas seja mais clara, o fato de que os analistas neste caso tenham repetidamente e incorretamente não identificado a violação da orientação em questão pela publicação do usuário indica que ela ainda é insuficiente.

A Meta explicou que ela não especifica publicamente a lista de grupos sujeitos a risco de exposição pública abrangidos pela política, para impedir que agentes maliciosos contornem as regras. O Comitê não concorda que essa consideração justifique a falta de clareza da política. Uma definição clara dos contextos de exposição pública e dos grupos sujeitos a esse risco abrangidos por essa política informaria os potenciais alvos de alegações de blasfêmia de que essas alegações violam explicitamente as regras da Meta e serão removidas. De fato, a Meta já faz isso na outra linha política contra “exposição pública” que exige mais contexto para ser aplicada. Essa outra linha política, que era irrelevante para este caso, lista diversos grupos sujeitos a risco de exposição pública (por exemplo: membros da comunidade LGBTQIA+, mulheres sem véu, desertores e prisioneiros de guerra) que pertencem ao seu escopo. Portanto, a aplicação da mesma abordagem com relação às alegações de blasfêmia não se desviariam da abordagem atual da Meta no que diz respeito à clareza para seus usuários em outras linhas políticas comparáveis, em que os riscos e os prós e contras parecem ser análogos. Por sua vez, fornecer essa clareza poderia reforçar as denúncias por usuários acusados de blasfêmia em contextos nos quais isso gera riscos legais e de segurança, inclusive no Paquistão. Uma maior especificidade da regra voltada para o público poderia também levar a uma aplicação mais precisa pelos analistas humanos.

O Comitê recomenda vivamente que a Meta especifique, em suas regras voltadas para o público, que as acusações de blasfêmia e apostasia contra indivíduos são proibidas em determinados locais onde elas geram riscos legais e de segurança. Isso ficaria não somente muito mais claro em uma regra independente, separada do conceito de “exposição pública”, mas também seria coerente com a abordagem da Meta de listar grupos sujeitos a risco em outras partes da Política sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas. O Comitê não contempla cada detalhe específico a ser estabelecido no texto voltado para o público do Padrão sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas. Mas, como mínimo absoluto, os elementos pertinentes do conteúdo proibido, como os tipos de grupos que são protegidos, os tipos de locais aos quais a regra se aplica e os tipos de expressões abrangidas pela proibição, proporcionaria mais clareza para os usuários. Isso dissiparia a preocupação da Meta sobre a possibilidade de que agentes maliciosos tentem contornar as regras, e ao mesmo tempo faria com que os possíveis alvos de acusações de blasfêmia ficassem cientes de que esse tipo de conteúdo é proibido.

II. Objetivo legítimo

Qualquer restrição à liberdade de expressão também deve perseguir um ou mais dos objetivos legítimos listados no PIDCP, o que inclui a proteção dos direitos de terceiros (artigo 19, parágrafo 3 do PIDCP). Isso inclui os direitos das pessoas à vida, à liberdade e à segurança (artigos 6 e 9 do PIDCP). O Comitê reconhece também que proteger as pessoas contra ofensas não é considerado um objetivo legítimo pelos padrões internacionais de direitos humanos. O Comitê reconheceu anteriormente que a política da Meta sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas persegue o objetivo legítimo de proteger os direitos de terceiros em contexto eleitoral, como o direito de voto (Regras de votação da Comissão Eleitoral Australiana). O Comitê considera que o objetivo da política, de “prevenir e interromper danos no meio físico”, é coerente com o objetivo legítimo de proteger os direitos das pessoas à vida, à liberdade e à segurança.

III. Necessidade e proporcionalidade

Nos termos do artigo 19(3) do PIDCP, a necessidade e a proporcionalidade exigem que as restrições à expressão "devem ser adequadas para atingir sua função de proteção; devem ser o instrumento menos intrusivo entre aqueles que podem atingir sua função de proteção; devem ser proporcionais ao interesse a ser protegido" (Comentário Geral nº 34, parágrafo 34).

