Mantido
Dieta do suco de frutas
O Comitê de Supervisão manteve as decisões da Meta de deixar ativas duas publicações em que uma mulher compartilha sua experiência direta com uma dieta composta somente de suco de frutas.
Resumo
O Comitê de Supervisão manteve as decisões da Meta de deixar ativas duas publicações em que uma mulher compartilha sua experiência direta com uma dieta composta somente de suco de frutas. O Comitê concorda que nenhuma das duas viola o Padrão da Comunidade do Facebook sobre Suicídio e Automutilação, porque elas não “fornecem instruções para perda de peso drástica e prejudicial para a saúde” nem “promovem” ou “incentivam” distúrbios alimentares. No entanto, como ambas as páginas envolvidas nesses dois casos faziam parte do Programa de Monetização para Parceiros da Meta, o Comitê recomenda que a empresa restrinja os “conteúdos relacionados a dietas extremas e prejudiciais” em suas Políticas de Monetização de Conteúdo.
Sobre os casos
Entre o final de 2022 e o início de 2023, foram publicados dois vídeos na mesma página do Facebook, descrita como apresentando conteúdo sobre a vida, a cultura e a alimentação na Tailândia. Em ambos, uma mulher é entrevistada por um homem sobre sua experiência em seguir uma dieta que consistia somente em suco de frutas. As conversas são em italiano.
No primeiro vídeo, a mulher diz ter sentido um aumento na concentração mental, melhorias na pele e na evacuação, felicidade e “feeling of lightness” (sensação de leveza) desde o início da dieta, e afirma que anteriormente sofria de problemas na pele e inchaço nas pernas. Ela menciona o tema anorexia, mas afirma que seu peso se normalizou após ter perdido inicialmente mais de 10 quilogramas (22 libras) devido às suas mudanças alimentares. Cerca de cinco meses depois, o homem entrevista a mulher novamente em um segundo vídeo, perguntando como ela se sente depois de ter seguido durante quase um ano essa dieta composta somente de suco de frutas. Ela responde dizendo ter uma aparência jovem para a sua idade, afirmando não ter perdido mais peso com exceção de “four kilos of impurities” (quatro quilos de impurezas) e incentivando-o a experimentar a dieta. Ela afirma também que se tornará uma “fruitarian” (“frutariana”) após interromper o jejum, mas que está pensando em começar uma “pranic journey” (jornada inspirada no prana), o que, segundo ela, significa viver “on energy” (de energia) em vez de comer ou beber regularmente.
Conjuntamente, as publicações foram visualizadas mais de dois milhões de vezes e receberam mais de 15 mil comentários. Os vídeos compartilham detalhes da página do Facebook da mulher, que apresentou um aumento significativo nas interações após a segunda publicação.
Após ambas as publicações terem sido denunciadas várias vezes por violarem o Padrão da Comunidade do Facebook sobre Suicídio e Automutilação, e após uma análise humana que avaliou o conteúdo como não violador, elas permaneceram no Facebook. Em seguida, um usuário diferente para cada caso fez uma apelação junto ao Comitê contra a decisão da Meta.
A página do Facebook do criador de conteúdo, na qual os dois vídeos foram publicados, e a página do Facebook da mulher que aparece nos vídeos fazem parte do Programa de Monetização para Parceiros da Meta. Isso significa que o criador de conteúdo e presumivelmente a mulher entrevistada ganham dinheiro com as publicações nas respectivas páginas quando a Meta exibe anúncios nos conteúdos correspondentes. Para que isso aconteça, as páginas precisam ter sido aprovadas em uma verificação de qualificação, e o conteúdo precisa ter cumprido tanto os Padrões da Comunidade quanto as Políticas de Monetização de Conteúdo da Meta. Em suas Políticas de Monetização de Conteúdo, a Meta proíbe que certas categorias sejam monetizadas em suas plataformas, mesmo que elas não violem os Padrões da Comunidade.
