Anulado
Documentário sobre abuso infantil no Paquistão
O Comitê de Supervisão revogou a decisão da Meta de remover um videodocumentário publicado pela Voice of America (VOA) Urdu que revela as identidades de crianças vítimas de abuso sexual e assassinato do Paquistão na década de 1990. A maioria acredita que a permissão para conteúdo de interesse jornalístico deveria ter sido aplicada.
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Resumo
O Comitê de Supervisão revogou a decisão da Meta de remover um videodocumentário publicado pela Voice of America (VOA) Urdu que revela as identidades de crianças vítimas de abuso sexual e assassinato do Paquistão na década de 1990. Embora o Comitê acredite que a publicação realmente tenha violado a política dos Padrões da Comunidade sobre Exploração sexual, nudez e abuso infantil, a maioria considera que deveria ter sido aplicada uma permissão para conteúdo de interesse jornalístico nesse caso. Os Membros do Comitê acreditam que o interesse público contínuo em denunciar o abuso infantil supera os danos potenciais da identificação das vítimas, as quais não sobreviveram aos crimes que ocorreram 25 anos atrás. De natureza amplamente factual e sensível às vítimas, o documentário da VOA Urdu poderia ter baseado o debate público sobre o amplo problema do abuso sexual infantil, que é denunciado com pouca frequência no Paquistão. Esse caso também destaca como a Meta poderia informar melhor aos usuários quais políticas se beneficiam da abertura de exceções e quais não.
Sobre o caso
Em janeiro de 2022, a transmissora Voice of America (VOA) Urdu publicou, na sua página do Facebook, um documentário de 11 minutos sobre Javed Iqbal, que assassinou e abusou sexualmente de 100 crianças no Paquistão na década de 1990. O documentário, no idioma urdu, traz detalhes perturbadores dos crimes e do julgamento do perpetrador. São mostradas imagens de recortes de jornal que exibem claramente os rostos das vítimas infantis, juntamente com seus nomes, além de uma filmagem com pessoas chorando que poderiam ser familiares. A legenda da publicação menciona que uma filmagem diferente sobre os crimes havia surgido recentemente no noticiário, além de alertar os espectadores sobre o conteúdo do documentário. Essa publicação teve cerca de 21,8 milhões de visualizações e 18 mil compartilhamentos.
Entre janeiro de 2022 e julho de 2023, 67 usuários denunciaram a publicação. Após análises tanto automatizadas quanto de humanos, a Meta chegou à conclusão de que não se tratava de um conteúdo violador. A publicação também foi sinalizada separadamente pelo sistema de Operações de Análise Antecipada de Alto Risco da Meta devido à sua probabilidade de se tornar viral. Isso levou a uma análise humana da equipe interna da Meta com especialidade em idioma, mercado e política (em vez de uma moderação humana terceirizada). Seguindo o encaminhamento interno, a equipe de política da Meta revogou a decisão original de manter a publicação ativa e a removeu por violar a Política sobre Exploração Sexual, Abuso e Nudez Infantil. A empresa decidiu não conceder uma permissão para conteúdo de interesse jornalístico. Em seguida, a Meta indicou esse caso ao Comitê.
Principais conclusões
A maioria do Comitê considera que a Meta deveria ter aplicado uma permissão para conteúdo de interesse jornalístico nesse caso, mantendo a publicação no Facebook. O Comitê acredita que a publicação violou os Padrões da Comunidade sobre Exploração Sexual, Abuso e Nudez Infantil, uma vez que é possível identificar os rostos e nomes das crianças vítimas de abuso sexual. Contudo, para a maioria, o interesse público em informar sobre esses crimes de abuso infantil superou os possíveis danos para as vítimas e suas famílias. Ao chegar à essa decisão, a maioria argumentou que o documentário foi produzido para aumentar a conscientização, não faz sensacionalismo sobre os assustadores detalhes e, mais importante, os crimes ocorreram cerca de 25 anos atrás, sem que nenhuma vítima sobrevivesse. Essa passagem de tempo é o fator mais importante, porque significa que os possíveis danos diretos às vítimas infantis haviam se atenuado. Enquanto isso, o interesse público sobre o abuso infantil permanece.
Os especialistas consultados pelo Comitê confirmaram que o abuso sexual infantil é comum no Paquistão, mas os incidentes são denunciados com pouca frequência. A maioria tomou conhecimento dos relatórios dos especialistas sobre o histórico de repressão à mídia independente e silenciamento de dissidentes no Paquistão, além da incapacidade de prevenir ou punir crimes graves contra crianças. Isso faz com que plataformas de redes sociais sejam necessárias para denunciar e receber informações sobre esse problema. Nesse caso, o documentário da VOA Urdu fez uma importante contribuição para as discussões públicas.
Uma minoria considerou que, embora o vídeo tenha levantado questões de interesse público, esses problemas poderiam ter sido discutidos em detalhes, mas sem expor os nomes e rostos das vítimas e que, portanto, o conteúdo deveria ter sido removido.
O Comitê expressa preocupação pelo tempo levado pela Meta para tomar uma decisão sobre esse conteúdo (a saber, 18 meses), de modo que, nesse período, o vídeo havia sido visualizado 21,8 milhões de vezes. O Comitê também questiona se os recursos da Meta para a avaliação de vídeo no idioma urdu são suficientes.
Embora fosse relevante nesse caso a raramente usada permissão para conteúdo de interesse jornalístico — uma exceção geral que só pode ser aplicada pelas equipes de especialistas da Meta –, o Comitê salienta que não existem exceções específicas disponíveis à Política sobre Exploração Sexual, Abuso e Nudez Infantil, como a conscientização ou a geração de denúncias. A Meta deveria fornecer mais clareza aos usuários sobre isso.
