Anulado
Questionamento sobre Adderall®
O Comitê de Supervisão revogou a decisão original da Meta de remover uma publicação do Facebook que pedia conselhos sobre como falar com um médico sobre o medicamento controlado Adderall®.
Resumo do caso
O Comitê de Supervisão revogou a decisão original da Meta de remover uma publicação do Facebook que pedia conselhos sobre como falar com um médico sobre o medicamento controlado Adderall®. O Comitê não encontrou nenhuma conexão direta ou imediata entre o conteúdo e a possibilidade de dano.
Sobre o caso
Em junho de 2021, um usuário do Facebook nos Estados Unidos criou uma publicação em um grupo privado que afirma ser para adultos com transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH). O usuário se identifica como uma pessoa que tem TDAH e pergunta ao grupo como falar com um médico sobre medicamentos específicos. Ele declara que recebeu uma prescrição de Xanax, mas que o remédio Adderall funcionou para ele no passado, ao passo que outros medicamentos “zombie me out” (“o deixavam dopado”). A pessoa em questão se mostra preocupada em exibir comportamento de dependente químico ao pedir uma receita diretamente ao médico. A publicação tinha comentários de membros do grupo que ofereciam conselhos sobre como explicar a situação a um médico.
Em agosto de 2021, a Meta removeu o conteúdo de acordo com a política dos Padrões da Comunidade do Facebook sobre produtos e serviços restritos. Além da remoção, a Meta restringiu a conta do usuário por 30 dias. Como o Comitê selecionou o caso em apreço, a Meta identificou a remoção como um “erro de monitoramento” e restaurou o conteúdo.
Principais conclusões
O Comitê conclui que a decisão original da Meta de remover a publicação não está em conformidade com os Padrões da Comunidade do Facebook. A política dos Padrões da Comunidade sobre produtos e serviços restritos não proíbe conteúdo que busque aconselhamento sobre medicamentos controlados no contexto de problemas de saúde.
O Comitê conclui que as definições de substâncias nos termos da política dos Padrões da Comunidade do Facebook sobre produtos e serviços restritos não são suficientemente transparentes para os usuários. As regras são particularmente vagas porque, de acordo com as definições internas compartilhadas com o Comitê, o Adderall e o Xanax podem ser considerados drogas não medicinais ou medicamentos controlados de acordo com as circunstâncias. A Meta não define drogas não medicinais ou medicamentos controlados em nenhum documento destinado ao público.
O Comitê considera que a decisão da Meta de remover a publicação é desnecessária e desproporcional. Não havia conexão direta ou imediata entre o conteúdo e a possibilidade de dano. O usuário expressou claramente que tinha a intenção de buscar informações relacionadas à saúde e colocou os dizeres “CW: Medication, addiction” (“Aviso de conteúdo: medicamento, vício”) para alertar sobre os riscos associados às drogas que a publicação discutia.
A remoção da publicação por parte da Meta também gerou uma advertência ao usuário, o que, com advertências anteriores, resultou na restrição da conta dele por 30 dias. Essa violação da liberdade de expressão do usuário não foi revertida antes do fim desse período, e a Meta falhou na sua responsabilidade de dar ao usuário uma solução efetiva. No futuro, a empresa deve analisar as apelações dos usuários em tempo hábil quando medidas de monitoramento aplicadas a conteúdo geram penalidades para a conta.
A decisão do Comitê de Supervisão
O Comitê de Supervisão revoga a decisão original da Meta de remover o conteúdo.
Como recomendação de política, o Comitê aconselha que a Meta faça o seguinte:
- Publique as definições internas de “drogas não medicinais” e de “medicamentos controlados” na política dos Padrões da Comunidade do Facebook sobre produtos e serviços restritos. As definições publicadas devem (a) tornar claro que certas substâncias podem se encaixar em “drogas não medicinais” ou em “medicamentos controlados” e (b) explicar as circunstâncias sob as quais uma substância se encaixaria em cada categoria.
- Estude as consequências, os prós e os contras de implementar um sistema dinâmico de priorização que organize apelações para análise humana e considere se o fato de uma decisão de monitoramento resultar em uma restrição de conta deve ser um critério dentro desse sistema. A Meta deve compartilhar os resultados dessas investigações com o Comitê e publicá-los no nosso relatório trimestral de transparência para demonstrar que cumpriu essa recomendação.