O Comitê considera que a remoção do conteúdo neste caso é coerente com o princípio de necessidade e proporcionalidade, e considera os seis fatores para avaliar a incitação à violência e à discriminação no caso Plano de ação de Rabat como instrutivos para avaliar a probabilidade de danos decorrentes da publicação em questão. Esses fatores são: o conteúdo e a forma da expressão, a intenção, a identidade e o alcance do falante e a probabilidade e a iminência de danos.

Com relação ao conteúdo e à forma da expressão e à intenção do falante, conforme descrito acima, o conteúdo da publicação comunica claramente um desejo de acusar o candidato político de blasfêmia, fazendo isso sem indicação da intenção de gerar reconhecimento ou debate sobre a legalidade do discurso em questão.

Com relação à identidade do falante e ao alcance do seu conteúdo, o Comitê observa que o usuário não é uma figura pública com influência sobre terceiros, e tem relativamente poucos seguidores. Apesar disso, as configurações de privacidade da conta estavam definidas como públicas no momento em que o conteúdo foi publicado, e o conteúdo foi compartilhado aproximadamente 14 mil vezes por cerca de 9 mil usuários. Isso mostra que o discurso de figuras não públicas pode ainda assim ser disseminado de forma muito ampla nas redes sociais, e o efeito viral é difícil de prever. O alcance dessa publicação aumentou o seu potencial de dano, apesar de que a pessoa que a publicou não pareça estar em uma posição de autoridade.

O Comitê considera que existe uma probabilidade de dano iminente devido ao contexto em torno das alegações de blasfêmia no Paquistão, onde esse tipo de acusações gera um sério risco de danos físicos e até mesmo de morte. Esse contexto de proibições legais nacionais, dos processos correspondentes e da violência de aspirantes a justiceiros é descrito na seção 1 acima (consulte também os comentários públicos PC-29615 e PC-29617).

Dado o exame dos seis fatores de Rabat, o Comitê considera que era necessário e proporcional remover a publicação em questão.

Além disso, o Comitê está particularmente preocupado com o fato de que numerosos analistas que aplicam os Padrões da Comunidade da Meta consideraram de forma unânime o conteúdo como não violador. Isso ocorreu apesar de repetidas denúncias de usuários e da suposta priorização pela Meta da aplicação da política contra conteúdos desse tipo como parte de suas iniciativas para promover a integridade eleitoral no Paquistão, dado o alto risco de danos no meio físico que esses conteúdos podem gerar. Foi somente quando o sistema HERO da Meta identificou o conteúdo alguns dias depois, aparentemente depois de ele ter se tornado viral, que o conteúdo foi escalonado para especialistas internos em políticas e considerado como violador do Padrão da Comunidade sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas. Diversos analistas humanos perderam oportunidades anteriores de aplicar corretamente a política contra esse conteúdo, o que indica uma necessidade de adaptar o treinamento para que os analistas saibam como detectar violações em contextos como o do Paquistão. Isso é particularmente importante em contextos eleitorais, em que as tensões podem aumentar e o monitoramento é essencial para proteger contra restrições desnecessárias do discurso e prevenir danos no meio físico. Ao avaliar se suas iniciativas de promoção da integridade eleitoral no Paquistão foram bem-sucedidas, a Meta deveria considerar por que tantos analistas decidiram incorretamente não aplicar a política contra essa publicação e como assegurar que no futuro sejam tomadas iniciativas mais eficazes de promoção da integridade eleitoral em países com riscos semelhantes.