Além disso, a versão em linguagem acessível dessa política poderia deixar mais claro para as pessoas o que se qualifica como identificar as alegadas vítimas “por nome ou imagem”. Se a VOA Urdu tivesse recebido uma explicação mais detalhada da regra que estava violando, ela poderia ter republicado o documentário sem as imagens ofensivas ou, por exemplo, com os rostos desfocados das vítimas, se isso fosse permitido.
Decisão do Comitê de Supervisão
O Comitê de Supervisão revoga a decisão da Meta de remover o conteúdo e exige que a publicação seja restaurada.
Ele recomenda que a Meta:
- Crie uma nova seção dentro de cada Padrão da Comunidade, descrevendo quais exceções e permissões se aplicam. Quando a Meta tiver uma justificativa específica para não permitir certas exceções que se aplicam a outras políticas (como reportagens ou conscientização), ela deverá incluir a justificativa nessa nova seção.
*Os resumos de casos fornecem uma visão geral dos casos e não têm valor de precedente.
Decisão completa sobre o caso
1. Resumo da decisão
O Comitê de Supervisão revoga a decisão da Meta de remover a publicação do Facebook da página da Voice of America Urdu, que revela as identidades de crianças vítimas de abuso sexual e assassinato do Paquistão na década de 1990.
O Comitê acredita que a publicação violou o texto sobre Padrões da Comunidade contra Exploração sexual, nudez e abuso infantil, uma vez que houve a “identificação dos rostos e nomes das crianças vítimas de abuso sexual”. Contudo, a maioria do Comitê considera que a Meta deveria ter aplicado a permissão para conteúdo de interesse jornalístico nesse caso, uma vez que o interesse público atual no Paquistão de denunciar o abuso infantil supera os potenciais danos da identificação das vítimas de casos ocorridos há muito tempo. A minoria do Comitê acredita que era possível discutir esses problemas sem exibir os nomes e rostos das vítimas, portanto, a decisão da Meta de remover a publicação foi justificada.
Para informar melhor aos usuários sobre quando é possível abrir exceções para conscientizações, reportagens ou outras justificativas, a Meta deveria criar uma nova seção dentro de cada Padrão da Comunidade descrevendo quais exceções e permissões da política se aplicam, além de fornecer justificativa quando essas exceções ou permissões não se aplicarem. Essa seção deve informar que as permissões gerais, como a de conteúdo de interesse jornalístico, aplicam-se a todos os Padrões da Comunidade.
2. Descrição do caso e histórico
Em 28 de janeiro de 2022, a transmissora Voice of America Urdu, fundada pelo governo dos Estados Unidos, publicou, na sua página do Facebook, um videodocumentário de 11 minutos de duração sobre Javed Iqbal, que foi condenado em um tribunal paquistanês por cometer vários crimes contra crianças. O documentário continha uma análise detalhada em urdu sobre os crimes, que envolviam o abuso sexual e assassinato de aproximadamente 100 crianças na década de 1990. Ele também cobriu a prisão e o julgamento subsequentes do perpetrador.
O vídeo continha imagens de recortes de jornais de 1999 exibindo os rostos das vítimas infantis juntamente com os respectivos nomes e cidades de origem. Ele também exibia fotografias das crianças descobertas durante uma busca na casa do perpetrador. No documentário, são apresentados vários detalhes dos acontecimentos e as evidências incriminatórias encontradas no local dos crimes, incluindo tonéis com ácido nos quais os corpos foram alegadamente dissolvidos. Também há uma filmagem de pessoas chorando, as quais poderiam ser familiares das vítimas.
O documentário mencionou que Javed Iqbal confessou levar as crianças para a sua casa, onde ele as abusou sexualmente, as estrangulou até a morte e colocou seus corpos no ácido. Foi descrita a sua prisão, junto com seu jovem cúmplice, além dos julgamentos e sentenças subsequentes e, por fim, o suicídio durante a custódia.
A legenda da publicação, em urdu, mencionava que uma filmagem diferente sobre os crimes havia surgido recentemente no noticiário. A legenda também descrevia a gravidade dos crimes, alertando que o documentário continha detalhes sobre abuso sexual e violência, incluindo entrevistas com pessoas associadas ao perpetrador e seus crimes.
A página do Facebook da Voice of America Urdu tem cerca de 5 milhões de seguidores. O conteúdo foi visualizado aproximadamente 21,8 milhões de vezes, recebeu cerca de 51 mil reações e 5 mil comentários e foi compartilhado cerca de 18 mil vezes. Entre janeiro de 2022 e julho de 2023, um total de 67 usuários denunciaram o conteúdo. Após análises tanto automatizadas quanto de humanos terceirizados durante esse período, a Meta chegou à conclusão que não se tratava de um conteúdo violador.
O sistema de Operações de Análise Antecipada de Alto Risco (High Risk Early Review Operations, ou HERO, pela sigla em inglês) da Meta também sinalizou o conteúdo oito vezes entre janeiro de 2022 e 15 de julho de 2023 devido aos seus altos sinais de efeito viral. O sistema HERO foi projetado para identificar conteúdos potencialmente violadores para os quais haja uma alta probabilidade de se tornar viral. Após a identificação pelo sistema, o conteúdo passa a ter prioridade para análise humana pela equipe interna da Meta composta por especialistas em idiomas, mercado e políticas (em vez de moderadores terceirizados que analisam o conteúdo).