- Realize avaliações periódicas sobre as taxas de precisão dos analistas com foco na política sobre produtos e serviços restritos. A Meta deve compartilhar os resultados dessas avaliações com o Comitê, inclusive como esses resultados serão usados para aprimorar as operações de monitoramento e o desenvolvimento de políticas, e resumir os resultados nos nossos relatórios trimestrais de transparência. A Meta pode considerar se essas avaliações devem ser estendidas às taxas de precisão dos analistas de acordo com outras políticas dos Padrões da Comunidade.
*Os resumos de caso dão uma visão geral da ocorrência e não têm valor precedente.
Decisão completa sobre o caso
1. Resumo da decisão
O Comitê de Supervisão revogou a decisão original da Meta de remover uma publicação do Facebook que pedia conselhos sobre como falar com um médico sobre a prescrição de dextroanfetamina e anfetamina, um medicamento controlado mais conhecido pelo nome da marca Adderall®, para o tratamento de TDAH. O Comitê conclui que o conteúdo não violou os Padrões da Comunidade do Facebook. O Comitê também recomenda que a Meta publique as definições internas sobre o que constitui “drogas farmacêuticas” e “medicamentos controlados” e esclareça a política sobre produtos e serviços restritos. A empresa também deve estudar as consequências, os prós e os contras de implementar um sistema dinâmico de priorização que organize apelações para análise humana, realizar periodicamente avaliações de precisão dos analistas e compartilhar esses dados com o Comitê.
2. Descrição do caso
Em junho de 2021, um usuário do Facebook nos Estados Unidos criou uma publicação em um grupo privado que declara, na sua biografia, que é para adultos com TDAH. A publicação apresenta um texto em inglês, com os dizeres "CW: Medication, addiction" (“Aviso de conteúdo: medicamento, vício”) no início. O usuário se identifica como uma pessoa que tem TDAH e pergunta ao grupo como falar com um médico sobre medicamentos específicos. Ele declara que recebeu uma prescrição de Xanax, mas que o remédio Adderall funcionou para ele no passado, ao passo que outros medicamentos “zombie me out” (“o deixavam dopado”). A pessoa em questão se mostrou preocupada em exibir comportamento de dependente químico ao pedir uma receita diretamente ao médico. A publicação tinha comentários de membros do grupo que descreviam suas próprias experiências e ofereciam conselhos sobre como explicar a situação a um médico. Os administradores do grupo estão no Canadá e na Nova Zelândia.
Nenhum usuário denunciou o conteúdo. A Meta afirma que a tecnologia classificadora deu uma pontuação baixa ao conteúdo quando ele foi publicado, o que significa que a tecnologia determinou que era improvável que houvesse uma violação. Essa pontuação baixa, combinada com nenhum outro sinal que pudesse acionar uma análise de conteúdo (como o efeito viral), fez com que o conteúdo não fosse enviado para análise humana. Quase dois meses depois, em agosto de 2021, o conteúdo foi selecionado como parte de uma amostra aleatória para treinar a tecnologia classificadora da Meta. Um analista humano rotulou o conteúdo como violador da política dos Padrões da Comunidade sobre produtos e serviços restritos. A Meta disse o seguinte ao Comitê: “Embora o principal propósito dessa análise seja desenvolver conjuntos de treinamento para classificadores, quando um analista rotula um conteúdo como violador, a Meta o remove de acordo com os Padrões da Comunidade”. Portanto, a Meta removeu o conteúdo de acordo com a política dos Padrões da Comunidade do Facebook sobre produtos e serviços restritos. Segundo essa política, a Meta remove conteúdo que “tente comprar, vender ou comercializar medicamentos controlados” ou “solicit[e] medicamentos controlados, exceto quando o conteúdo discute a acessibilidade e a eficácia dos medicamentos em um contexto médico”.
O usuário contestou a decisão de remover o conteúdo. Após uma análise humana, a Meta manteve a decisão original de remover o conteúdo. Depois disso, o usuário enviou uma apelação ao Comitê. Como o Comitê selecionou o caso em apreço, a Meta identificou a remoção como um “erro de monitoramento” e restaurou o conteúdo em setembro de 2021. A Meta declara que, quando o conteúdo foi restaurado, o classificador também foi atualizado para refletir a correção do rótulo como não violador.
