Mantido
Vídeo de maquiagem para casamento infantil no Irã
No caso de um vídeo em que uma esteticista do Irã prepara uma garota de 14 anos para seu casamento, o Comitê concorda com a Meta que o conteúdo deveria ter sido removido de acordo com a Política sobre Exploração Humana.
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Resumo
No caso de um vídeo em que uma esteticista do Irã prepara uma garota de 14 anos para seu casamento, o Comitê concorda com a Meta que o conteúdo deveria ter sido removido de acordo com a Política sobre Exploração Humana. No entanto, o Comitê não concorda com o motivo da remoção da Meta, que foi usar o espírito da permissão da política. Em vez disso, o Comitê considera que o conteúdo claramente não seguiu a regra dos Padrões da Comunidade sobre Exploração Humana em relação à facilitação do casamento infantil ao auxiliar materialmente essa prática prejudicial. O casamento infantil, que afeta desproporcionalmente as meninas, é uma forma de casamento forçado e de violência e discriminação de gênero. As recomendações do Comitê buscam esclarecer a linguagem pública e a orientação interna da Meta para garantir que esse conteúdo seja removido e especificar que os casamentos forçados incluem o casamento infantil e envolvem crianças menores de 18 anos.
Sobre o caso
Em janeiro de 2024, um usuário do Instagram publicou um vídeo curto em sua conta, que dá detalhes sobre serviços de um salão de beleza no Irã. No vídeo, uma esteticista maquia uma criança, preparando-a para seu próprio casamento. Em farsi, a criança confirma que tem 14 anos e, quando questionada pela esteticista, revela que a família do noivo fez pedidos persistentes antes que seu pai “gave her to them” (a entregasse para eles). A esteticista e a criança falam sobre priorizar o casamento em detrimento dos estudos e admiram o resultado da transformação com a maquiagem. A sobreposição de texto afirma que a criança é a noiva mais jovem do ano, enquanto a legenda da publicação inclui detalhes dos serviços da esteticista para noivas. O conteúdo foi visualizado cerca de 10,9 milhões de vezes.
Uma pesquisa sobre o histórico do vídeo encomendada pelo Comitê sugere que a menina gravada pode estar atuando, fingindo ser uma criança prestes a se casar, embora isso não esteja claro.
Um total de 203 usuários denunciaram o conteúdo ao longo de um mês. Após rodadas de análise humana, a Meta concluiu que o vídeo não violava nenhuma política. Dessa forma, ele deveria permanecer no ar. O conteúdo também foi inicialmente sinalizado pelo sistema de Operações de Análise Antecipada de Alto Risco da Meta (HERO, na sigla em inglês) com base na alta probabilidade de se tornar viral, e foi encaminhado à Meta por meio do programa de Parceiros Confiáveis, que envolve partes interessadas especialistas que denunciam conteúdo potencialmente violador. Após uma nova rodada de análise encaminhada pelos especialistas no tema e em políticas da Meta, a empresa anulou sua decisão inicial e removeu a publicação por não seguir sua Política sobre Exploração Humana. Em seguida, a Meta indicou o caso ao Comitê.
O casamento infantil, que o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos define como “qualquer casamento formal ou união informal entre uma criança menor de 18 anos e um adulto ou outra criança”, é considerado uma forma de casamento forçado e uma violação dos direitos humanos por órgãos internacionais e regionais.
A legislação iraniana permite o casamento infantil, com idades legais fixadas em 13 anos para meninas e 15 anos para meninos, embora o casamento seja permitido no país antes dessas idades em determinadas circunstâncias.
Principais conclusões
O Comitê considera que o conteúdo violou explicitamente as regras dos Padrões da Comunidade sobre Exploração Humana para facilitar casamentos forçados porque o vídeo mostrou, de forma clara, uma esteticista fornecendo ajuda material a uma menina de 14 anos, facilitando assim o casamento infantil. Embora a Meta tenha removido o vídeo, ela o fez por outro motivo: devido ao espírito da permissão da política conforme a Política sobre Exploração Humana. Essa política não proíbe especificamente o apoio ao casamento infantil, mas sua justificativa afirma que o objetivo dela é remover todas as formas de “exploração de humanos”, que a Meta acreditava que deveria incluir “apoio” ao casamento infantil. Nesse caso, a Meta utilizou o espírito da permissão da política, que pode ser aplicada quando uma aplicação rígida de um Padrão da Comunidade produz resultados inconsistentes com o fundamento e os objetivos da política. O Comitê discorda da Meta sobre o motivo da remoção porque as ações da esteticista foram uma forma de facilitação, com a publicação anunciando serviços de beleza para meninas que iriam se casar, auxiliando a prática.
Não há uma definição pública de “facilitação” fornecida pela Meta, embora sua orientação interna aos analistas declare o seguinte: “conteúdo que coordena o transporte, a transferência e o abrigo de vítimas antes ou durante a exploração”. O Comitê considera que essa definição é muito restrita. Considerando o propósito da política, a própria interpretação do Comitê de “facilitação” – para incluir o fornecimento de qualquer tipo de auxílio material (que inclui “serviços”) a fim de permitir a exploração – deve ser aplicada a esse caso, bem como à orientação interna da Meta. Isso significaria que a Meta poderia remover conteúdo semelhante sem recorrer ao espírito da permissão da política.
A Política sobre Exploração Humana não declara explicitamente que os casamentos forçados incluem o casamento infantil. Além disso, embora a definição interna da Meta para analistas afirme que menores de idade não podem consentir e inclua orientação adicional sobre sinais de consentimento e tráfico de pessoas, nem a linguagem interna nem a pública são claras o suficiente. A Meta deve, portanto, especificar na linguagem pública da política que o casamento infantil é uma forma de casamento forçado e atualizar sua orientação interna para explicar que crianças são pessoas menores de 18 anos que não podem consentir totalmente com o casamento ou uniões informais.
O Comitê acredita que o espírito da política deve ser aplicado raramente porque há preocupações de legalidade sobre a permissão. Reiterando uma recomendação anterior, o Comitê pede que a Meta conclua a implementação de uma explicação pública sobre essa permissão.
Decisão do Comitê de Supervisão
O Comitê de Supervisão apoia a decisão da Meta de remover o conteúdo.
Ele recomenda que a Meta:
- Modifique a Política sobre Exploração Humana para declarar explicitamente que os casamentos forçados incluem o casamento infantil.
- Além disso, modifique a política para definir o casamento infantil de acordo com os padrões internacionais de direitos humanos, a fim de incluir casamentos e uniões informais de crianças menores de 18 anos.
- Forneça orientação explícita aos analistas humanos sobre a inclusão do casamento infantil na definição de casamentos forçados.
- Amplie a definição de “facilitação” nas diretrizes internas para incluir o fornecimento de qualquer tipo de auxílio material (que inclui “serviços”) para permitir a exploração.