No final de julho de 2023, após um relatório do sistema HERO, a equipe de operações regionais internas da Meta encaminhou o conteúdo para os especialistas de política da Meta solicitando uma avaliação quanto à permissão para conteúdo de interesse jornalístico. Após essa análise em agosto de 2023, a equipe de política revogou a decisão original de manter o conteúdo ativo e o removeu por violar a política sobre Exploração, abuso e nudez infantil. A Meta não concedeu a permissão para conteúdo de interesse jornalístico para esse conteúdo por concluir que o risco potencial de danos superava o valor de interesse público. A empresa não especificou a natureza e a extensão desse risco.
A Meta não aplicou uma advertência contra a conta da rede de notícias que publicou o conteúdo, devido ao interesse público e ao contexto de conscientização do vídeo, bem como devido ao intervalo de tempo significativo entre a publicação e a remoção do conteúdo (a saber, 18 meses).
A Meta encaminhou esse caso ao Comitê por considerá-lo significativo e complexo, pois a empresa precisa “ponderar a segurança, privacidade e dignidade das crianças vítimas de abuso em relação ao faro de o vídeo não enfatizar a identidade das vítimas, de os eventos terem ocorrido há mais de 30 anos e de a produção do vídeo ter como objetivo principal conscientizar sobre os crimes de um assassino em série e discutir questões de grande interesse público”.
O Comitê observa o seguinte contexto ao tomar uma decisão sobre o caso. O espaço cívico e a liberdade de mídia são consideravelmente restritos no Paquistão. Os especialistas em direitos humanos da ONU e as organizações da sociedade civil têm destacado que o estado paquistanês tem um histórico de restrições à liberdade de mídia e de ataques àqueles que criticam as autoridades por meio de prisões e ações judiciais. Os veículos de mídia enfrentaram interferência, a revogação do patrocínio governamental e proibições contra apresentadores de televisão e contra conteúdo de transmissão. De modo semelhante, ativistas online, dissidentes e jornalistas são frequentemente alvos de ameaças e assédios patrocinados pelo governo. Meios de comunicação independentes também têm documentado como as autoridades paquistanesas solicitam que empresas de redes sociais removam conteúdo. A Meta relatou, na sua Central de Transparência, que, entre junho de 2022 e junho de 2023, a empresa fez o bloqueio geográfico de 7.665 publicações denunciadas à empresa pelas autoridades paquistanesas. O acesso local ao conteúdo foi restrito por, alegadamente, violar as leis locais, ainda que não necessariamente violassem as políticas da Meta.
Apesar das confissões escritas supostamente enviadas para a polícia local, os crimes cometidos por Javed Iqbal não foram investigados seriamente pelas autoridades. Isso só ocorreu após jornalistas paquistaneses que receberam a carta de confissão e a investigaram publicarem uma história no jornal Jang em 3 de dezembro de 1999, com os nomes e fotos de 57 das crianças alegadamente vítimas, alertando as famílias delas e gerando um alvoroço público sobre o problema. Em seguida, houve uma cobertura pública ampla e global no Paquistão e internacionalmente quanto aos crimes, à confissão de Javed Iqbal e às subsequentes prisão, condenação e suicídio.
Entre janeiro de 2022 e janeiro de 2024, filmagens, documentários e relatórios da mídia reacenderam o interesse e fomentaram discussões sobre Javed Iqbal e seus crimes. O filme “Javed Iqbal: The Untold Story of a Serial Killer,” (Javed Iqbal: a história não contada de um assassino em série, em tradução livre), que deveria ser lançado em janeiro de 2022, foi banido por vários meses pelo Órgão central de censura de filmes do Paquistão por que, de acordo com reportagens, o título glorificava Iqbal. O filme foi lançado mais tarde naquele ano, no Festival de Cinema Asiático do Reino Unido. Especialistas consultados pelo Comitê e por mídias independentes relataram que os produtores editaram o filme e mudaram seu nome para “Kukri” (baseado no apelido de Javed Iqbal), antes de levá-lo novamente para avaliação do Comitê de Censura paquistanês. O filme foi autorizado e relançado no Paquistão em junho de 2023.
O abuso sexual de crianças no Paquistão ainda é comum. De acordo com os especialistas consultados pelo Comitê,de 2020 a 2022, houve cerca de 5,4 milhões de relatos de exploração infantil online nas redes sociais paquistanesas, com base nos dados reunidos pelo Centro Nacional para Crianças Desaparecidas e Exploradas (National Center for Missing and Exploited Children, ou NCMEC, pela sigla em inglês). A NCMEC reúne denúncias de materiais sobre abuso sexual infantil em plataformas de redes sociais baseadas nos EUA, sendo 90% dessas denúncias sobre conteúdos publicados em plataformas da Meta. Sahil, uma ONG sediada em Islamabad, informa que uma média de 12 crianças por dia foram vítimas de abuso sexual no Paquistão durante o primeiro semestre de 2023. Quase 75% dos mais de 2.200 casos de 2023 foram denunciados em Punjab, a província mais populosa do Paquistão. Dois outros casos de crimes hediondos denunciados na cidade de Kasur envolveram o abuso sexual de 280 crianças cometido por uma gangue e o assassinato e abuso sexual de uma criança de seis anos de idade, com a mídia exibindo fotografias, incluindo o corpo da criança.
3. Escopo e autoridade do Comitê de Supervisão
O Comitê tem autoridade para analisar decisões que a Meta envia para análise, segundo o Artigo 2 da Seção 1 do Estatuto e a Seção 2.1.1 do Artigo 2 dos Regulamentos Internos.