No momento da remoção, o conteúdo tinha sido visto mais de 700 vezes, mas não tinha sido compartilhado. Após a remoção, a conta do usuário foi restringida por 30 dias, o que impediu que ele criasse conteúdo na plataforma, interagisse com grupos (como criá-los, publicar ou comentar neles) e criasse salas do Messenger ou participasse delas. O usuário ainda conseguia usar o Facebook Messenger para se comunicar com outros usuários.
3. Autoridade e escopo
Segundo o seu Estatuto, o Comitê de Supervisão é um órgão autônomo designado para proteger a liberdade de expressão por meio da tomada de decisões independentes e baseadas em princípios sobre conteúdos importantes. Ele opera de forma transparente, exercendo julgamentos neutros e independentes e tomando decisões com imparcialidade. O Comitê tem autoridade para analisar a decisão da Meta após uma apelação do usuário cujo conteúdo foi removido, segundo a Seção 1 do Artigo 2 do Estatuto e a Bylaws Article 3, Section 1 (Seção 1 do Artigo 3 dos Regulamentos Internos). De acordo com a Seção 5 do Artigo 3 do Estatuto, o Comitê pode manter ou reverter essa decisão, que é vinculante para a Meta, segundo o Artigo 4 do Estatuto. A Meta também deve avaliar a viabilidade de aplicar sua decisão no que diz respeito a conteúdo idêntico em contexto paralelo, segundo o Artigo 4 do Estatuto.
As decisões do Comitê podem incluir declarações de parecer consultivo com recomendações. que não são vinculativas, mas às quais a Meta deve responder, de acordo com a Seção 4 do Artigo 3 e com o Artigo 4 do Estatuto.
4. Padrões relevantes
Em sua decisão, o Comitê de Supervisão considerou os seguintes padrões:
I. Padrões da Comunidade do Facebook
Após o conteúdo ser publicado pela primeira vez, em junho de 2021, a versão estadunidense da política dos Padrões da Comunidade do Facebook sobre produtos e serviços restritos, anteriormente denominada a política dos Padrões da Comunidade sobre produtos regulamentados, foi atualizada três vezes antes de o caso ser atribuído ao Comitê e uma vez em novembro de 2021, após a atribuição. A versão atual tem categorias separadas para drogas “não medicinais” e medicamentos “controlados”, com regras diferentes sobre qual tipo de conteúdo é permitido em cada categoria. O Comitê observa que outras versões da política dos Padrões da Comunidade sobre produtos e serviços restritos (por exemplo, a versão britânica) ainda não foram atualizadas com as alterações mais recentes, como o nome e o fundamento da política.
Quanto a “medicamentos controlados”, a política atual proíbe o conteúdo que:
“Tente comprar, vender ou comercializar medicamentos controlados, exceto ao:
- Listar o preço das vacinas em um contexto explícito de informação ou discussão.
- Oferecer a entrega quando afixada por empresas legítimas de comércio eletrônico na área da saúde.
Tentar doar ou presentear alguém com medicamentos controlados.
Solicitar medicamentos controlados, exceto quando o conteúdo discute a acessibilidade e a eficácia dos medicamentos em um contexto médico.”
No momento da publicação do conteúdo, em junho de 2021, os medicamentos “controlados” não estavam em uma categoria separada. O Facebook proibia o seguinte: “[c]onteúdo que tente comprar, vender, trocar, doar, presentear ou solicitar maconha ou medicamentos controlados”.
No caso de “drogas não medicinais”, a política atual proíbe o conteúdo que:
“Tente comprar, vender, comercializar, doar, presentear ou solicitar drogas não medicinais ou coordenar o comércio delas.
Admita a compra, a comercialização ou a coordenação da comercialização de drogas não medicinais praticadas pela pessoa que publicou o conteúdo ou por terceiros.
Admita o uso pessoal sem atestar nem indicar a recuperação, o tratamento ou outra assistência para combater o uso. Este conteúdo não pode promover, encorajar o uso, coordenar ou fornecer instruções para fazer ou usar drogas não medicinais.
Coordena ou promove (ou seja, elogia, encoraja o uso ou fornece instruções para usar ou fabricar) drogas não medicinais.”