Principais conclusões
O Comitê considera que nenhuma dessas publicações viola o Padrão da Comunidade sobre Suicídio e Automutilação, porque elas não fornecem “instruções para uma perda de peso drástica e prejudicial à saúde quando compartilhadas juntamente com termos associados a distúrbios alimentares”, e “não promovem, não incentivam, não coordenam e não fornecem instruções para distúrbios alimentares”. Embora o Comitê observe que uma dieta composta somente de suco de frutas possa abranger práticas alimentares com diferentes consequências para a saúde, dependendo de sua duração e intensidade, os vídeos não incluíam nenhum sinal ou referência a distúrbios alimentares no sentido que é necessário para violar as regras da Meta. Mesmo a breve menção que a mulher faz de uma “pranic journey” (jornada inspirada no prana) — que o Comitê considera como sendo uma dieta “respiratoriana” extrema, considerada pelos especialistas como perigosa do ponto de vista médico — é de natureza descritiva, sem nenhuma menção a peso.
Embora as plataformas da Meta devam continuar a ser espaços em que os usuários possam compartilhar seu estilo de vida e suas experiências alimentares, o Comitê reconhece também que determinados conteúdos permitidos pelo Padrão da Comunidade sobre Suicídio e Automutilação podem contribuir para causar danos, mesmo não atingindo o limite que causaria sua remoção. Esses danos podem ser particularmente graves para alguns usuários, como os adolescentes, especialmente as mulheres e meninas adolescentes, que são vulneráveis com relação ao desenvolvimento de distúrbios alimentares. Neste caso, o Comitê considera que o conteúdo desses vídeos promove práticas alimentares que podem ser perigosas em algumas circunstâncias.
O Comitê observa também que, apesar de as Políticas de Monetização de Conteúdo da Meta terem um escopo geralmente amplo, os conteúdos relacionados com práticas alimentares, incluindo conteúdos relacionados com dietas extremas e prejudiciais, não estão sujeitos a monetização reduzida ou restrita. Portanto, o Comitê concorda com o fato de que nenhum dos dois vídeos viola essas políticas. Porém, o Comitê recomenda que a Meta altere essas políticas para cumprir melhor suas responsabilidades com os direitos humanos, considerando as pesquisas que mostram que determinados usuários, especialmente os adolescentes, são vulneráveis a conteúdos prejudiciais relacionados com dietas.
A maioria do Comitê considera a omissão de “conteúdos relacionados com dietas extremas e prejudiciais” como categoria restrita nas Políticas de Monetização de Conteúdo da Meta como sendo conspícua e preocupante. Levando-se em consideração que os especialistas em saúde e comunicação apontam a capacidade que os influenciadores têm de usar estilos de narração em primeira mão para obter um alto índice de engajamento com os respectivos conteúdos, e somando-se a isso a presença maciça de influenciadores da área de bem-estar, é importante que a Meta não forneça benefícios financeiros para a criação desse tipo de conteúdo. Para uma minoria do Comitê, como a desmonetização pode afetar negativamente a expressão desses temas, a Meta deveria apurar se a desmonetização é o meio menos intrusivo de respeitar os direitos dos usuários vulneráveis.
Para outra minoria de Membros do Comitê, a desmonetização é necessária mas não é suficiente; eles consideram que a Meta deveria também restringir os conteúdos relacionados com dietas extremas e prejudiciais a adultos com mais de 18 anos de idade, e explorar outras medidas, como adicionar uma etiqueta ao conteúdo para incluir informações confiáveis sobre os riscos à saúde ligados a distúrbios alimentares.
A decisão do Comitê de Supervisão
O Comitê de Supervisão mantém as decisões da Meta de deixar ativas as duas publicações.
O Comitê recomenda que a Meta:
- restrinja os conteúdos relacionados com dietas extremas e prejudiciais em suas Políticas de Monetização de Conteúdo, para evitar a criação de incentivos financeiros para que usuários influentes criem conteúdo prejudicial.
* Os resumos de casos dão uma visão geral dos casos e não têm valor precedente.