De acordo com a Seção 5 do Artigo 3º do Estatuto, o Comitê pode manter ou revogar a decisão da Meta, decisão essa que é vinculante para a empresa, segundo o Artigo 4º do Estatuto. A empresa também deve avaliar a viabilidade de aplicar sua decisão no que diz respeito a conteúdo idêntico em contexto paralelo, de acordo com o artigo 4 do Estatuto. As decisões do Comitê podem incluir sugestões não vinculantes às quais a Meta deve responder, de acordo com a Seção 4 do Artigo 3 e com o Artigo 4 do Estatuto. Quando a Meta se compromete a agir de acordo com as recomendações, o Comitê monitora sua implementação.
4. Fontes de autoridade e orientação
Os seguintes padrões e as decisões precedentes fundamentaram a análise do Comitê nesse caso:
I. Decisões do Comitê de Supervisão
- Vídeo de prisioneiros de guerra armênios
- Menção do Talibã na divulgação de notícias
- Jornalista sueca denuncia violência sexual contra menores de idade
- Parecer consultivo sobre política de compartilhamento de informações residenciais privadas
- Armênios no Azerbaijão
- Sintomas de câncer de mama e nudez
II. Políticas de Conteúdo da Meta
O fundamento da política sobre exploração sexual, abuso e nudez infantil declara que a Meta não permite conteúdo que “explore sexualmente ou coloque crianças em perigo”. De acordo com essa política, a Meta remove “conteúdo que ridicularize ou identifique supostas vítimas de exploração sexual pelo nome ou por foto”.
A análise do Comitê foi fundamentada pelo compromisso da Meta com o valor "Voz", que a empresa descreve como "primordial", e seus valores de "Segurança", "Privacidade" e "Dignidade".
Permissão para conteúdo de interesse jornalístico
A Meta define a permissão para conteúdo de interesse jornalístico como uma permissão da política geral que pode ser aplicada em todas as áreas da política dentro dos Padrões da Comunidade, inclusive na Política sobre Exploração Sexual, Abuso e Nudez Infantil. Dessa forma, o conteúdo violador pode ser mantido na plataforma se o valor de interesse público for maior que o risco de danos. De acordo com a Meta, essas avaliações são feitas apenas em “casos raros”, após encaminhamento para a equipe de Política de Conteúdo. A equipe avalia se o conteúdo gera uma ameaça iminente à saúde ou segurança pública, ou dá voz às perspectivas que estão sendo debatidas atualmente como parte de um processo político. Essa avaliação considera as circunstâncias específicas de cada país, incluindo se as eleições estão em curso. Embora a identidade do autor seja uma consideração relevante, a permissão não se limita ao conteúdo publicado pelos meios de comunicação.
A Meta relatou que, de 1° de junho de 2022 a 1° de junho de 2023, apenas 69 permissões para conteúdo de interesse jornalístico foram documentadas no mundo todo. No ano anterior, foram relatados números semelhantes.
III. Responsabilidades da Meta com os direitos humanos
Os Princípios Orientadores da ONU sobre Empresas e Direitos Humanos (UNGPs, na sigla em inglês), endossados pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU em 2011, estabelecem uma estrutura voluntária de responsabilidades das empresas privadas em relação aos direitos humanos. Em 2021, a Meta anunciou sua Política Corporativa de Direitos Humanos, em que reafirmou seu compromisso em respeitar os direitos humanos de acordo com os UNGPs. Ao analisar as responsabilidades da Meta com os direitos humanos no caso em questão, as seguintes normas internacionais podem ser relevantes:
- Os direitos à liberdade de expressão: Artigo 19, Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (PIDCP). Comentário Geral nº 34, Comitê de Direitos Humanos (2011); relatórios do Relator Especial da ONU sobre liberdade de opinião e expressão, A/74/486 (2019); A/HRC/38/35 (2018); A/69/335 (2014) e A/HRC/17/27 (2011).
- O melhor interesse da criança: Artigo 3, Convenção sobre os Direitos da Criança (UNCRC); Comentário geral nº 25, Comitê dos Direitos da Criança (2021). Além disso, o Artigo 17, da UNCRC, reconhece a importante função desempenhada pelas mídias de massa sobre os direitos das crianças ao acesso à informação para a promoção da saúde física ou psicológica da criança.
- O direito à privacidade: Artigo 17 do PIDCP; Artigo 16, UNCRC.
5. Envios de usuários
O autor da publicação foi notificado sobre a análise do Comitê e teve a oportunidade de enviar uma declaração. Nenhuma resposta foi recebida.
6. Envios da Meta
De acordo com a Meta, a publicação violou o Padrão da Comunidade sobre Exploração sexual, abuso ou nudez infantil, uma vez que exibia os rostos identificáveis de crianças vítimas de exploração sexual, juntamente com os seus nomes. A Meta define um indivíduo como identificado pelo nome ou imagem se: “o conteúdo incluir qualquer das seguintes informações: (i) menção ao nome do indivíduo (nome, nome do meio, sobrenome ou nome completo), a menos que o conteúdo declare explicitamente que o nome foi inventado [ou] (ii) imagens que exibam o rosto do indivíduo”.
A Meta faz distinção entre o conteúdo que identifique vítimas adultas de vítimas infantis de abuso sexual porque as crianças têm “menos capacidade” de dar consentimento informado na identificação. Com isso, os riscos de revitimização, discriminação da comunidade e de sofrer mais violência permanecem significativos para as crianças. Portanto, a Meta não abre exceções segundo a Política sobre Exploração Sexual, Abuso e Nudez Infantil para conteúdos que identifiquem as alegadas vítimas de exploração sexual por nome ou imagem, compartilhados com o propósito de aumentar a conscientização, denunciar ou condenar o abuso.