Quanto a “drogas não medicinais”, quando o conteúdo foi publicado, em junho de 2021, a política dos Padrões da Comunidade proibia o conteúdo que:
“Tente comprar, vender, trocar, doar, presentear ou solicitar drogas não medicinais.
Admita comprar ou comercializar drogas não medicinais, atos praticados pela própria pessoa que publicou o conteúdo ou por meio de outros.
Admita o uso pessoal sem atestar nem indicar a recuperação, o tratamento ou outra assistência para combater o uso.
Fale de forma positiva, estimule, coordene ou forneça instruções sobre o uso ou a fabricação de drogas não medicinais.”
II. Os valores da Meta
Os valores da Meta são descritos na introdução aos Padrões da Comunidade do Facebook. O valor “Voz” é definido como “fundamental”:
o objetivo de nossos Padrões da Comunidade sempre foi criar um local de expressão e dar voz às pessoas. [...] Queremos que as pessoas possam falar abertamente sobre os assuntos importantes para elas, ainda que sejam temas que geram controvérsias e objeções.
A Meta limita o valor de “vozes” em nome de quatro valores, dois dos quais são relevantes aqui:
“Segurança”: temos o compromisso de fazer do Facebook um lugar seguro. Conteúdo com ameaças podem intimidar, excluir ou silenciar pessoas, e isso não é permitido no Facebook.
“Dignidade”: acreditamos que todas as pessoas são iguais no que diz respeito à dignidade e aos direitos.
III. Padrões de Direitos Humanos
Os Princípios Orientadores da ONU sobre Empresas e Direitos Humanos (UNGPs, na sigla em inglês), endossados pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU em 2011, estabelecem uma estrutura voluntária de responsabilidades sobre direitos humanos das empresas privadas. A Corporate Human Rights Policy (Política Corporativa de Direitos Humanos), da Meta, anunciada em 16 de março de 2021, reflete o compromisso da empresa de respeitar os direitos de acordo com os UNGPs. Neste caso, os padrões de direitos humanos abaixo foram levados em consideração na análise do Comitê sobre as responsabilidades da Meta.
- O direito de liberdade de opinião e expressão: Article 19, International Covenant on Civil and Political Rights (Artigo 19 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, PIDCP, na sigla em inglês); General comment No. 34, Human Rights Committee, de 2011 (Comentário geral n.º 34, do Comitê de Direitos Humanos, de 2011); UN Special Rapporteur on freedom of opinion and expression, report: A/HRC/38/35, 2018 (Relatório do relator especial da ONU sobre promoção e proteção do direito à liberdade de opinião e de expressão: A/HRC/38/35, de 2018); Artigos 1 e 21 da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CIDPD).
- Direito à saúde: Article 12, International Covenant on Economic, Social and Cultural Rights (Artigo 12 do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, ICESCR, na sigla em inglês); General comment No. 14, the Committee on Economic, Social and Cultural Rights, 2000 (Comentário geral n.º 14, do Comitê dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, de 2000).
- Acesso a um recurso efetivo: Artigo 2 do PIDCP; General Comment No. 31, Human Rights Committee, 2004 (Comentário geral n.º 31, do Comitê de Direitos Humanos, de 2004); UN Guiding Principles on Business and Human Rights Principles 22, 29, 31 (Princípios 22, 29 e 31 dos UNGPs).
5. Declaração do usuário
O usuário declara ser uma pessoa com TDAH e ter criado uma publicação para perguntar a outros pacientes como eles falavam com médicos sobre esses medicamentos, pois ele não queria que o médico dele pensasse que estava vendendo essas drogas ou abusando delas. A pessoa estava nervosa com a conversa e queria saber como fazer as perguntas de modo apropriado e com cuidado. Ela declara que a publicação deixa claro que não pretende vender o medicamento, abusar dele ou obtê-lo ilegalmente.
6. Explicação sobre a decisão da Meta
Após o Comitê selecionar o caso, a Meta decidiu que a remoção do conteúdo original foi um erro e o restaurou.