Embora as acusações de blasfêmia possam criar riscos significativos para os políticos em países em que a blasfêmia é criminalizada, ainda assim é possível realizar discussões importantes sobre a blasfêmia, em particular no contexto de uma eleição. A Meta deve tomar cuidado para evitar a aplicação excessiva da política contra conteúdos que não acusam indivíduos de blasfêmia, e sim realizam discussões políticas. Essa remoção excessiva seria particularmente preocupante em contextos em que o discurso político já é sujeito a restrições excessivas pelo governo, restrições essas que não estão em conformidade com as leis internacionais de direitos humanos. Não todos os conteúdos que usam o termo “kufr” constituem uma acusação de blasfêmia, como demonstrado pela variedade de vídeos compartilhados semelhantes dos mesmos eventos, como neste caso. Portanto, o Comitê lembra à Meta de que suas responsabilidades com os direitos humanos exigem que ela respeite a expressão política quando o conteúdo é compartilhado para contestar alegações de blasfêmia ou realizar discussões sobre blasfêmia sem gerar riscos para quaisquer indivíduos. É importante que o treinamento para moderadores enfatize a importância da liberdade de expressão nesse contexto e permita que eles escalonem as decisões para equipes mais especializadas, caso seja necessária uma análise contextual mais ampla para tomar uma decisão correta.

6. Decisão do Comitê de Supervisão

O Comitê de Supervisão apoia a decisão da Meta de remover o conteúdo.

7. Recomendações

Política de Conteúdo

1. Para garantir a segurança dos alvos de acusações de blasfêmia, a Meta deveria atualizar a Política sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas para deixar claro que os usuários não devem publicar acusações de blasfêmia contra indivíduos identificáveis em locais onde a blasfêmia é um crime e/ou há riscos significativos à segurança das pessoas acusadas de blasfêmia.

O Comitê considerará essa recomendação implementada quando a Meta atualizar seu Padrão da Comunidade sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas, voltado ao público, para refletir a mudança.

Monitoramento

2. Para assegurar a aplicação adequada da linha política sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas contra acusações de blasfêmia em locais onde essas acusações geram um risco iminente de danos à pessoa acusada, a Meta deveria treinar os analistas em escala que se ocupam desses locais e fornecer a eles orientações de monitoramento mais específicas para identificarem com eficácia e levarem em consideração as nuances e o contexto em publicações que contenham esse tipo de alegações.

O Comitê considerará que essa recomendação foi implementada quando a Meta fornecer documentos internos atualizados que demonstrem que o treinamento de analistas em escala para detectar melhor esse tipo de conteúdo tenha ocorrido.

*Nota processual:

  • As decisões do Comitê de Supervisão são tomadas por painéis de cinco membros e aprovadas por maioria de votos do Comitê inteiro. As decisões dele não representam, necessariamente, as opiniões de todos os membros.
  • De acordo com seu Estatuto, o Comitê de Supervisão pode analisar apelações de usuários cujo conteúdo foi removido pela Meta, apelações de usuários que denunciaram conteúdo que a Meta manteve ativo e decisões que a Meta encaminha a ele (Seção 1 do Artigo 2 do Estatuto). O Comitê tem autoridade vinculativa para manter ou anular as decisões de conteúdo da Meta (Seção 5 do Artigo 3 e 4 do Estatuto). O Comitê pode emitir recomendações não vinculativas às quais a Meta é obrigada a responder (Seção 4 do Artigo 3 e 4 do Estatuto). Quando a Meta se compromete a agir de acordo com as recomendações, o Comitê monitora sua implementação.
  • Para a decisão sobre o caso em questão, uma pesquisa independente foi encomendada em nome do Comitê. O Comitê recebeu assistência da Duco Advisors, uma empresa de consultoria especializada na intercessão entre as áreas de geopolítica, confiança e segurança, e tecnologia. A Memetica, um grupo de investigações digitais que fornece serviços de consultoria de risco e inteligência contra ameaças para mitigar danos online, também forneceu pesquisas. A empresa Lionbridge Technologies, LLC, cujos especialistas são fluentes em mais de 350 idiomas e trabalham de 5 mil cidades pelo mundo, forneceu a consultoria linguística.

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