Decisão completa sobre o caso
1. Resumo da decisão
O Comitê de Supervisão mantém as decisões da Meta de deixar ativos dois vídeos publicados na mesma página do Facebook contendo uma entrevista com uma mulher sobre sua experiência de seguir uma dieta composta somente de suco de frutas. Ambos os vídeos estavam monetizados com anúncios in-stream, o que significa que o criador do conteúdo ganhava uma parte da receita do anúncio, e presumivelmente a Meta se beneficiava da receita do anúncio. A Meta avaliou os vídeos com relação aos Padrões da Comunidade e às Políticas de Monetização de Conteúdo, já que ambos se aplicam a conteúdos monetizados, e concluiu que os vídeos não violavam nenhum dos dois. Ao manter as decisões da Meta, o Comitê considera que ambas as decisões cumpriam o Padrão da Comunidade da Meta sobre Suicídio e Automutilação, porque os vídeos não continham qualquer referência a distúrbios alimentares, o que é necessário para violar a política. Além disso, o Comitê determina que essas decisões cumpriam as Políticas de Monetização de Conteúdo atuais da Meta.
No entanto, o Comitê considera também que o conteúdo desses vídeos promove práticas alimentares que podem ser perigosas em algumas circunstâncias. Para a maioria do Comitê, dado o potencial de danos, especialmente para crianças e adolescentes, a Meta deveria remover o benefício financeiro para a criação desse tipo de conteúdo. Para que a Meta cumpra suas responsabilidades com os direitos humanos, a maioria do Comitê recomenda que ela inclua “conteúdos relacionados com dietas extremas e prejudiciais” como categoria restrita em suas Políticas de Monetização de Conteúdo. Para uma minoria do Comitê, a desmonetização pode afetar negativamente a expressão desses temas, e a Meta deveria apurar se a desmonetização é o meio menos intrusivo de respeitar os direitos dos usuários vulneráveis. Alguns membros estão preocupados com o fato de a desmonetização ser uma restrição desproporcional. Para outra minoria, a desmonetização é necessária mas não é suficiente, e a Meta deveria também restringir os conteúdos relacionados com dietas extremas e prejudiciais a adultos com mais de 18 anos de idade, e explorar outras medidas, como adicionar uma etiqueta ao conteúdo para incluir informações sobre os riscos à saúde ligados a distúrbios alimentares.
2. Descrição do caso e histórico
Estes casos dizem respeito a dois vídeos publicados na mesma página do Facebook, descrita como apresentando conteúdo sobre vida, cultura e culinária na Tailândia. A Página tem cerca de 130 mil seguidores. Em ambos os vídeos, um homem entrevista uma mulher em italiano sobre sua experiência em seguir uma dieta composta somente de suco de frutas, sem qualquer alimento sólido. Cada um dos vídeos compartilha a página do Facebook da mulher no final. Com base em uma pesquisa encomendada pelo Comitê, a página do Facebook da mulher tem 17 mil seguidores, e apresenta conteúdo sobre o estilo de vida dela em questão, incluindo seus hábitos alimentares.
No primeiro vídeo, publicado no final de 2022, a mulher compartilha que sofria de problemas de pele e inchaço nas pernas, que descreveu como enormes e pesadas. Ela alega que, desde que começou a dieta composta somente de suco de frutas, sentiu um aumento na concentração mental, melhorias na pele e na evacuação, felicidade e “feeling of lightness” (sensação de leveza). Após dizer que alguns usuários poderiam comentar que isso seria anorexia, a mulher declara que mudanças na alimentação geralmente são acompanhadas por perda súbita de peso, o que explicaria por que ela inicialmente perdeu mais de dez quilogramas (22 libras). A mulher afirma que o peso dela agora está “normalized” (normalizado). Essa publicação recebeu três mil reações, cerca de mil comentários e mais de 200 mil visualizações.
No segundo vídeo, publicado no início de 2023, o mesmo homem pergunta à mesma mulher, que está extremamente magra, como ela se sente após realizar a dieta composta apenas em suco de frutas por quase um ano. Ela lamenta que vai quebrar o jejum em breve e comerá frutas sólidas. Quando questionada sobre seu peso, a mulher afirma que ela não perdeu mais, mas sim “four kilos of impurities” (quatro quilos de impurezas). Ela afirma ter uma aparência jovem para a sua idade graças à dieta e incentiva o homem a experimentar a dieta. Também diz que se tornará “fruitarian” (“frutariana”) e que deseja começar o “prana”, que ela descreve como consistindo em não comer nem beber regularmente, e sim viver “only on energy” (somente de energia). Essa publicação recebeu oito mil reações, 14 mil comentários e mais de dois milhões de visualizações. Segundo uma pesquisa encomendada pelo Comitês, a página do Facebook da mulher apresentou um aumento significativo nas interações após essa segunda publicação.