A Meta declara que a política sobre produtos e serviços restritos distingue “drogas não medicinais” de “medicamentos controlados” para encontrar um equilíbrio entre o valor de “vozes” e o de “segurança”. Ela também observa que certas drogas que normalmente se encaixam na descrição de “medicamentos controlados” apresentam risco de abuso e podem, se utilizadas para um fim não medicinal, ser tratadas como “drogas não medicinais”. Por exemplo, ela trata drogas como Oxycontin, Xanax ou Adderall como “medicamentos controlados” quando administradas da forma correta, mas as considera “drogas não medicinais” quando um conteúdo discute o uso delas “para atingir um estado de alteração mental”. Ela afirma que publicações “sobre esses tipos de drogas representam um desafio particular para análise, já que não há como avaliar a intenção do usuário. Além disso, os usuários que sofrem de dependência química ou que procuram comercializar drogas podem se infiltrar em grupos que têm como foco discussões médicas para evitar o monitoramento”.
A Meta declara que, neste caso, o usuário discutiu o Adderall e o Xanax no contexto de tratamento de um problema de saúde, o TDAH, e não indicou nada que sugerisse que as drogas fossem usadas para atingir um estado de alteração mental. Logo, o conteúdo se relaciona a “medicamentos controlados”, não “drogas não medicinais”.
A Meta explica que, como o conteúdo tratava sobre acesso a medicamentos controlados, ele não violou a política sobre produtos e serviços restritos, que proíbe o conteúdo que “[s]olicit[e] medicamentos controlados, exceto quando o conteúdo discute a acessibilidade e a eficácia dos medicamentos em um contexto médico”. No conteúdo em questão, o usuário não solicitou drogas, mas procurava conselhos sobre como pedir a prescrição delas a um médico. Além disso, “mesmo se o usuário solicitasse drogas para uso médico, o conteúdo está relacionado à acessibilidade e à eficiência das drogas em questão”. Portanto, a Meta conclui que o conteúdo não deveria ter sido removido.
Quanto ao sistema de análise, a Meta informa que prioriza a avaliação inicial de conteúdo. No entanto, conforme explicado ao Comitê, não há uma estrutura de priorização para apelações, que são analisadas “por ordem de chegada”. Além disso, a empresa explicou que “tem explorado opções para adotar uma estrutura de priorização”.
7. Envios de terceiros
O Comitê de Supervisão considerou 16 comentários públicos relacionados ao caso em questão. Quatro comentários foram enviados do Sul da Ásia e da Ásia Central; quatro, da Europa; dois, do Oriente Médio e do Norte da África; e seis, dos Estados Unidos e do Canadá.
Os envios abarcaram os seguintes temas: classificação de substâncias controladas em padrões internacionais e leis de vários países, abuso de Adderall e conteúdo relacionado à venda dessa droga no Facebook.
Para ler os comentários públicos enviados sobre este caso, clique aqui.
8. Análise do Comitê de Supervisão
8.1 Conformidade com os Padrões da Comunidade
O Comitê concorda com a Meta que a decisão original de remover a publicação não está em conformidade com os Padrões da Comunidade do Facebook.
A Meta distingue “drogas não médicas” de “medicamentos controlados” e observa que certas drogas que apresentam risco de abuso normalmente se encaixam na descrição de “medicamento controlado” e podem, se utilizadas para um fim não medicinal, ser tratadas como “drogas não medicinais”. O Comitê concorda com a Meta que, neste caso, o usuário estava discutindo o Adderall e o Xanax em um contexto médico e que, por isso, são considerados “medicamentos controlados” para fins de aplicação da política dos Padrões da Comunidade sobre produtos e serviços restritos.
A política dos Padrões da Comunidade sobre produtos e serviços restritos não proíbe conteúdo que busque aconselhamento sobre medicamentos controlados no contexto de problemas de saúde. Neste caso, o usuário não estava tentando comprar, vender, comercializar, doar ou solicitar medicamentos controlados. Como a própria Meta observa na sua justificativa: “mesmo se o usuário solicitasse drogas para uso médico, o conteúdo está relacionado à acessibilidade e eficiência das drogas em questão”.
8.2 Conformidade com os valores da Meta
A decisão original da Meta de remover o conteúdo não é coerente com os valores da empresa. A Meta declara que a política dos Padrões da Comunidade sobre produtos e serviços restritos tem como objetivo encontrar um equilíbrio entre o valor de “vozes” e o de “segurança”. A política não procura proibir conteúdo como o da publicação deste caso, em que um usuário estava buscando conselhos sobre a acessibilidade de um medicamento controlado para o tratamento de um problema de saúde. A política da Meta está correta em permitir esse tipo de conteúdo, logo essa remoção errônea não está em conformidade com os seus valores.