Os defensores dos direitos da criança enfatizaram à Meta que as políticas da empresa devem priorizar a segurança da criança, especialmente em casos envolvendo aquelas que foram vítimas de agressão sexual. Outras partes interessadas externas informaram à Meta que o objetivo de evitar que menores de idade se tornem vítimas tem de superar o potencial interesse jornalístico na identificação de vítimas infantis.
O Comitê solicitou que a Meta analisasse sua decisão de não conceder uma permissão para conteúdo de interesse jornalístico nesse caso. A Meta observou que, embora o conteúdo tivesse valor de interesse público, o risco de danos devido à identificação das vítimas se mantinha significante. Ainda que os crimes tenham ocorrido na década de 1990, as vítimas identificadas eram crianças, e os abusos sofridos por elas era de natureza violenta e sexual.
Nesse caso, a Meta não aplicou uma advertência contra a conta da rede de notícias que publicou o conteúdo, devido ao interesse público e ao contexto de conscientização do vídeo, bem como devido ao intervalo de tempo significativo entre a publicação e a remoção do conteúdo.
Como resposta às perguntas do Comitê, a Meta destacou que a empresa utiliza seu sistema HERO para sinalizar proativamente o conteúdo antes que ele atinja seu pico de efeito viral usando um número de sinais diferente para identificar o conteúdo. Esse sistema prioriza a revisão e o conteúdo de ação potencial que tem a probabilidade de se tornar viral, e é uma das muitas ferramentas usadas para lidar com conteúdos virais problemáticos na plataforma.
O Comitê fez 15 perguntas à Meta por escrito. As perguntas são relacionadas às escolhas políticas da Meta em relação à Política sobre Exploração Sexual, Abuso e Nudez Infantil, o sistema de advertências da Meta e o sistema HERO. A Meta respondeu às 15 perguntas.
7. Comentários públicos
O Comitê de Supervisão recebeu quatro comentários públicos que cumpriam os termos para envio. Dois foram enviados dos Estados Unidos e do Canadá, um da Europa e um da Ásia Pacífico e Oceania. Para ler os comentários públicos enviados com consentimento de publicação, clique aqui.
Os envios cobriram os seguintes temas: a importância de proteger a privacidade e a identidade das vítimas de abuso infantil, bem como a privacidade das famílias; a relação entre a Convenção da ONU sobre os Direitos da Criança e a Política sobre Exploração Sexual, Abuso e Nudez Infantil da Meta; o contexto educacional e de conscientização do documentário; e o papel dos jornalistas em relatar crimes de abuso infantil.
8. Análise do Comitê de Supervisão
O Comitê aceitou essa indicação da Meta para avaliar o impacto dos Padrões da Comunidade da Meta sobre Exploração sexual, abuso e nudez infantil sobre os direitos das vítimas infantis, especialmente no contexto de denúncia de crimes após um período considerável. Esse caso diz respeito à proteção do espaço cívico, que está entre as prioridades estratégicas do Comitê. O Comitê examinou se esse conteúdo deveria ser restaurado analisando as políticas de conteúdo, responsabilidades em relação aos direitos humanos e valores da Meta.
8.1 Conformidade com as Políticas de Conteúdo da Meta
O Comitê concorda com a Meta de que o conteúdo, nesse caso, violou as regras explícitas do Padrão da Comunidade sobre Exploração sexual, nudez e abuso infantil, uma vez que o vídeo exibiu rostos identificáveis e os nomes das crianças vítimas de abuso.
A maioria do Comitê, porém, considera que a Meta deveria ter aplicado uma permissão para conteúdo de interesse jornalístico e permitiu que o conteúdo fosse mantido no Facebook, após encaminhamento. Para a maioria, o interesse público em informar sobre esses crimes de abuso infantil com as características desse caso superou os possíveis danos para as vítimas e suas famílias. A conclusão é altamente baseada no fato de que esse documentário foi produzido para fins de conscientização, não ridiculariza nem faz sensacionalismo sobre os assustadores detalhes relatados e, mais importante, os crimes ocorreram 25 anos atrás, sem que nenhuma vítima sobrevivesse.
Para a maioria, a passagem de um grande período de tempo foi o principal fator nesse caso. Com essa passagem de tempo, o potencial impacto sobre os direitos da criança e de suas famílias pode ser menor, enquanto o interesse público de denunciar e abordar o abuso infantil no Paquistão persiste. Nesse caso, os crimes contra essas crianças ocorreram mais de 25 anos atrás, e todas as vítimas que foram identificadas no documentário já faleceram.
O abuso infantil se manteve um problema generalizado no Paquistão (ver Seção 2) e é um importante tema de discussão pública. A maioria do Comitê considerou os relatórios dos especialistas indicando o histórico de repressão à mídia independente e silenciamento de dissidentes no Paquistão, além da incapacidade de prevenir ou punir crimes graves contra crianças. Portanto, as plataformas de redes sociais são necessárias a todas as pessoas, incluindo a imprensa, para denunciar e receber informações sobre abuso infantil no Paquistão. Esse documentário foi amplamente preciso e factual por natureza, além de sensível às vítimas. Ele foi especificamente contextualizado em relação às decisões recentes do governo quanto a censurar um filme sobre o tema e, assim, fez uma importante contribuição às discussões públicas.
Uma minoria do Comitê considera que a Meta não deveria aplicar a permissão para conteúdo de interesse jornalístico nesse caso, destacando que a proteção da dignidade e dos direitos das vítimas infantis e de suas famílias era soberana e não deveria ser impactada pela passagem de tempo ou por outras considerações apontadas pela maioria. A minoria considerou que, embora o vídeo tenha levantado questões de interesse público, esses problemas poderiam ter sido discutidos em detalhes, mas sem expor os nomes e rostos das vítimas. Consequentemente, a remoção da publicação estava em linha com os valores de privacidade e dignidade da Meta.