Ambas as publicações foram denunciadas várias vezes para a Meta por violar seu Padrão da Comunidade sobre Suicídio e Automutilação. Em cada caso, um usuário diferente fez uma apelação ao Comitê. As apelações iniciais dos usuários para a Meta remover o conteúdo foram encerradas automaticamente pela automação, uma vez que análises humanas anteriores consideraram que o conteúdo não era violador. Em seguida, os usuários fizeram uma nova apelação junto à Meta contra as decisões. Em ambos os casos, analistas humanos consideraram novamente ambos os vídeos como não violadores, e os deixaram no Facebook.
A página do Facebook em que os vídeos foram publicados faz parte do Programa de Monetização para Parceiros da Meta. Isso significa que o criador de conteúdo ganha dinheiro com o conteúdo que ele publica na respectiva página do Facebook quando a Meta exibe anúncios no conteúdo em questão. Isso significa que a página foi aprovada em uma verificação de qualificação, e o conteúdo publicado nessas páginas deve cumprir tanto os Padrões da Comunidade quanto as Políticas de Monetização de Conteúdo da Meta. Após a publicação de um conteúdo monetizado, ele é submetido a uma análise com base nos Padrões da Comunidade e nas Políticas de Monetização de Conteúdo da Meta. Segundo a Meta, ambos os vídeos cumpriam os Padrões da Comunidade e as Políticas de Monetização de Conteúdo. A página do Facebook da mulher incluída nos dois vídeos também faz parte do Programa de Monetização para Parceiros da Meta e presumivelmente está gerando renda por tipos semelhantes de conteúdos publicados na página dela.
O Comitê observou o contexto a seguir para tomar sua decisão sobre este caso. Em primeiro lugar, especialistas consultados pelo Comitê explicaram que os distúrbios alimentares são “problemas de saúde mental complexos caracterizados por comportamentos alimentares anormais, imagem corporal negativa e percepções distorcidas dos alimentos e do peso”. Segundo a American Psychiatric Association, a ortorexia é uma obsessão com alimentos “limpos” ou “puros”. Conforme observado pela National Eating Disorders Association, a ortorexia não é reconhecida formalmente como um distúrbio alimentar no Diagnostic and Statistical Manual 5 (Manual diagnóstico e estatístico 5).
Embora as dietas “frutarianas” e as que consistem somente em suco de frutas não sejam geralmente classificadas como distúrbios alimentares, consumir somente suco de frutas por um período prolongado pode ser um sintoma de um distúrbio alimentar. As dietas compostas somente de suco de frutas apresentam numerosos riscos à saúde, como destacam psicólogos e acadêmicos da área de dietas e nutrição que enviaram comentários públicos ou foram consultados pelo Comitê. Os impactos podem variar conforme a duração, as especificidades da dieta e a saúde individual. Além disso, algumas formas de dieta baseadas no prana envolvem alimentação, mas existe uma forma de dieta baseada no prana que consiste em viver somente da respiração ou da energia vital (denominada também “inédia” ou “respiratorianismo”). Segundo os especialistas consultados pelo Comitê, isso é considerado uma forma extrema de dieta, sem utilidade legítima para a saúde, e é perigoso do ponto de vista médico.
Em segundo lugar, uma quantidade crescente de pesquisas indicam que o uso das redes sociais, em particular o tempo e a frequência de uso, assim como a exposição a conteúdos que promovem imagens corporais idealizadas, como as tendências denominadas “fitspiration” e “thinspiration”, levam a uma insatisfação com o corpo, a distúrbios alimentares e a consequências negativas em termos de saúde mental. Conforme explicado por um estudo que examina o impacto do uso das redes sociais em adolescentes e jovens adultos, “a adolescência é um período vulnerável para o desenvolvimento de problemas de imagem corporal, distúrbios alimentares e problemas de saúde mental”. A maioria dos distúrbios alimentares começam na adolescência. Especialistas e pesquisas na área médica que documentam o aumento do número de adolescentes internados em hospitais devido a distúrbios alimentares durante a pandemia mencionam o aumento do tempo transcorrido nas redes sociais como um fator contribuinte. Os algoritmos de recomendações das redes sociais podem encaminhar os adolescentes a conteúdos mais extremos relacionados com dietas, incentivando-os a internalizar a magreza como ideal estético. Muitos jovenscontam com os influenciadores para aconselhamento nas redes sociais relacionado com saúde e forma física, apesar da falta de credenciais médicas destes. Muitos influenciadores nas redes sociais fornecem aconselhamento relacionado com saúde sob a etiqueta de “bem-estar”, fazendo uma conexão entre a beleza externa e a percepção de bem-estar.