O Comitê também observa a relevância do valor de “dignidade”, pois pessoas com TDAH ou outros problemas de saúde que buscam conselhos sobre medicamentos controlados podem sofrer um impacto desproporcional de erros de monitoramento que restringem o valor de “vozes”.
8.3 Conformidade com as responsabilidades sobre direitos humanos da Meta
O Comitê considera que a decisão da Meta de remover a publicação não estava de acordo com os padrões internacionais de direitos humanos. A Meta se comprometeu a respeitar os direitos humanos de acordo com os UNGPs. A Política Corporativa de Direitos Humanos declara que esse compromisso inclui o PIDCP, o ICESCR e a CIDPD.
Liberdade de expressão e de acesso à informação
O parágrafo 2 do Artigo 19 do PIDCP oferece ampla proteção à liberdade de expressão. Esse direito inclui a “liberdade de procurar, receber e difundir informações e ideias de qualquer natureza”. O Artigo 21 da CIDPD aplica essa proteção a pessoas com deficiências, que, de acordo com o Artigo 1, incluem “aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas”. A CIDPD garante que as pessoas com deficiência podem exercer essa liberdade “em igualdade de oportunidades com as demais pessoas e por intermédio de todas as formas de comunicação de sua escolha”, segundo o Artigo 21 da Convenção. O Comitê da ONU sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais deixa claro que o “access to health-related education and information” (“acesso a educação e informações sobre saúde”) é uma parte fundamental do direto à saúde garantido pelo Artigo 12 do ICESCR, segundo o parágrafo 11 do Comentário geral n.º 14.
Neste caso, o usuário declara que é um paciente com TDAH, que pode ser considerado uma deficiência de acordo com a definição do Artigo 1 do CIDPD. Além disso, o usuário discutiu e buscou informações relacionadas à saúde compartilhando experiências que já teve com o Adderall e o Xanax. Ele estava buscando conselhos sobre como pedir esses medicamentos a um médico para tratar seu problema de saúde.
Embora o direito à liberdade de expressão seja fundamental, ele não é absoluto. Quando um Estado impõe restrições à expressão, elas devem atender aos requisitos de legalidade, objetivo legítimo e necessidade e proporcionalidade, segundo o parágrafo 3 do Artigo 19 do PIDCP. Como mencionado acima, a Meta assumiu o compromisso voluntário de respeitar os padrões de direitos humanos. A remoção da publicação pela Meta não passou na primeira e na terceira parte desse teste.
I.Legalidade (clareza e acessibilidade das regras)
Quaisquer regras que restrinjam a expressão devem ser claras, precisas e acessíveis ao público, segundo o parágrafo 25 do Comentário geral n.º 34. As pessoas devem ter informações suficientes para determinar se e como seu discurso pode ser limitado e ajustar seu comportamento em conformidade.
O Comitê conclui que as definições de substâncias nos termos da política dos Padrões da Comunidade do Facebook sobre produtos e serviços restritos não são suficientemente compreensíveis e transparentes para os usuários. A política proíbe conteúdo relacionado com determinados produtos, incluindo armas de fogo, maconha, medicamentos controlados, drogas não medicinais, álcool e tabaco. A Meta não define drogas não medicinais e medicamentos controlados em nenhum documento destinado ao público. No entanto, conforme explicado ao Comitê, a empresa mantém definições internas para os moderadores, assim como listas confidenciais e não exaustivas de drogas não medicinais e de medicamentos controlados.
As regras aplicáveis são particularmente vagas porque, de acordo com as definições internas compartilhadas com o Comitê, o Adderall e o Xanax podem ser considerados drogas não medicinais ou medicamentos controlados de acordo com fatores de cada caso, como a intenção de uso da droga. Essa classificação não se encontra nos Padrões da Comunidade e, portanto, não seria evidente para os usuários. Caso fosse determinado que a publicação envolvia drogas não medicinais, embora o fato de o usuário admitir uso pessoal pudesse ser considerado como não violador por se referir a tratamento, a publicação ainda poderia ser interpretada como uma fala positiva sobre as drogas. Isso violaria a política dos Padrões da Comunidade sobre produtos e serviços restritos e levaria a um resultado diferente da classificação como medicamentos controlados.