*Os resumos de casos fornecem uma visão geral dos casos e não têm valor de precedente.
Decisão completa sobre o caso
1. Descrição do caso e histórico
Em janeiro de 2024, um usuário do Instagram publicou um vídeo de um minuto em farsi em sua conta. A conta compartilha informações sobre serviços de salão de beleza e uma escola de beleza no Irã. No vídeo, uma esteticista prepara uma garota de 14 anos para seu próprio casamento, com trechos mostrando a criança antes e depois da aplicação da maquiagem. A criança, cujo rosto é mostrado nitidamente, também confirma sua idade no vídeo.
A esteticista e a criança conversam sobre estudos, idade, preparativos para o casamento e o resultado da maquiagem. Ela pergunta à criança sobre priorizar o casamento em vez dos estudos, ao que ela responde que gostaria de conciliar as duas coisas. Questionada sobre o noivo, a criança explica que, após insistentes pedidos da família, seu pai “gave her to them” (a entregou a eles). Ambas então admiram o resultado da maquiagem, e a esteticista deseja votos de felicidade para o futuro da criança. Uma pesquisa adicional sobre o histórico, encomendada pelo Comitê, sugeriu que a menina no vídeo pode estar atuando, fingindo ser uma criança prestes a se casar. No entanto, o conteúdo não deixa isso claro.
O texto sobreposto ao vídeo, também em farsi, afirma que a criança é a noiva mais jovem do ano. A legenda da publicação deseja votos de felicidade a todas as meninas do Irã e fornece informações sobre os serviços da esteticista para noivas.
O conteúdo foi visualizado cerca de 10,9 milhões de vezes, recebeu cerca de 200 mil reações (a maioria “curtidas”) e 19 mil comentários. Além disso, foi compartilhado menos de mil vezes.
Entre janeiro e fevereiro de 2024, 203 usuários denunciaram o conteúdo 206 vezes, mais frequentemente por “imagens de exploração infantil”. Desses usuários, 79 denunciaram o conteúdo por violar a Política sobre Imagens de Exploração Infantil, 40 por violar a Política sobre Discurso de Ódio e 30 por violar a Política sobre Terrorismo. Após diversas análises humanas durante esse período, a Meta concluiu que o conteúdo não violava nenhuma de suas políticas e o manteve. No mesmo mês, o conteúdo também foi detectado pelo sistema de Operações de Análise Antecipada de Alto Risco da Meta (HERO) da Meta, projetado para identificar conteúdo potencialmente violador que tem alta probabilidade de se tornar viral. Uma vez detectado e priorizado, o conteúdo é enviado para análise humana por especialistas com experiência em idiomas, mercado e políticas. O conteúdo nesse caso foi detectado devido a sinais de alto efeito viral, mas a denúncia foi posteriormente encerrada porque o efeito viral não era alto o suficiente para prosseguir para a fase de análise.
Em fevereiro de 2024, o conteúdo foi encaminhado por um dos Parceiros Confiáveis da Meta para análise humana adicional. Por meio do Programa de Parceiros Confiáveis, a Meta faz parcerias com diferentes partes interessadas que fornecem conhecimento especializado sobre as diversas comunidades nas quais a Meta opera, denunciam conteúdo e fornecem feedback sobre as políticas de conteúdo e monitoramento da Meta.
Após análise de especialistas no assunto e em políticas, a Meta anulou sua decisão original de manter o conteúdo e removeu a publicação por violar sua Política sobre Exploração Humana. No entanto, a Meta não aplicou uma advertência ao usuário que publicou o vídeo porque a empresa decidiu remover a publicação com base no espírito da política e não na letra dela. Nesse caso, a Meta declarou que a decisão tomada foi de que a remoção foi suficiente e não justificava uma penalização adicional na forma de uma advertência.
A Meta encaminhou o caso ao Comitê porque ele representa uma tensão em seus valores de voz e segurança relacionados ao casamento infantil. A Meta considera esse caso significativo e difícil porque “destaca a questão da promoção ou glorificação da exploração humana (incluindo o casamento infantil), que não é explicitamente abrangida pelas políticas [da Meta]… e porque os casamentos infantis são legais em determinadas jurisdições, mas criticados como uma violação da lei dos direitos humanos por outras”.
O Comitê observa o seguinte contexto ao tomar uma decisão sobre o caso.
O casamento infantil é considerado uma violação dos direitos humanos por órgãos internacionais e regionais (por exemplo, Nações Unidas, Organização dos Estados Americanos, União Africana) e organizações da sociedade civil, e afeta milhões de crianças em todo o mundo. De acordo com o Gabinete do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, “o casamento infantil refere-se a qualquer casamento formal ou união informal entre uma criança menor de 18 anos e um adulto ou outra criança. Casamento forçado é um casamento em que uma e/ou ambas as partes não expressaram pessoalmente seu consentimento pleno e livre à união. O casamento infantil é considerado uma forma de casamento forçado, uma vez que uma e/ou ambas as partes não expressaram consentimento pleno, livre e informado.” A Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (Artigo 16, parágrafo 2), prevê que “o noivado e o casamento de uma criança não terão efeito jurídico”.
O casamento infantil inclui tanto casamentos formais quanto uniões informais. Segundo a UNICEF, uma união informal é aquela “em que uma menina ou um menino vive com um(a) parceiro(a) como se fossem casados antes dos 18 anos [… e] em que um casal vive junto por algum tempo, com a intenção de ter um relacionamento duradouro, mas que não celebrou uma cerimônia civil ou religiosa formal”. As uniões informais levantam as mesmas preocupações com direitos humanos que o casamento (por exemplo, riscos para a saúde, interferência nos estudos) e, em algumas regiões, são mais prevalentes do que os casamentos formais.
As meninas são desproporcionalmente afetadas e enfrentam riscos adicionais devido a diferenças biológicas e sociais. Globalmente, a prevalência do casamento infantil entre meninos é apenas um sexto da prevalência entre as meninas. O Relatório do Secretário-Geral da ONU sobre a Questão do Casamento Infantil, Precoce e Forçado (A/77/282, parágrafo 4) reconheceu que o casamento infantil está enraizado nas desigualdades de gênero e nas normas sociais e culturais discriminatórias que consideram mulheres e meninas inferiores a homens e meninos. É considerada uma forma de violência de gênero e discriminação contra mulheres e meninas.