3. Escopo e autoridade do Comitê de Supervisão
O Comitê tem autoridade para analisar a decisão da Meta após uma apelação da pessoa que denunciou previamente o conteúdo que estava ativo (Artigo 2, Seção 1 do Estatuto; e Artigo 3, Seção 1 dos Regulamentos Internos). Quando o Comitê identifica casos que geram questões semelhantes, eles podem ser atribuídos simultaneamente a um painel conjunto. Serão tomadas decisões vinculantes com relação a cada conteúdo.
De acordo com o Artigo 3 da Seção 5 do Estatuto, o Comitê pode manter ou revogar a decisão da Meta, e a decisão é vinculante para a empresa, nos termos do Artigo 4 do Estatuto. A Meta também deve avaliar a viabilidade de aplicar sua decisão no que diz respeito a conteúdo idêntico em contexto paralelo, de acordo com o Artigo 4 do Estatuto. As decisões do Comitê podem incluir sugestões não vinculantes às quais a Meta deve responder, de acordo com o Artigo 3 do Estatuto, Seção 4; Artigo 4 do Estatuto. Quando a Meta se compromete a agir de acordo com as recomendações, o Comitê monitora sua implementação.
4. Fontes de autoridade e diretrizes
Os seguintes padrões e as decisões precedentes fundamentaram a análise do Comitê neste caso:
I. Decisões do Comitê de Supervisão
As decisões anteriores mais pertinentes do Comitê de Supervisão incluem as seguintes:
- Promoção da cetamina para tratamentos não aprovados pela FDA (decisão sobre o caso 2023-010-IG-MR)
- Suspensão do ex-presidente Trump (decisão sobre o caso 2021-001-FB-FBR)
II. Políticas de conteúdo da Meta
Este caso envolve o Padrão da Comunidade da Meta sobre Suicídio e Automutilação, além das Políticas de Monetização de Conteúdo da empresa.
No Padrão da Comunidade sobre Suicídio e Automutilação, a Meta define “automutilação” como a “agressão intencional e direta ao corpo, incluindo… distúrbios alimentares”. Segundo a Meta, essa política permite que as pessoas discutam sobre automutilação, incluindo distúrbios alimentares, porque a empresa quer fornecer um “espaço onde as pessoas possam compartilhar suas experiências, chamar a atenção sobre esses temas e procurar apoio mútuo”. Certos tipos de conteúdos relacionados a distúrbios alimentares são proibidos, e duas regras são mais pertinentes para este caso. Em primeiro lugar, a Meta remove conteúdo que “inclua instruções para perda de peso drástica ou prejudicial à saúde, quando compartilhado com termos associados a distúrbios alimentares”. Em segundo lugar, a Meta remove conteúdo que “promova, incentive, coordene ou forneça instruções sobre distúrbios alimentares”.
Ambos os vídeos, que apresentavam anúncios in-stream, também estavam sujeitos às Políticas de Monetização de Conteúdo da Meta. Nessas políticas, a Meta proíbe que certas categorias de conteúdo sejam monetizadas em suas plataformas, mesmo que elas não violem os Padrões da Comunidade. Essas categorias de conteúdo podem receber monetização reduzida ou não se qualificam para monetização. Elas incluem áreas amplas, como “conteúdo questionável” e “temas sociais polêmicos”, mas nenhum dos vários exemplos por meio dessas categorias menciona qualquer tipo de dieta ou prática alimentar.
A análise do Comitê das políticas de conteúdo foi fundamentada pelo valor de “Voz” da Meta, que a empresa descreve como “primordial”, e por seu valor de “Segurança”.