O Comitê levou em conta casos em que o conteúdo que tentava vender as mesmas drogas permaneceu no Facebook. Essa informação foi extraída do comentário público PC-10281 da National Association of Boards of Pharmacy (Associação Nacional de Comitês de Farmácia), uma organização sem fins lucrativos sediada nos EUA cujos membros incluem os 50 comitês estaduais de farmácia, assim como os reguladores farmacêuticos das Bahamas, do Distrito de Columbia, de Guam, das Ilhas Virgens, de Porto Rico e de dez províncias canadenses. O Comitê observa que, para os usuários que podem ver esse conteúdo, a inconsistência no monitoramento pode resultar em uma confusão sobre o que é permitido no Facebook.
Com esses problemas, o Comitê conclui que a Meta não cumpriu sua responsabilidade de tornar as regras sobre produtos e serviços restritos claras e acessíveis aos usuários. Conforme recomendado abaixo, a Meta deve explicar as definições acima e inclui-las no texto da política em questão. Além disso, melhorar a consistência do monitoramento pode contribuir para um melhor entendimento de qual conteúdo é permitido na plataforma. Ao mesmo tempo, a Meta deve verificar se o treinamento dos analistas de conteúdo é adequado para garantir a precisão e a consistência do monitoramento. Ela também deve avaliar periodicamente as taxas de precisão dos analistas de acordo com a política sobre produtos e serviços restritos e compartilhar o resultado dessas avaliações com o Comitê e com o público.
II. Objetivo legítimo
Qualquer restrição à expressão deve se enquadrar em um dos objetivos legítimos listados no parágrafo 3 do Artigo 19 do PIDCP. A Meta tem a responsabilidade de assegurar que suas regras cumpram o princípio de legitimidade, segundo o parágrafo 45 do relatório A/HRC/38/35. Nesse sentido, o Comitê conclui que a política e a restrição, abordando o risco de abuso de drogas entre os usuários do Facebook, encaixam-se nos objetivos legítimos de proteger a saúde pública e de proteger o direto das demais pessoas à saúde.
III.Necessidade e proporcionalidade
Qualquer restrição à liberdade de expressão “deve ser apropriada para cumprir sua função protetora; deve ser o instrumento menos intrusivo entre aqueles que podem cumprir sua função protetora; deve ser proporcional ao interesse a ser protegido”, de acordo com o parágrafo 34 do Comentário geral n.º 34.
A interferência da Meta na liberdade de expressão do usuário foi desnecessária. O Comitê não encontrou nenhuma conexão direta ou imediata entre o conteúdo e a possibilidade de dano. Com base na publicação e na declaração do usuário, este apenas queria conselhos sobre como falar com o médico dele sobre o tratamento e não tinha a intenção de vender o medicamento, abusar dele, ou obtê-lo ilegalmente.
A remoção da publicação por parte da Meta também foi desproporcional. O usuário não só expressou claramente a intenção de buscar informações sobre saúde, mas também incluiu as palavras “CW: Medication, addiction” (“Aviso de conteúdo: medicamento, vício”), as quais o Comitê considera um aviso de conteúdo sobre os riscos associados às drogas em questão. O Comitê considera que a intenção clara do usuário, combinada com o aviso de conteúdo, foi suficiente para abordar os riscos de abuso e os possíveis danos à saúde pública. As consequências adversas da remoção, por outro lado, podem ser desastrosas. Uma moderação inadequada de conteúdo relacionado à saúde pode impedir vários usuários que dependem do Facebook de acessar informações para aprender mais sobre os seus problemas de saúde e participar de discussões sobre possíveis tratamentos.