Ao realizar uma avaliação de interesse jornalístico, o Comitê observa que é imperativo que a Meta leve em consideração os potenciais impactos adversos sobre os direitos humanos de uma decisão sobre manter ou remover uma publicação. Essas considerações são destacadas na seção seguinte.
8.2 Conformidade com as responsabilidades da Meta relativas aos direitos humanos
A maioria do Comitê considera que a remoção dessa publicação não era necessária ou proporcional e que restaurar a publicação no Facebook é consistente com as responsabilidades de direitos humanos da Meta.
Liberdade de expressão (Artigo 19 PIDCP)
Artigo 19, parágrafo 2 do PIDCP fornece ampla proteção ao discurso político e ao jornalismo [Comentário Geral N° 34, (2011), parágrafo 11]. O Relator Especial da ONU sobre liberdade de expressão declarou que os Estados podem encorajar as organizações de mídia a autorregularem a forma como fazem a cobertura e envolvem as crianças. Citando o rascunho do conjunto de diretrizes e princípios da Federação Internacional de Jornalistas, o Relator Especial da ONU observou que ambos incluíam “disposições sobre como evitar o uso de estereótipos e a apresentação sensacionalista de histórias envolvendo crianças” (A/69/335, parágrafo 63).
Quando um Estado aplica restrições à expressão, elas devem atender aos requisitos de legalidade, objetivo legítimo e necessidade e proporcionalidade, segundo o parágrafo 3 do Artigo 19 do PIDCP. Esses requisitos costumam ser chamados de “teste tripartite”. O Comitê usa essa estrutura para interpretar os compromissos voluntários de direitos humanos da Meta, tanto em relação à decisão de conteúdo individual sob análise quanto ao que isso diz sobre a abordagem mais ampla da empresa à governança de conteúdo. Como afirmou o Relator Especial da ONU sobre liberdade de expressão, embora “as empresas não tenham obrigações governamentais, seu impacto é do tipo que exige que avaliem o mesmo tipo de questões sobre a proteção do direito de seus usuários à liberdade de expressão” (A/74/486, parágrafo 41).
I. Legalidade (clareza e acessibilidade das regras)
O princípio da legalidade conforme a legislação internacional sobre direitos humanos exige que as regras usadas para limitar a expressão sejam claras e acessíveis (Comentário Geral Nº 34, parágrafo 25). As restrições à expressão devem ser formuladas com precisão suficiente para permitir que os indivíduos regulem sua conduta em conformidade (Ibid.). No caso da Meta, a empresa deve orientar os usuários sobre quais conteúdos são e não são permitidos na plataforma. Além disso, as regras que restringem a expressão “podem não conceder discrição irrestrita aos encarregados de [sua] execução” e devem “fornecer orientação suficiente aos encarregados de sua execução para permitir-lhes determinar quais tipos de expressão são adequadamente restritos e quais não são,” (A/HRC/38/35, parágrafo 46).
O Comitê considera que a Política sobre Exploração Sexual, Abuso e Nudez Infantil, conforme a aplicada nesse caso, é clara o suficiente para satisfazer o requisito de legalidade, mas que melhorias poderiam ser feitas.
Jornalistas, como todos os usuários, devem receber orientação suficiente sobre como falar sobre tópicos complexos em plataformas de redes sociais dentro das regras. Poderia ficar mais claro às pessoas que o compartilhamento de imagens nas quais o rosto ou o nome da vítima infantil estejam visíveis não é permitido na discussão de questões relacionadas ao abuso infantil. Definições mais detalhadas sobre a identificação por meio do nome ou imagem estão incluídas nas diretrizes internas, as quais estão disponíveis apenas aos analisadores de conteúdo da Meta. O Comitê recomenda que a Meta cogite deixar mais claro o que exatamente se qualifica como identificação as alegadas vítimas “por nome ou imagem”, incluindo se “por nome” inclui partes do nome e se “imagem” significa apenas a exibição de rostos e/ou se permite rostos desfocados.
O Comitê observa que a Meta cogitou fazer mudanças à essa área da política, mas decidiu não incluir a exceção para “conscientização” segundo a Política sobre Exploração Sexual, Abuso e Nudez Infantil, alegando que essa posição estava de acordo com o melhor interesse da criança, conforme estipulado no Artigo 3 da UNCRC. A empresa observou problemas com a revitimização e a menor capacidade de as vítimas infantis concederem o consentimento informado para serem apresentadas ou referenciadas em relatórios sobre abuso infantil. No interesse da transparência e do fornecimento de orientações claras aos usuários, a Política sobre Exploração Sexual, Abuso e Nudez Infantil deve indicar claramente que não é permitida a identificação de crianças vítimas de abuso sexual, mesmo quando a intenção é denunciar, conscientizar ou condenar esse abuso. Como muitas outras políticas contam com exceções, a Meta não deve presumir que a não informação sobre a aplicabilidade de exceções seja considerada aviso suficiente de que a reportagem e defesa da mídia podem ser removidas, a menos que cumpram certas condições quanto ao respeito à dignidade e privacidade. Esse aviso poderia ser enquadrado de forma semelhante às diretrizes existentes no fundamento da política, descrevendo por que a Meta tem uma proibição geral contra o compartilhamento de, por exemplo, imagens de crianças nuas, mesmo quando a intenção dos pais dessas crianças seja inofensiva.
Essa atualização deveria indicar que a Meta poderia conceder a permissão para conteúdo de interesse jornalístico em circunstâncias altamente excepcionais. O Comitê observa que a explicação da Meta sobre essa permissão inclui um exemplo de fins de interesse público e significado histórico, a saber, a fotografia “o terror da guerra” de Phan Thị Kim Phúc, algumas vezes referida informalmente como “menina do napalm”.