III. Responsabilidades que a Meta tem com os direitos humanos
Os Princípios Orientadores da ONU sobre Empresas e Direitos Humanos (UNGPs, na sigla em inglês), endossados pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU em 2011, estabelecem uma estrutura voluntária de responsabilidades das empresas privadas em relação aos direitos humanos. Em 2021, a Meta anunciou sua Política Corporativa de Direitos Humanos, em que reafirmou seu compromisso em respeitar os direitos humanos de acordo com os UNGPs. Ao analisar as responsabilidades da Meta com os direitos humanos no caso em questão, o Comitê levou em consideração as seguintes normas internacionais:
- O direito de liberdade de opinião e expressão: Article 19, International Covenant on Civil and Political Rights (ICCPR) (Artigo 19 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos); General comment No. 34, Human Rights Committee, 2011 (Comentário geral n.º 34 do Comitê de Direitos Humanos, 2011); A/74/486; A/HRC/38/35)
- Direito à saúde: Article 12, International Covenant on Economic, Social and Cultural Rights (ICESCR) (Artigo 12 do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais); General Comment No. 14, Committee on Economic, Social and Cultural Rights, 2000 (Comentário Geral nº 14, Comitê dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, 2000); A/HRC/53/65).
- Direitos da criança: Convention on the Rights of the Child (CRC) (Convenção sobre os Direitos da Criança); General Comment no. 13, Committee on the Rights of the Child, 2011, para. 28) (Comentário geral n.º 13, Comitê dos Direitos da Criança, 2011, parágrafo 28)
5. Envios de usuário
O autor das duas publicações foi notificado sobre a análise do Comitê e teve a oportunidade de enviar declarações ao Comitê. O autor da publicação não enviou nenhuma declaração. Nas apelações ao Comitê, os usuários que denunciaram o conteúdo do caso afirmaram que o conteúdo promove um estilo de vida prejudicial para a saúde e que pode influenciar outras pessoas, em especial adolescentes, a fazer o mesmo. Eles descreveram o conteúdo como “inaccurate” (impreciso) e afirmam que ele apresenta a anorexia “as a good thing” (como algo bom), o que pode resultar em riscos à saúde das pessoas expostas ao conteúdo.
6. Envios da Meta
A Meta disse ao Comitê que nenhuma das publicações violava a regra sobre Suicídio e Automutilação que proíbe “conteúdo que inclua instruções para perda de peso drástica ou prejudicial à saúde, quando compartilhado com termos associados a distúrbios alimentares”. Segundo a Meta, as publicações não continham nenhuma referência a “perda de peso drástica ou prejudicial à saúde” nem a distúrbios alimentares. Além disso, a Meta observou que a mulher descrevia a sua experiência “mas não incitava os outros a fazerem a mesma escolha”. Respondendo a uma pergunta do Comitê, a Meta afirmou que nenhuma das duas publicações violava a linha política que proíbe “conteúdo que promova, incentive, coordene ou forneça instruções sobre distúrbios alimentares”, novamente porque nenhum dos dois vídeos mencionava qualquer distúrbio alimentar.
A Meta explicou que não quer que ocorra excesso (over-enforcement) ou falta (under-enforcement) de aplicação das regras sobre conteúdo “relacionado com a imagem corporal ou o status de saúde, porque as plataformas [da Meta] podem ser um espaço importante para que as pessoas compartilhem suas próprias experiências e jornadas relacionadas com a imagem de si mesmas e a aceitação do corpo”. Portanto, a empresa requer que haja referências a sinais ou terminologia de distúrbios alimentares para considerar que o conteúdo viola a política.
A Meta afirmou que a empresa não considera as dietas “frutarianas”, somente de suco de frutas e baseadas no prana como sendo distúrbios alimentares, com base na classificação dos distúrbios alimentares da American Psychiatric Association e na interação contínua da empresa com especialistas. A Meta disse ao Comitê que a sua equipe de Política de Segurança interage regularmente com especialistas e grupos consultivos para se informar sobre as tendências relacionadas com os distúrbios alimentares e para atualizar sua lista de sinais de distúrbios alimentares violadores. Segundo a Meta, a equipe de Operações Regionais também desempenha um papel importante para elaborar a lista de sinais de distúrbios alimentares, fornecendo exemplos de como os termos propostos são usados na plataforma. A equipe de Política de Conteúdo da Meta usa insights provenientes do trabalho da equipe de Operações Regionais para elaborar a política geral.