Costumes antigos são frequentemente usados para justificar o casamento infantil, desconsiderando a discriminação e a violência de gênero associadas a ele, bem como as ameaças ao bem-estar da criança e outras violações dos direitos humanos. A UNICEF, o Comitê para a Eliminação da Discriminação contra as Mulheres (CEDAW, na sigla em inglês), o Comitê sobre os Direitos da Criança (CRC, na sigla em inglês), e outros especialistas em direitos humanos da ONU declararam que as meninas que se casam antes dos 18 anos têm maior probabilidade de sofrer violência doméstica e abuso, e menor probabilidade de permanecer na escola. Elas têm piores resultados econômicos e de saúde do que crianças que não se casaram, e esses efeitos negativos se estendem aos seus próprios filhos. O casamento infantil é frequentemente acompanhado de gravidez e parto precoces e frequentes, afetando a saúde mental e física das meninas e resultando em taxas de mortalidade materna acima da média. O casamento forçado de crianças também pode levar as meninas a tentarem fugir de suas comunidades ou a cometer suicídio. Como as crianças não podem expressar o consentimento pleno, livre e informado para se casarem ou entrarem em uniões informais, as decisões são frequentemente tomadas pelos pais ou responsáveis, o que retira da criança o poder de decisão, a autonomia e a capacidade de tomar decisões críticas (Artigo 12, Convenção sobre os Direitos da Criança, CRC).
A UNICEF também declarou que os meninos que se casam ou se envolvem em uma união informal na infância são forçados a assumir responsabilidades de adultos para as quais podem não estar preparados. O casamento pode resultar em paternidade precoce e pressão econômica adicional para o sustento da família, o que, por sua vez, pode limitar o acesso do menino à educação e às oportunidades de progressão na carreira.
O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos observou que o casamento infantil está enraizado em fatores como questões socioeconômicas (pobreza e educação), costumes, tradição, valores culturais, política, interesses econômicos, honra e crenças religiosas (A/HRC/26/22, parágrafos. 17-20). Há também uma maior incidência durante conflitos e crises humanitárias (A/HRC/41/19, parágrafo 51).
Segundo a UNICEF, a cada três segundos uma menina se casa em algum lugar do mundo. A UNICEF e a Girls Not Brides têm dados que identificam as regiões com as maiores ocorrências de casamento infantil. A África Subsaariana é a região com a maior prevalência de casamento infantil, com 31% das mulheres casadas antes dos 18 anos, seguida pela Ásia Central e Meridional com 25%, América Latina e Caribe com 21% e Oriente Médio e Norte da África com 17%.
As normas internacionais de direitos humanos estabelecem que a idade mínima legal para o casamento de meninas e meninos, com ou sem consentimento dos pais, é de 18 anos (Recomendação Geral Conjunta n.º 31/18 do CEDAW e CRC em 2019, parágrafos. 20 e 55.f; Resolução da Assembleia Geral da ONU de 2018, A/RES/73/153; Resolução de 2023 do Conselho de Direitos Humanos da ONU sobre o Casamento Infantil, Precoce e Forçado, A/HRC/RES/53/23; Relatório do Gabinete do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Prevenção e Eliminação do Casamento Infantil, Precoce e Forçado, A/HRC/26/22).
O CRC e o CEDAW revisaram sua Recomendação Geral Conjunta n.º 18/31 em 2019 a fim de declarar que a idade mínima legal para o casamento deve ser 18 anos, sem exceções (parágrafos 20 e 55(f)). O aumento da idade legal de casamentos para 18 anos foi apoiado por muitas organizações da sociedade civil, por exemplo, com o slogan “18, sem exceções”, conforme mencionado no comentário público da Project Soar (ver PC-29623). Isto levou alguns estados a modificarem sua legislação interna nos últimos anos (Relatório de 2022 do ACNUDH, A/HRC/50/44, parágrafo 22).
Os países adotam diferentes abordagens legais em relação ao casamento infantil. Embora muitos países estabeleçam a idade mínima em 18 anos e tenham sido feitos progressos significativos na redução da prevalência do casamento infantil, outros estabelecem idades mais baixas ou permitem exceções (por exemplo, alguns estados nos Estados Unidos e no Brasil). Essas exceções, como consentimento dos pais, autorização judicial ou leis consuetudinárias e religiosas, prejudicam as proteções legais para meninas e têm sido criticadas por dificultar o objetivo de acabar com o casamento infantil até 2030, conforme definido nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.
Muitos países também têm leis religiosas e consuetudinárias variadas, além de práticas tribais, que muitas vezes estão abertas à interpretação por chefes e tribunais comunitários ou tradicionais. Por exemplo, de acordo com especialistas consultados pelo Comitê, como parte de práticas tribais como o Khoon bas (“cessar o sangue”) no Irã, meninas se casam legalmente com membros de famílias rivais para evitar derramamento de sangue.
Casamento infantil no Irã
A legislação do Irã atualmente permite casamento infantil. Segundo especialistas consultados pelo Comitê, a idade legal para o casamento é 13 anos para meninas e 15 anos para meninos. No entanto, o casamento antes dessas idades é permitido pelo Artigo 1041 do Código Civil de 2007, que estabelece que “o casamento de meninas antes dos 13 anos e de meninos antes dos 15 anos depende da permissão do responsável e da condição do interesse da criança, conforme determinado por um órgão jurisdicional competente”.
Em 2020, o Irã adotou a Lei de Proteção de Crianças e Adolescentes, que impõe novas penalidades para atos que prejudicam a segurança e o bem-estar de uma criança, mas não aborda o casamento infantil (ver também PC 29268 da Equality Now).
De acordo com a Girls Not Brides, o casamento infantil no Irã é motivado pela pobreza, pela religião, pelas práticas tradicionais prejudiciais, pela honra familiar e pelo deslocamento. Uma pesquisa encomendada pelo Comitê identificou picos notáveis nas interações em plataformas de redes sociais no ano passado, discutindo a morte e o suicídio de mulheres e meninas forçadas a se casar quando crianças.
Um especialista também observou que dados do Centro Nacional de Estatísticas do Irã (NSC, na sigla em inglês) indicaram que 33.240 meninas e 19 meninos se casaram antes dos 15 anos entre 2021 e 2022. Um comentário público da Equality Now (ver PC 29268) explicou que os números podem ser maiores, já que os números oficiais refletem apenas casamentos registrados e o NSC não divulga dados desagregados para registros de casamento de meninas de 15 a 17 anos (apenas para idades de 15 a 18 anos, inclusive).
O CRC solicitou que o estado aumentasse a idade mínima de casamento para meninas e meninos para 18 anos (A/HRC/WG.6/34/IRN/2, parágrafo 70). Outros órgãos e especialistas em direitos humanos levantaram preocupações semelhantes, incluindo no relatório de 2024 do Relator Especial da ONU sobre o Irã (A/HRC/55/62, parágrafo 75).
Embora o Irã tenha concordado inicialmente em rever as recomendações de aumentar a idade mínima para o casamento para 18 anos, sem exceção, pouco progresso foi relatado. De acordo com especialistas consultados pelo Comitê, nos últimos anos, o discurso político sobre o casamento mudou drasticamente no Irã, chegando a incentivar as mulheres a se casarem cedo para aumentar a taxa de natalidade, o que para as meninas geralmente significa casamento à força e resultou no aumento do casamento infantil em determinadas regiões do país. Em 2021, o Irã apresentou um relatório periódico de estado ao Comitê de Direitos Humanos indicando que não considerará aumentar a idade mínima para o casamento de 13 para 15 anos “devido à importância da família na sociedade iraniana” e “à indecência geral de atos sexuais ilegítimos fora do casamento” (CCPR/C/IRN/4, parágrafo 148).