Acesso a um recurso efetivo
O Artigo 2 do PIDCP garante um recurso efetivo para qualquer pessoa cujos diretos garantidos nesse Pacto sejam violados. De acordo com o parágrafo 15 do Comentário geral n.º 31, do Comitê de Direitos Humanos da ONU, “cessation of an ongoing violation is an essential element of the right to an effective remedy” (“a interrupção de uma violação em curso é um elemento essencial do direito a um recurso efetivo”). O acesso ao recurso é uma peça fundamental do sistema “Protect, Respect and Remedy” (“Proteger, Respeitar e Remediar”), dos UNGPs, segundo os Princípios 22, 29 e 31. Além disso, o relator especial da ONU sobre liberdade de opinião e expressão declarou que é um requisito mínimo de adesão que as empresas providenciem recursos adequados para impactos adversos nos direitos humanos, de acordo com o parágrafo 11(f), 38, 59 e 72 do relatório A/HRC/38/35. Isso se reflete nos compromissos voluntários da Meta, segundo a seção 3 da Política Corporativa de Direitos Humanos, “providing remedies for human rights impacts” (“fornecimento de recursos para impactos nos direitos humanos”).
Neste caso, a remoção da publicação por parte da Meta gerou uma advertência ao usuário, o que, com advertências anteriores, resultou em um limite de recursos de 30 dias à conta dele. Dado que o conteúdo foi restaurado 30 dias após a remoção, o Comitê está preocupado que o usuário tenha sido submetido a esse limite por todo esse tempo. O usuário foi punido por buscar informações sobre como falar com profissionais da área médica sobre o seu problema de saúde. A interferência na liberdade de expressão e em outros direitos relacionados do usuário não foi revertida até o caso ser levado ao conhecimento da Meta após a seleção do Comitê e também não foi remediada. A Meta falhou na sua responsabilidade de providenciar um recurso adequado. No futuro, ela deve analisar as apelações dos usuários em tempo hábil quando medidas de monitoramento aplicadas a conteúdo geram penalidades para a conta.
9. Decisão do Comitê de Supervisão
O Comitê de Supervisão revoga a decisão original da Meta de remover o conteúdo.
10. Declaração de parecer consultivo
Política de conteúdo
1. A Meta deve publicar as definições internas de “drogas não medicinais” e de “medicamentos controlados” na política dos Padrões da Comunidade do Facebook sobre produtos e serviços restritos. As definições publicadas devem (a) tornar claro que certas substâncias podem se encaixar em “drogas não medicinais” ou em “medicamentos controlados” e (b) explicar as circunstâncias sob as quais uma substância se encaixaria em cada categoria. O Comitê considerará que essa recomendação foi implementada quando essas mudanças forem feitas nos Padrões da Comunidade.
Monitoramento
2. A Meta deve estudar as consequências, os prós e os contras de implementar um sistema dinâmico de priorização que organize apelações para análise humana e considerar se o fato de uma decisão de monitoramento resultar em uma restrição de conta deve ser um critério dentro desse sistema. O Comitê considerará que essa recomendação foi implementada quando a Meta compartilhar os resultados dessas pesquisas com o Comitê e publicá-las no nosso relatório trimestral de transparência.
3. A Meta deve realizar avaliações periódicas sobre as taxas de precisão dos analistas com foco na política sobre produtos e serviços restritos. O Comitê considerará essa recomendação implementada quando a Meta compartilhar os resultados dessas avaliações com o Comitê, inclusive como esses resultados serão usados para aprimorar as operações de monitoramento e o desenvolvimento de políticas, e resumir os resultados nos nossos relatórios trimestrais de transparência. A Meta pode considerar se essas avaliações devem ser estendidas às taxas de precisão dos analistas de acordo com outras políticas dos Padrões da Comunidade.
*Observações sobre marcas comerciais:
O Adderall ® é uma marca registrada da empresa Takeda Pharmaceuticals U.S.A. Inc.
*Nota processual:
As decisões do Comitê de Supervisão são preparadas por grupos com cinco membros e aprovadas pela maioria do Comitê. As decisões do Comitê não representam, necessariamente, as opiniões pessoais de todos os membros.
Para a decisão sobre o caso em apreço, uma pesquisa independente foi contratada em nome do Comitê. Um instituto de pesquisa independente com sede na Universidade de Gotemburgo e com uma equipe de mais de 50 cientistas sociais de seis continentes, bem como mais de 3.200 especialistas de países do mundo todo. O Comitê também foi auxiliado pela Duco Advisors, uma empresa de consultoria especializada na intercessão entre as áreas de geopolítica, de confiança e segurança e de tecnologia.
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