O Comitê fez nove perguntas à Meta por escrito Perguntas relacionadas com o modo em que a empresa define os distúrbios alimentares para aplicar a política; a justificativa para exigir que haja referências a termos de distúrbios alimentares no conteúdo para que este seja considerado com violador; todo eventual incentivo financeiro que a Meta tenha com relação ao conteúdo do caso; e o processo, a pesquisa interna e as partes interessadas consultadas, se houver, para desenvolver a política. Todas foram respondidas.
7. Comentários públicos
O Comitê de Supervisão recebeu oito comentários públicos, inclusive de especialistas em nutrição e em distúrbios alimentares das regiões dos Estados Unidos e do Canadá e da Europa. Esses comentários apontaram para as ameaças que essa dieta representa para a saúde pública e a saúde física e mental dos menores de idade.
Para ler os comentários públicos enviados sobre esse caso, clique aqui.
8. Análise do Comitê de Supervisão
O Comitê selecionou esses casos para examinar como as políticas e as práticas de aplicação de políticas da Meta abordam conteúdos relacionados com dietas, forma física e distúrbios alimentares no Facebook. O Comitê examinou se esse conteúdo deveria ser removido analisando as políticas de conteúdo da Meta, que incluem as Políticas de Monetização de Conteúdo e os Padrões da Comunidade do Facebook, além dos valores da Meta e de suas responsabilidades em relação aos direitos humanos.
8.1 Conformidade com as políticas de conteúdo da Meta
I. Regras sobre conteúdo
O Comitê considera que essas duas publicações não violam as política de conteúdo da Meta.
a. Padrão da Comunidade sobre Suicídio e Automutilação
O Comitê considera que o conteúdo destes casos não viola o Padrão da Comunidade da Meta sobre Suicídio e Automutilação. A primeira regra pertinente proíbe “conteúdo que inclua instruções para perda de peso drástica ou prejudicial à saúde, quando compartilhado com termos associados a distúrbios alimentares”, e a segunda regra pertinente proíbe conteúdo que promova, incentive, coordene ou forneça instruções sobre distúrbios alimentares.
Portanto, ambas a regras exigem que haja uma referência a um distúrbio alimentar para que ocorra violação. A orientação interna da Meta contém uma lista não exaustiva de sinais de distúrbios alimentares considerados como violadores. Ela inclui referências a distúrbios alimentares reconhecidos, termos de gíria e descrições físicas, com ênfase significativa em hashtags.
O Comitê considera que os vídeos destes casos não mencionam qualquer sinal de distúrbios alimentares ou referências a distúrbios alimentares no sentido exigido para violar a política. O Comitê considerou estes casos como desafiadores, e observa que uma dieta composta somente de suco de frutas pode cobrir uma ampla variedade de práticas alimentares com diferentes consequências para a saúde, dependendo da duração e do nível de intensidade da prática. O Comitê acredita que existem práticas alimentares prejudiciais que não atingem o limite necessário para serem removidas como distúrbios alimentares, e que ambos os vídeos estão dentro dessa margem.
Na segunda publicação, a mulher mencionou também uma dieta baseada no prana, que ela descreveu como consistindo em viver “only on energy” (somente de energia). Com base na descrição que a mulher faz da dieta, o Comitê entende que isso seria uma dieta “respiratoriana” extrema, que os especialistas consultados pelo Comitê consideram como perigosa do ponto de vista médico. No entanto, a breve referência ao prana não foi acompanhada de qualquer menção ao peso, e foi expressa de forma descritiva, o que não é a mesma coisa que a promoção, o incentivo ou a incitação para que outras pessoas adotem a mesma prática.