2. Envios de usuários
Após o encaminhamento da Meta e a decisão do Comitê de aceitar o caso, o usuário foi notificado e teve a oportunidade de enviar uma declaração. Nenhuma resposta foi recebida.
3. Políticas de conteúdo e envios da Meta
I. Políticas de conteúdo da Meta
Diretrizes da Comunidade do Instagram
As Diretrizes da Comunidade do Instagram não especificam nenhuma proibição de conteúdo conforme a Política sobre Exploração Humana e não vinculam diretamente aos Padrões da Comunidade sobre Exploração Humana. O Relatório de Aplicação de Padrões da Comunidade do Primeiro Trimestre de 2024 afirma que “O Facebook e o Instagram compartilham políticas de conteúdo. O conteúdo considerado infrator no Facebook também é considerado infrator no Instagram”.
Política sobre Exploração Humana
De acordo com o fundamento da Política sobre Exploração Humana, a Meta “remove conteúdo que facilite ou coordene a exploração de humanos, incluindo o tráfico de pessoas”. Os Padrões da Comunidade proíbem: “Conteúdo que recrute ou explore pessoas para ou facilite qualquer uma das seguintes formas de tráfico de pessoas: ... Casamentos forçados”.
As diretrizes internas da Meta definem o casamento forçado como “uma instituição ou prática em que os indivíduos não têm a opção de recusar ou são prometidos e forçados a se casarem com outra pessoa por ordem de seus pais, responsáveis, parentes ou outras pessoas e grupos. Isso não inclui casamentos arranjados, em que os indivíduos que se casam têm a opção de recusar”. O Comitê observa que a Meta está considerando atualizações para essa definição, e ela pode mudar em um futuro relativamente próximo. A empresa informou ao Comitê que considera o casamento infantil um casamento forçado com base no reconhecimento de que menores (pessoas com menos de 18 anos) não podem consentir plenamente, em conformidade com os padrões internacionais de direitos humanos.
A política inclui exceções a essas regras e afirma que a Meta “permite conteúdo que seja de outra forma coberto por essa política quando publicado em contextos de condenação, educacionais, de conscientização ou de reportagem jornalística”.
Espírito da permissão da política
De acordo com a Meta, ela pode aplicar ao conteúdo uma permissão da política quando o fundamento (o texto que introduz cada Padrão da Comunidade) e os valores da Meta exigem um resultado diferente de uma interpretação rígida das regras em conteúdo proibido. A Meta usa o espírito da permissão da política quando uma aplicação rígida dos Padrões da Comunidade relevantes está produzindo resultados que são inconsistentes com seu fundamento e seus objetivos. O espírito da política é uma permissão da política geral, aplicável a todos os Padrões da Comunidade, e só pode ser emitida pelas equipes internas da Meta em escalation e não por moderadores humanos em escala.
Em decisões anteriores, o Comitê recomendou que a Meta fornecesse uma explicação pública do espírito da permissão da política (decisão do caso Produtos farmacêuticos do Sri Lanka, recomendação n.º 1, reiterada no caso Violência comunitária no estado indiano de Odisha). Essa recomendação foi aceita pela Meta e está atualmente em processo de implementação, de acordo com a última avaliação do Comitê.
II. Envios da Meta
De acordo com a Meta, a remoção de conteúdo nesse caso foi resultado de uma decisão política conforme a Política sobre Exploração Humana.
Embora a Política sobre Exploração Humana não proíba especificamente o apoio ao casamento infantil, o fundamento de sua política afirma que o objetivo dela é remover todas as formas de “exploração de seres humanos”. A Meta acredita que isso abrange o apoio ao casamento infantil, principalmente quando a publicação pode gerar um benefício financeiro para o usuário, como nesse caso. Com base nisso e no fundamento da política, a Meta argumentou que não quer permitir conteúdo, como a publicação nesse caso, em que uma pessoa busca benefício financeiro e incentiva o casamento infantil.
A Meta considerou que o valor da segurança superava o potencial valor expressivo desse discurso (voz). A empresa considerou os danos associados ao casamento infantil e ponderou os riscos de permitir que a publicação permanecesse na plataforma, o que poderia incentivar ainda mais o apoio ao casamento infantil, e o valor expressivo do conteúdo, bem como o potencial ganho monetário para o usuário. A Meta explicou que, embora o ganho monetário não tenha sido um fator decisivo em sua avaliação, a empresa o considerou como um fator em sua avaliação holística da publicação em escalation, em alinhamento com o papel que o ganho monetário desempenha na definição da Meta de “exploração de humanos”.
Quando questionada pelo Comitê, a empresa declarou que o conteúdo seria avaliado de forma diferente se apoiasse o casamento infantil, mas não buscasse benefícios financeiros com isso, embora a empresa considerasse o contexto geral do conteúdo antes de tomar uma decisão. A Meta afirmou que não define “apoio” no contexto do casamento infantil e que sua abordagem ao conteúdo que apoia (mas não facilita) o casamento infantil é tratada caso a caso, conforme escalation.
A empresa observou que, embora o “apoio” ao casamento infantil seja abordado de forma crescente, as outras ações (facilitação, recrutamento, exploração) são aplicadas em escala, e os analistas humanos são treinados para remover todo o conteúdo que busca facilitar o casamento forçado. A Meta afirmou que suas instruções de que menores de idade não podem consentir e a definição de casamento forçado esclarecem que os analistas devem remover conteúdo que busque facilitar o casamento infantil.
A Meta explicou que a empresa não aplicou uma advertência ao usuário que publicou o vídeo porque a empresa decidiu remover a publicação com base no espírito da política e não na letra dela. Nesse caso, a decisão tomada foi de que a remoção foi suficiente e não justificava uma penalização adicional na forma de uma advertência.
A Meta não notificou o usuário sobre sua decisão de suspender a advertência nesse caso. A empresa afirmou que não notifica os usuários sobre a aplicação ou retenção de advertências devido ao risco de que isso exponha limites de monitoramento que podem ser explorados por agentes adversários para contornar os sistemas da empresa criando contas ou ficando logo abaixo do limite de advertências. No entanto, a Meta notifica os usuários sobre os limites de recursos aplicados às suas contas, incluindo o motivo pelo qual as restrições foram aplicadas.
O Comitê fez perguntas à Meta sobre a aplicação do espírito da permissão da política, os motivos para a remoção de conteúdo, as instruções internas da Meta para moderadores de conteúdo sobre proibições na Política sobre Exploração Humana e o monitoramento de conteúdo que "apoia" o casamento infantil, incluindo informações sobre as notificações da empresa aos usuários e denunciantes. A Meta respondeu a todas as perguntas.