O Comitê observa que as exceções à política e as permissões gerais, a saber, a permissão para conteúdo de interesse jornalístico e a tolerância à política são distintos, mas não facilmente distinguíveis. Embora o Padrão da Comunidade possa ou não permitir determinadas exceções políticas, as permissões gerais podem ser aplicadas em todas as áreas políticas presentes nos Padrões da Comunidade. Portanto, para fornecer orientação clara e acessível aos usuários, a Meta deveria criar uma nova seção dentro do Padrão da Comunidade, descrevendo quais exceções à política e permissões gerais se aplicam. Quando a Meta tiver uma justificativa específica para não conceder certas exceções que se aplicam a outras políticas (como a conscientização), ela deverá incluir a justificativa nessa nova seção. Essa seção deve informar que as permissões gerais se aplicam a todos os Padrões da Comunidade.
II. Objetivo legítimo
As restrições à liberdade de expressão devem buscar um objetivo legítimo, que inclui a proteção dos direitos de terceiros, da ordem pública e da segurança nacional.
Na decisão sobre a matéria Jornalista sueca denuncia violência sexual contra menores de idade, o Comitê concluiu que a Política sobre Exploração Sexual, Abuso e Nudez Infantil tem como objetivo prevenir o dano no meio físico aos direitos dos menores de idade. O Comitê considera que a decisão da Meta sobre esse caso e a política subjacente à remoção original têm como objetivo legítimo proteger os direitos de crianças vítimas de abuso sexual contra danos físicos e psicológicos (Artigo 17 da UNCRC), além do direito delas à privacidade (Artigo 17 do PIDCP, Artigo 16 da UNCRC), o que é consistente com o respeito aos melhores interesses da criança (Artigo 3 da UNCRC).
III. Necessidade e proporcionalidade
O princípio da necessidade e da proporcionalidade mostra que qualquer restrição à liberdade de expressão "deve ser apropriada para cumprir sua função protetora; ser o instrumento menos intrusivo entre aqueles que podem cumprir sua função protetora [e] ser proporcional ao interesse a ser protegido" (Comentário Geral N.º 34, parágrafos 33-34).
O Artigo 3 da UNCRC indica que “em todas as ações relacionadas a crianças, (...) o melhor interesse da criança deve ser uma consideração primordial”. Compatível com isso, as Diretrizes para jornalistas que fazem reportagens sobre crianças da UNICEF indicam que os direitos e a dignidade de cada criança devem ser respeitados em todas as circunstâncias e que o melhor interesse da criança deve ser protegido sob qualquer outra consideração, incluindo a defesa das questões das crianças e a promoção dos direitos delas.
O Comitê dos Direitos da Criança observou que os Estados devem respeitar todos os direitos das crianças, incluindo “ser protegidas contra danos e ter seus pontos de vista devidamente considerados” (Comentário Geral n° 25, parágrafo 2). O Comitê destacou ainda que “a privacidade é vital para a agência, dignidade e segurança das crianças e para o exercício dos seus direitos” e que “ameaças podem surgir de (...) um estranho compartilhando informações sobre uma criança” online (Comentário Geral n° 25, parágrafo 67).
O Comitê salienta que a proibição da Meta de conteúdos que identifiquem vítimas de exploração sexual de menores de idade por nome ou imagem é uma política necessária e proporcional. As circunstâncias para não cumprir essa regra serão excepcionais e exigirão uma avaliação detalhada do contexto por especialistas no assunto (para ver normas análogas ou adicionais relativas à consideração de circunstâncias excepcionais ao determinar se a identificação de pessoas em situações vulneráveis deve ser permitida, consulte o Vídeo de prisioneiros de guerra armênios).
Para a maioria do Comitê, a Meta deveria ter mantido esse conteúdo na plataforma sob permissão para conteúdo de interesse jornalístico. A maioria destaca que manter o conteúdo ativo sob a permissão para conteúdo de interesse jornalístico foi consistente com os melhores interesses da criança nesse caso, o que a Meta identifica corretamente como uma questão que deve ser de maior importância.
Para a maioria, três fatores principais e em conjunto fornecem a base para a permissão para conteúdo de interesse jornalístico. A passagem de tempo foi o principal fator nesse caso, juntamente com o fato de que todas as vítimas infantis envolvidas faleceram, o que diminui o possível dano direto a elas. Segundo, o abuso sexual de crianças continua sendo um fenômeno amplamente existente no Paquistão, apesar de serem denunciados com pouca frequência. Terceiro, o documentário em questão não faz sensacionalismo sobre o tema, mas gera conscientização de uma forma quase educacional e poderia ajudar a embasar o debate público sobre uma importante preocupação de direitos humanos que assola há muito tempo o Paquistão e outros países.
A maioria do Comitê observa que, embora as imagens e os nomes das vítimas exibidos em recortes de jornais antigos e imagens poderiam ter sido desfocados, considera-se desproporcional a remoção do documentário inteiro tendo como base todos os fatores supramencionados. Em vez disso, a Meta poderia explorar medidas alternativas para informar os usuários sobre a política relevante e fornecer soluções técnicas para evitar violações, conforme discutido abaixo. Devido a todas as combinações específicas de todos os fatores descritos acima, o documentário deveria ter recebido a permissão para conteúdo de interesse jornalístico.