4. Comentários públicos
O Comitê de Supervisão recebeu sete comentários públicos que atenderam aos termos de envio. Quatro dos comentários foram enviados do Oriente Médio e do Norte da África, dois dos Estados Unidos e do Canadá, e um da Ásia-Pacífico e da Oceania. Para ler comentários públicos enviados com consentimento de publicação, clique aqui.
Os envios abordaram os seguintes temas: casamento infantil como uma violação dos direitos humanos; o impacto dessa prática prejudicial; como ela afeta desproporcionalmente as meninas; os padrões internacionais de direitos humanos aplicáveis ao casamento infantil; e casamento infantil no Irã e em outras partes do mundo.
5. Análise do Comitê de Supervisão
O Comitê selecionou esse caso para avaliar, pela primeira vez, o impacto dos Padrões da Comunidade sobre Exploração Humana da Meta sobre os direitos das crianças, especialmente meninas envolvidas em casamentos infantis. Esse caso destaca a tensão entre os valores da Meta de proteger a voz e garantir a segurança das crianças.
O Comitê analisou a decisão da Meta nesse caso em relação às políticas de conteúdo, aos valores e às responsabilidades de direitos humanos da Meta. Também avaliou as implicações desse caso quanto à abordagem mais ampla da Meta em relação à governança de conteúdo.
5.1 Conformidade com as políticas de conteúdo da Meta
I. Regras sobre conteúdo
O Comitê concorda com a Meta de que o conteúdo nesse caso deve ser removido, mas por um motivo diferente. Ele considera que o conteúdo não seguiu as regras explícitas dos Padrões da Comunidade sobre Exploração Humana por facilitar o casamento forçado, em vez de estar em conformidade com o espírito da política em relação a “apoio”. O vídeo mostra claramente a esteticista prestando serviços de beleza (serviços materiais ou ajuda material) a uma menina para facilitar o casamento infantil e buscar benefícios financeiros.
O Comitê, ao contrário da Meta, considera que as ações da esteticista não foram simplesmente um apoio ao casamento infantil, mas uma forma de facilitação envolvendo uma ação concreta. Na publicação, serviços de beleza foram anunciados, com meninas sendo incentivadas a contratar esses serviços para facilitar o casamento infantil, auxiliando assim a prática e potencialmente ganhando benefícios financeiros dela.
O Comitê observa que a Meta não fornece uma definição pública de “facilitação”. Considerando o propósito da política, o Comitê interpreta “facilitação” como incluindo o fornecimento de qualquer tipo de ajuda material (que inclui “serviços”) para permitir a exploração.
Ele observa que a Meta define “facilitação” em sua orientação interna aos analistas como “conteúdo que coordena o transporte, a transferência e o abrigo de vítimas antes ou durante a exploração”. O Comitê considera que essa orientação interna aos analistas é excessivamente restrita e que a linguagem pública permite que o termo seja razoavelmente compreendido pelos usuários para abranger a interpretação mais ampla do Comitê sobre qual conteúdo não é permitido na plataforma. No entanto, para fornecer maior clareza, a Meta deve modificar suas diretrizes internas para expandir a definição de facilitação para incluir também o fornecimento de qualquer tipo de ajuda material (que inclui “serviços”) para permitir a exploração. Isso permitirá que a Meta remova conteúdo semelhante no futuro sem recorrer ao espírito da permissão da política.
II. Medida de aplicação
Apesar dos mais de dez milhões de visualizações desse conteúdo, ele não foi priorizado para análise pelo sistema HERO da Meta, que busca identificar conteúdo com alto efeito viral para análise humana. A Meta afirmou que, nesse caso, o efeito viral não foi alto o suficiente para que o conteúdo avançasse para a fase de análise. O Comitê está preocupado que os sistemas da Meta não consigam lidar com conteúdos como a publicação nesse caso, que recebeu mais de dez milhões de visualizações. Entretanto, sem mais informações e investigação do sistema de priorização e qual conteúdo foi priorizado acima disso, o Comitê não está em posição de avaliar se esse conteúdo deveria ter recebido uma prioridade maior em comparação aos outros conteúdos na fila.
6. Conformidade com as responsabilidades da Meta relativas aos direitos humanos
O Comitê considera que a remoção do conteúdo da plataforma foi coerente com as responsabilidades da Meta com os direitos humanos, embora a Meta deva lidar com as preocupações ligadas à clareza de suas regras e o espírito da permissão da política.
Liberdade de expressão (Artigo 19 PIDCP)
O Artigo 19 do PIDCP prevê ampla proteção à expressão, incluindo a “liberdade de procurar, receber e difundir informações e ideias de qualquer natureza, independentemente de considerações de fronteiras, verbalmente ou por escrito, em forma impressa ou artística, ou por qualquer outro [meio] de sua escolha”. Quando um Estado aplica restrições à expressão, elas devem atender aos requisitos de legalidade, objetivo legítimo e necessidade e proporcionalidade, segundo o parágrafo 3 do Artigo 19 do PIDCP. Esses requisitos costumam ser chamados de "teste tripartite". O Comitê usa essa estrutura para interpretar as responsabilidades de direitos humanos da Meta de acordo com os Princípios Orientadores da ONU sobre Empresas e Direitos Humanos, com os quais a própria Meta se comprometeu em sua Política Corporativa sobre Direitos Humanos. O Comitê faz isso tanto em relação à decisão de conteúdo individual sob análise quanto ao que isso diz sobre a abordagem mais ampla da empresa à governança de conteúdo. Como afirmou o Relator Especial da ONU sobre liberdade de expressão, embora “as empresas não tenham obrigações governamentais, seu impacto é do tipo que exige que avaliem o mesmo tipo de questões sobre a proteção do direito de seus usuários à liberdade de expressão” (A/74/486, parágrafo 41).
I. Legalidade (clareza e acessibilidade das regras)
O princípio da legalidade exige que as regras que limitam a expressão sejam acessíveis e claras, formuladas com precisão suficiente para permitir que um indivíduo regule sua conduta de acordo com elas (Comentário Geral nº 34, parágrafo 25). Além disso, essas regras “podem não conceder liberdade de ação irrestrita para a restrição da liberdade de expressão aos encarregados de [sua] execução” e devem “fornecer instrução suficiente aos encarregados de sua execução para permitir-lhes determinar quais tipos de expressão são propriamente restritas e quais tipos não são” (Ibid.). O Relator Especial da ONU sobre a liberdade de expressão declarou que, quando aplicadas à governação do discurso online por parte de intervenientes privados, as regras devem ser claras e específicas (A/HRC/38/35, parágrafo 46). As pessoas que usam as plataformas da Meta devem ser capazes de acessar e entender as regras, e os moderadores de conteúdo devem ter orientações claras sobre sua aplicação.
O Comitê conclui que o conteúdo infringiu a proibição da Política sobre Exploração Humana em relação a conteúdo que facilita casamentos forçados, e não o espírito da política. Embora o Comitê considere que a proibição de facilitação incluída nos Padrões da Comunidade era suficientemente clara quando aplicada a essa publicação, a linguagem pública da política não é suficientemente clara quanto à interpretação geral do termo “facilitação”. Conforme discutido acima, o Comitê interpreta o termo para abranger uma definição mais ampla do que a fornecida nas diretrizes internas da Meta. Portanto, o Comitê recomenda alterar a orientação para abranger essa definição mais ampla.
A Meta removeu a publicação com base no espírito da permissão da política porque a Política sobre Exploração Humana não proíbe especificamente conteúdo que “apoie” o casamento infantil, que na opinião da empresa era a ação que deveria ser proibida nesse caso. Conforme mencionado acima, o Comitê discorda do raciocínio da Meta e considera que as ações da esteticista não foram simplesmente um “apoio” ao casamento infantil, mas sim uma forma de “facilitação” envolvendo uma ação concreta, o que é proibido.
Em decisões anteriores, o Comitê observou que o espírito da permissão da política pode “ficar aquém do padrão de legalidade” conforme o teste tripartite. Embora em casos anteriores o Comitê tenha permitido o uso do “espírito da política” para permitir conteúdo (decisão do caso Produtos farmacêuticos do Sri Lanka) e removê-lo (decisão do caso Violência comunitária no estado indiano de Odisha), o uso dessa permissão para remover conteúdo deve ser excepcional, pois levanta sérias preocupações conforme o teste de legalidade. Sem fornecer orientações claras, não se pode esperar que os usuários adequem sua conduta de acordo com isso. O Comitê considera que a aplicação do espírito da política, particularmente para remover conteúdo, deve ser excepcional.
Na decisão do caso Produtos farmacêuticos do Sri Lanka, o espírito da permissão da política foi usado para permitir conteúdo que não seguia os termos explícitos dos Padrões da Comunidade, mas seguia os propósitos subjacentes desses Padrões. Nessa decisão, o Comitê reconheceu que, ao moderar grandes quantidades de conteúdo em escala global, é necessário ter uma tolerância abrangente que possa ser aplicada para evitar injustiças claras. Ao mesmo tempo, o Comitê observou que esse tipo de isenção discricionária às políticas da Meta gera uma séria tensão com o padrão de legalidade. Para evitar restrições arbitrárias à expressão, o Comitê reitera sua recomendação anterior de que a Meta forneça uma explicação pública do espírito da permissão da política e divulgue os critérios usados para avaliar quando essa permissão é aplicada. Sem uma explicação disponível publicamente, os usuários não têm como saber sobre o espírito da permissão da política ou sua aplicação em todos os Padrões da Comunidade. A Meta já se comprometeu a implementar totalmente essa recomendação. Além disso, se essa permissão for usada repetidamente da mesma maneira, a empresa deve avaliar cuidadosamente se isso deve ou não ser especificamente previsto na política relevante.
Desvios discricionários da letra das regras são mais preocupantes no contexto de remoção de conteúdo do que quando permitidos. Em lugares onde a aplicação de regras rígidas pode gerar restrições desproporcionais ao discurso que deveria ser permitido nas plataformas da Meta, o objetivo de usar o espírito da permissão da política é aumentar a proteção do direito à expressão. Por outro lado, usar a permissão para restringir o discurso que não é claramente proibido pelas regras da Meta impacta significativamente a capacidade dos usuários de adequar efetivamente sua conduta na plataforma por referência às regras.
A linguagem pública da Política sobre Exploração Humana não declara explicitamente que os casamentos forçados incluem o casamento infantil. A Meta informou ao Comitê que considera o casamento infantil uma forma de casamento forçado com base no reconhecimento de que menores (pessoas com menos de 18 anos) não podem consentir plenamente, em alinhamento com os padrões internacionais de direitos humanos.
Ela fornece uma definição interna sobre casamentos forçados e, de acordo com a empresa, os analistas humanos recebem instruções de que menores de idade não podem consentir. Ao avaliar o conteúdo conforme a Política sobre Exploração Humana da Meta, a empresa instrui os analistas a não considerarem supostas evidências do consentimento de um menor de idade, porque menores de idade não têm capacidade de fornecer consentimento legal. De acordo com a Meta, quando interpretadas em conjunto, ambas as instruções esclarecem aos analistas que o conteúdo que busca “facilitar” o casamento infantil deve ser removido. Não há diretrizes internas fornecidas em relação ao conteúdo que apoia o casamento infantil. A empresa observou que o “apoio” ao casamento infantil é abordado na escalation.
Para fornecer clareza e precisão suficiente sobre as regras aos usuários, o Comitê solicita que a Meta especifique na Política sobre Exploração Humana voltada ao público que o casamento infantil deve ser entendido como uma forma de casamento forçado, com base no reconhecimento de que menores (pessoas com menos de 18 anos) não podem consentir plenamente. A empresa também deve atualizar suas diretrizes internas adequadamente. O Comitê conclui que, embora as diretrizes internas para analistas forneçam alguma orientação sobre sinais de consentimento de crianças e tráfico de pessoas, a Meta deve explicar claramente que crianças são pessoas menores de 18 anos e não podem consentir totalmente com o casamento ou uniões informais.
II. Objetivo legítimo
Qualquer restrição à liberdade de expressão também deve perseguir um ou mais dos objetivos legítimos listados no PIDCP, o que inclui a proteção dos direitos de terceiros.
Conforme aplicado aos fatos desse caso, a Política sobre Exploração Humana da Meta busca perseguir os objetivos legítimos de proteger os direitos das crianças. Buscando “interromper e prevenir danos” removendo conteúdo “que facilite ou coordene a exploração de humanos” por meio do casamento infantil, os Padrões da Comunidade sobre Exploração Humana atendem aos objetivos legítimos de proteger uma ampla gama de direitos das crianças, particularmente os direitos humanos das meninas, em consonância com os melhores interesses das crianças (Artigo 3, CRC). A política busca protegê-las dos impactos negativos associados ao casamento infantil. O Comitê já concluiu que proteger os direitos das crianças é um objetivo legítimo (ver decisões sobre Jornalista sueca denuncia violência sexual contra menores e Documentário sobre abuso infantil no Paquistão).
A política da Meta busca proteger os direitos das crianças a: saúde física e mental (Artigo 12 PIDESC, Artigo 19, CRC); privacidade (Artigo 17, PIDCP, Artigo 16, CRC); educação (Artigo 13, PIDESC, Artigo 28, CRC); desenvolvimento (Artigo 12, PIDESC, Artigo 6, CRC); família e consentimento para casamento (Artigo 10, PIDESC, Artigo 23, PIDCP); e liberdade de exploração e abuso sexual (Artigo 34, CRC).