Para uma minoria do Comitê, a decisão da Meta por remover o conteúdo e não aplicar a permissão para conteúdo de interesse jornalístico estava em linha com as responsabilidades de direitos humanos da Meta e era consistente com os melhores interesses da criança nesse caso. A minoria acredita que essa reportagem deveria priorizar a dignidade das crianças vítimas de abuso e garantir que seus direitos de privacidade fossem respeitados, independentemente da passagem de tempo e do presumido valor para o debate público do respectivo conteúdo.
Esses membros do Comitê destacam que, ao fazer uma reportagem sobre abuso infantil, jornalistas e organizações de mídia têm a responsabilidade ética de seguir códigos de conduta profissionais. Uma vez que as mídias sociais baseadas em engajamento podem incentivar o sensacionalismo e “caça-cliques”, uma mitigação adequada da Meta é adotar políticas de conteúdo rígidas que exijam que a mídia relate, de forma responsável, os tópicos delicados que incluam crianças. Isso estaria consistente com os padrões aplicáveis sobre direitos humanos que incentivam “relatos baseados em evidência que não revelem a identidade de crianças que sejam vítimas e sobreviventes”, (Comentário Geral n° 25, parágrafo 57) e que “incentivem a mídia a fornecer informações apropriadas sobre todos os aspectos de (...) exploração e abuso sexuais de crianças, usando a terminologia adequada, sempre protegendo a privacidade e a identidade de crianças que sejam vítimas ou testemunhas” (Diretrizes sobre o protocolo opcional à convenção sobre os direitos da criança, parágrafo 28.f).
Embora o conteúdo desse caso seja um tópico de interesse público, a minoria acredita que a Meta exigir uma adesão mais rígida aos padrões de ética jornalística permitiria que essas questões fossem relatadas de uma forma que respeitasse a dignidade e os direitos à privacidade das vítimas e das suas famílias. Uma minoria do Comitê também destaca que foi proporcional a decisão da Meta de não aplicar uma advertência à conta da organização de notícias quando ela removeu adequadamente o conteúdo.
Embora o Comitê revogue a decisão da Meta de remover essa publicação, ele se mantém alarmado por a empresa ter demorado 18 meses para tomar a sua decisão sobre um conteúdo que ela acabou considerando ser uma violação, apesar de dezenas de denúncias e relatos de usuários oriundos do próprio sistema de previsão de efeito viral da empresa. A Meta deveria investigar os motivos que levaram a isso e avaliar se seus sistemas ou recursos de análise de vídeos no idioma urdu são suficientes (consulte Menção do Talibã na divulgação de notícias). Sistemas efetivos são essenciais para garantir que essas publicações, sempre que necessário, sejam indicadas a equipes internas com o conhecimento para avaliar se há uma razão de interesse público para manter o conteúdo na plataforma. O conteúdo desse caso foi um exemplo de conteúdo viral (recebendo mais de 21,8 milhões de visualizações) que deveria ter sido detectado rapidamente, tanto para evitar danos potenciais quanto para que pudesse ser concedida uma permissão para conteúdo de interesse jornalístico.
O Comitê também observa que caso a Voice of America Urdu, a organização de mídia que publicou esse conteúdo, tivesse recebido uma explicação mais detalhada da linha política violada, ela poderia ter facilmente republicado o conteúdo editado, por exemplo, removendo os segmentos com imagens ofensivas ou desfocando os rostos das vítimas. Quanto a isso, a Meta deveria cogitar fornecer notificações mais específicas aos usuários sobre violações, em linha com a Recomendação n° 1 do Comitê em Armênios no Azerbaijão e com a Recomendação n° 2 nos casos de Sintomas de câncer de mama e nudez. Além disso, para diminuir o fardo sobre os usuários e mitigar o risco de eles colocarem crianças em risco, a Meta poderia cogitar fornecer a eles instruções mais específicas ou o acesso dentro dos seus produtos a, por exemplo, ferramentas de desfoque de rostos para vídeos para que haja uma aderência mais fácil às políticas da Meta que protegem os direitos da criança. A Meta também poderia cogitar a viabilidade de suspender esse conteúdo por um determinado período de tempo antes de ser removido permanentemente, caso não seja adequadamente editado (consulte a Recomendação n° 13 no parecer consultivo sobre política de Compartilhamento de informações residenciais privadas). O autor do conteúdo relevante poderia ser notificado que, durante o período de suspensão, ele poderá evitar a remoção subsequente do conteúdo caso use a devida ferramenta para tornar o conteúdo compatível.
9. Decisão do Comitê de Supervisão
O Comitê de Supervisão revoga a decisão da Meta de remover o conteúdo e exige que a publicação seja restaurada.
10. Recomendações
Política de Conteúdo
1. Para informar melhor os usuários sobre quando poderiam ser concedidas exceções à política, a Meta deveria criar uma nova seção dentro de cada Padrão da Comunidade, detalhando quais exceções e permissões se aplicam. Quando a Meta tiver uma justificativa específica para não permitir certas exceções que se aplicam a outras políticas (como reportagens ou conscientização), ela deverá incluir a justificativa nessa seção do Padrão da Comunidade.
O Comitê consideraria a sugestão como implementada quando o Padrão da Comunidade incluísse a seção descrita e as justificativas para as exceções que se aplicam ou não.
*Nota processual:
As decisões do Comitê de Supervisão são preparadas por grupos com cinco membros e aprovadas pela maioria do Comitê. As decisões dele não representam, necessariamente, as opiniões pessoais de todos os membros.
Para a decisão sobre esse caso, uma pesquisa independente foi solicitada em nome do Comitê. O Comitê recebeu assistência da Duco Advisors, uma empresa de consultoria especializada na intercessão entre as áreas de geopolítica, confiança e segurança, e tecnologia. A Memetica, uma organização dedicada à pesquisa de código aberto sobre tendências de redes sociais, também forneceu análises.
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