III. Necessidade e proporcionalidade
A necessidade e a proporcionalidade exigem que as restrições à expressão “devem ser adequadas para atingir sua função de proteção; devem ser o instrumento menos intrusivo entre aqueles que podem atingir sua função de proteção; devem ser proporcionais ao interesse a ser protegido” (Artigo 19(3) do PIDCP, Comentário Geral N.º 34, parágrafo 34).
O Comitê considera que a remoção do conteúdo foi necessária para proteger os direitos das crianças à saúde física e mental, privacidade, educação e liberdade de todas as formas de discriminação. O conteúdo facilitou a prática do casamento infantil, que, como discutido acima, está associado a impactos negativos significativos, especialmente para meninas. Considerando que o conteúdo buscava fornecer auxílio material para permitir essa prática prejudicial, a remoção foi a forma menos restritiva de proteger os direitos das crianças. Medidas menos restritivas, como a rotulagem, não teriam sido suficientes para impedir que os usuários acessassem os serviços promovidos.
A decisão da Meta de remover a liberdade de expressão para proteger os direitos das crianças foi proporcional. A publicação nesse caso facilita o casamento infantil ao anunciar serviços de beleza que incentivam as meninas a contratarem esses serviços em preparação para o próprio casamento, auxiliando assim materialmente o casamento infantil. O valor expressivo dessa publicação se concentrou principalmente na divulgação de serviços de beleza que facilitam a prática do casamento infantil.
Embora a publicação violasse a proibição de “facilitação” do casamento infantil, o Comitê também considerou se a Meta deveria expandir essa política para proibir explicitamente conteúdo que apoiasse de forma mais geral o casamento infantil.
Isso apresenta uma tensão entre duas questões: por um lado, as consequências problemáticas de permitir conteúdo em plataformas que, de forma mais geral, apoiam o casamento infantil; por outro lado, as potenciais consequências negativas de expandir a Política sobre Exploração Humana para proibir esse conteúdo.
Para a maioria dos membros do Comitê, permitir conteúdo em plataformas que apoiam de forma mais geral o casamento infantil pode contribuir para a normalização dessa prática extremamente prejudicial. Falar positivamente sobre a prática, insinuando que o casamento infantil deve ser permitido ou celebrado, ou legitimar ou defender a prática alegando que ela tem uma justificativa moral, política, lógica ou outra, pode contribuir para essa normalização, em detrimento do melhor interesse da criança. De acordo com o Artigo 3 da Convenção sobre os Direitos da Criança, “em todas as ações relativas a crianças, ... o interesse superior da criança será uma consideração primordial.”
Um comentário público da Equality Now (PC 29268) observou que “a normalização do casamento infantil perpetua um ciclo de violações dos direitos humanos que afeta profundamente as meninas e nega a elas seus direitos humanos básicos. Essa normalização está arraigada em crenças culturais e religiosas.”
Na decisão do caso Imagem retratando violência de gênero, o Comitê expressou preocupação de que as políticas existentes da Meta não abordam adequadamente o conteúdo que normaliza a violência de gênero, enaltecendo-a ou sugerindo que ela é merecida. O casamento infantil, que afeta principalmente meninas, é uma forma de violência de gênero. Em resposta à recomendação do Comitê naquele caso, a Meta modificou sua Política sobre Violência e Incitação para proibir a “glorificação da violência de gênero, praticada por parceiro íntimo ou baseada em honra”.
A maioria dos membros do Comitê enfatiza que o ambiente digital pode agravar os riscos de normalização do casamento infantil e a disseminação de conteúdo prejudicial. O CRC também fez um apelo aos estados para que eles tomem medidas a fim de impedir a disseminação online de materiais e serviços que possam prejudicar a saúde mental ou física das crianças, garantindo ao mesmo tempo o respeito pela liberdade de expressão (Comentário Geral n.º 25, parágrafos. 14, 54 e 96). Embora a Internet e as redes sociais também possam ser ferramentas valiosas para fornecer informações e oportunidades de debate entre crianças, o CRC e o CEDAW observaram que práticas prejudiciais, como o casamento infantil, podem estar aumentando “como resultado de desenvolvimentos tecnológicos, como o uso generalizado das redes sociais” (CEDAW/C/GC/31/Rev.1, parágrafo 18). O Conselho de Direitos Humanos da ONU também pediu que os Estados tomem “medidas abrangentes, multissetoriais e baseadas nos direitos humanos para prevenir e eliminar o casamento forçado e abordar suas causas estruturais e subjacentes e seus fatores de risco (A/HRC/RES/53/23, parágrafo 3).” A Meta está em uma posição única para contribuir para a erradicação do casamento infantil em suas plataformas, seguindo seu compromisso de respeitar os padrões de direitos humanos de acordo com os Princípios Orientadores da ONU sobre Empresas e Direitos Humanos.
A maioria reconhece que, embora a proibição do apoio ao casamento infantil possa ajudar a fortalecer a proteção dos direitos das crianças, esses termos podem ser muito vagos. No contexto das proibições de conteúdos relacionados com o terrorismo, o Relator Especial da ONU sobre a liberdade de expressão descreveu as proibições das plataformas de redes sociais sobre “apoio” como “excessivamente vagas” (A/HRC/38/35, parágrafo 26; ver também: Comentário Geral n.º 34, parágrafo 46). Se a Meta proibisse o discurso em apoio ao casamento infantil, ela deveria definir claramente esse termo para sua aplicação no contexto específico do casamento infantil. Além disso, para evitar a over-enforcement (aplicação excessiva) para expressões e opiniões que constituem discurso protegido e impedir o silenciamento de discussões críticas e contradiscursos que poderiam contribuir para a proteção dos direitos das crianças, a empresa deve fornecer aos seus analistas de conteúdo orientação interna adequada e oportunidades e recursos suficientes para aplicar com precisão as exceções estabelecidas na Política sobre Exploração Humana (por exemplo, publicadas em contextos de condenação, educacionais, de conscientização ou de reportagem).
Para uma minoria de membros do Comitê, a proibição de discurso em apoio ao casamento infantil seria inerentemente muito vaga, mesmo se especificada da maneira que a maioria sugere. Além disso, embora o casamento infantil em si claramente cause danos significativos e viole uma série de direitos, não há evidências suficientes de que o discurso em apoio a ele cause danos reais ou que a remoção dessas publicações ajudaria a resolver o problema mais rapidamente do que permitir reações e um debate público sobre o assunto. Especialistas consultados pelo Comitê observaram que há estudos ou evidências limitados sobre como as representações do casamento infantil nas redes sociais afetam as percepções sociais do problema. Esses membros do Comitê também consideram que o termo "normalização" é muito vago e amorfo, e a conexão causal entre o discurso de “apoio” ao casamento infantil e os danos da “normalização” é muito remota em termos de causalidade de danos no mundo real. Além disso, para esses membros do Comitê, uma avaliação de meios menos intrusivos (por exemplo, rotular e direcionar os usuários para informações confiáveis sobre os danos do casamento infantil, impedir o compartilhamento de uma publicação, rebaixar a publicação etc.) também seria necessária antes de determinar que a remoção do “apoio” ao casamento infantil é a medida menos intrusiva.
Embora possa haver situações em que o discurso em apoio ao casamento infantil cause danos reais, proibições gerais de conteúdo considerado como apoio à prática podem levar à remoção de expressões e opiniões que não causam danos e, portanto, constituem discurso protegido. Os riscos de “normalização” da prática devem ser abordados por meio da conscientização (por exemplo, rótulo que direcione os usuários para os danos do casamento infantil) e contradiscurso, em vez de censura. O Relator Especial da ONU sobre a Liberdade de Expressão observou que “o contradiscurso tem sido uma estratégia de resposta bem-sucedida [ao] expor o discurso de ódio” (A/78/288, parágrafo 109) e destacou a importância de “expandir o acesso à informação e às ideias que combatam mensagens de ódio” (A/74/486, parágrafo 18). Esses Membros consideram que essa conclusão é igualmente aplicável no contexto do casamento infantil.
Para a minoria, expandir a Política sobre Exploração Humana para proibir conteúdo que apoie o casamento infantil pode ter consequências não intencionais e contraproducentes para os esforços de combatê-lo, ao suprimir o debate e o contradiscurso que podem, de fato, ajudar a desafiar as normas e atitudes sociais predominantes em relação ao casamento infantil e contribuir para sua erradicação. Esses membros do Comitê consideram que um Padrão da Comunidade que suprime todo discurso que "apoie" o casamento infantil, especialmente quando aplicado em escala, resultará inevitavelmente na remoção de uma quantidade desproporcional de discurso além do que é permitido de acordo com os padrões humanos internacionais.
No geral, o Comitê ficou dividido sobre as vantagens e desvantagens de uma proibição de “apoio” e não chegou a uma conclusão definitiva sobre essa questão. Como esse caso em particular estava focado em “facilitação”, o Comitê não teve oportunidade de considerar em detalhes suficientes as muitas implicações potenciais de como uma proibição de “apoio” seria implementada pela Meta na prática. Por exemplo, o Comitê não tem informações suficientes sobre a viabilidade da Meta identificar e distinguir claramente as declarações de “apoio” das neutras ou sobre as potenciais taxas de erro. Consequentemente, o Comitê acredita que essa questão deve ser analisada em um caso futuro.
Por fim, sobre a proporcionalidade da resposta da Meta, o Comitê recebe com satisfação o fato de a empresa não ter aplicado uma advertência contra o usuário que publicou o conteúdo porque removeu a publicação com base no espírito da permissão da política e não na letra da política, e determinou que a remoção foi suficiente, sem necessidade de penalização adicional na forma de uma advertência. O Comitê enfatiza o valor de separar as ações de monitoramento da Meta em relação ao conteúdo das penalidades aplicadas aos usuários.
6. Decisão do Comitê de Supervisão
O Comitê de Supervisão apoia a decisão da Meta de remover o conteúdo.
7. Recomendações
A. Política de Conteúdo
1. Para garantir clareza aos usuários, a Meta deve modificar a Política sobre Exploração Humana para declarar explicitamente que casamentos forçados incluem casamento infantil.
O Comitê considerará essa recomendação implementada quando a Meta atualizar seus Padrões da Comunidade sobre Exploração Humana voltado ao público para refletir a mudança.
2. Para garantir clareza aos usuários, a Meta deve modificar a Política sobre Exploração Humana para definir o casamento infantil de acordo com os padrões internacionais de direitos humanos, incluindo casamento e uniões informais de crianças menores de 18 anos.
O Comitê considerará essa recomendação implementada quando a Meta atualizar seus Padrões da Comunidade sobre Exploração Humana voltado ao público para refletir a mudança.
B. Monitoramento
3. A Meta deve fornecer orientação explícita aos analistas humanos sobre a inclusão do casamento infantil na definição de casamentos forçados.
O Comitê considerará que essa recomendação foi implementada quando a Meta fornecer documentos internos atualizados que demonstrem que a mudança foi implementada.
4. Para proteger os direitos das crianças e evitar que a Meta recorra ao espírito da permissão da política, a empresa deve expandir a definição de facilitação em suas diretrizes internas para incluir o fornecimento de qualquer tipo de auxílio material (que inclui “serviços”) para permitir a exploração.
O Comitê considerará que essa recomendação foi implementada quando a Meta fornecer documentos internos atualizados que demonstrem que a mudança foi implementada.
O Comitê de Supervisão também reitera a importância de suas recomendações anteriores solicitando uma explicação pública do espírito da permissão de política a ser fornecido (decisão do caso Produtos farmacêuticos do Sri Lanka, recomendação n.º 1, reiterada na decisão do caso Violência comunitária no estado indiano de Odisha). Em nossa decisão sobre o caso Produtos farmacêuticos do Sri Lanka, o Comitê fez uma recomendação solicitando que a Meta explicasse na página inicial dos Padrões da Comunidade que concessões podem ser feitas quando seu fundamento e os valores da Meta exigirem um resultado diferente de uma interpretação rígida das regras. Além disso, o Comitê solicitou que a Meta incluísse um link para uma página da Central de Transparência fornecendo informações sobre a permissão do “espírito da política”. O Comitê monitorará a implementação dessa recomendação, com a qual a Meta já se comprometeu.
*Nota processual:
- As decisões do Comitê de Supervisão são tomadas por painéis de cinco membros e aprovadas por maioria de votos do Comitê inteiro. As decisões dele não representam, necessariamente, as opiniões de todos os membros.
- De acordo com seu Estatuto, o Comitê de Supervisão pode analisar apelações de usuários cujo conteúdo foi removido pela Meta, apelações de usuários que denunciaram conteúdo que a Meta manteve ativo e decisões que a Meta encaminha a ele (Seção 1 do Artigo 2 do Estatuto). O Comitê tem autoridade vinculativa para manter ou anular as decisões de conteúdo da Meta (Seção 5 do Artigo 3 e 4 do Estatuto). O Comitê pode emitir recomendações não vinculativas às quais a Meta é obrigada a responder (Seção 4 do Artigo 3 e 4 do Estatuto). Quando a Meta se compromete a agir de acordo com as recomendações, o Comitê monitora sua implementação.
- Para a decisão sobre o caso em questão, uma pesquisa independente foi encomendada em nome do Comitê. O Comitê recebeu assistência da Duco Advisors, uma empresa de consultoria especializada na intercessão entre as áreas de geopolítica, confiança e segurança, e tecnologia. A Memetica, um grupo de investigações digitais que fornece serviços de consultoria de risco e inteligência contra ameaças para mitigar danos online, também forneceu pesquisas.
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