Portanto, o Comitê considera que nenhuma das duas publicações viola a política da Meta sobre Suicídio e Automutilação. Conforme discutido abaixo na análise das responsabilidades da Meta com os direitos humanos, o Comitê considera que, não obstante o fato de que o escopo do conteúdo proibido sujeito a remoção nessa área deveria ser estreito para permitir a discussão crítica sobre esses tópicos, a Meta deveria também adotar o meio menos intrusivo para lidar com conteúdos prejudiciais, mas não violadores de políticas, publicados por usuários influentes.
b. Políticas de Monetização de Conteúdo
Como o conteúdo destes casos incluía anúncios in-stream, as Políticas de Monetização de Conteúdo se aplicam. A Meta só revelou esse aspecto do caso depois que o Comitê a questionou sobre eventuais incentivos financeiros que a empresa pudesse ter em relação ao conteúdo do caso. Para que os usuários possam monetizar conteúdo publicado nas plataformas da Meta, eles precisam cumprir as Políticas de Monetização para Parceiros. Isso requer uma verificação inicial de qualificação da entidade e que cada publicação da entidade cumpra os Padrões da Comunidade e as Políticas de Monetização de Conteúdo.
As Políticas de Monetização de Conteúdo não são a mesma coisa que os Padrões da Comunidade. Os Padrões da Comunidade se aplicam a todo conteúdo nas plataformas da Meta, enquanto as Políticas de Monetização de Conteúdo se aplicam somente aos conteúdos que os usuários desejam monetizar. Há muitos tipos de conteúdo que a Meta proíbe monetizar, mesmo se o conteúdo é permitido sem monetização nas plataformas da Meta.
Nessas políticas, determinadas categorias de conteúdo admitem uma monetização reduzida ou simplesmente não podem ser monetizados. As categorias que podem ser restringidas ou não qualificadas para monetização incluem conteúdo que representa ou discute “temas sociais polêmicos”, conteúdo com “atividades questionáveis”, “linguagem ofensiva” e “conteúdo explícito” como “ferimentos, sanguinolência ou funções ou condições fisiológicas”. Os conteúdos não qualificados para monetização incluem “conteúdo com alegações médicas que foram refutadas por uma organização especializada”, com o exemplo específico de alegações antivacina.
Apesar de que as políticas de monetização têm um escopo que de modo geral é amplo, os conteúdos relacionados com práticas alimentares, incluindo conteúdos relacionados com dietas extremas e prejudiciais, não estão sujeitos a monetização reduzida ou restrita. Portanto, o Comitê concorda com a avaliação da Meta de que nenhum dos dois vídeos viola as Políticas de Monetização de Conteúdo da Meta. Porém, ele recomenda abaixo que a Meta altere essas políticas para cumprir melhor suas responsabilidades com os direitos humanos, considerando-se as pesquisas que mostram que determinados usuários, especialmente crianças, são vulneráveis a conteúdos prejudiciais relacionados com dietas.
8.2 Conformidade com as responsabilidades que a Meta tem com os direitos humanos
O Comitê considera que as decisões da Meta de permitir essas publicações no Facebook são compatíveis com as responsabilidades da empresa com os direitos humanos. No entanto, a maioria do Comitê considera que os conteúdos relacionados com dietas extremas e prejudiciais estão relacionados com danos à saúde pública, especificamente para alguns grupos, como as crianças, e uma abordagem que respeita os direitos significa que a empresa não deve incentivar a sua produção e difusão por meio de benefícios financeiros para que usuários influentes publiquem esse tipo de conteúdo. O Comitê observa que a Meta já reconhece, em suas Políticas de Monetização de Conteúdo, que “nem sempre um conteúdo adequado para o Facebook é necessariamente adequado para monetização”. Isso significa que a Meta decidiu não lucrar com determinados tipos de conteúdo, mesmo que eles não violem os Padrões da Comunidade. Exemplos desses tipos de conteúdo são: “atividades questionáveis”, “temas sociais polêmicos”, “linguagem ofensiva” e “conteúdo explícito”, entre outros.
Liberdade de expressão (Artigo 19 do PIDCP)
O artigo 19 do PIDCP oferece uma ampla defesa da expressão. Esse direito inclui a “liberdade de procurar, receber e difundir informações e ideias de qualquer natureza”. O acesso à informação é uma parte essencial da liberdade de expressão. O Artigo 12 do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais garante o direito à saúde, incluindo o direito a acessar educação e informação relacionadas com a saúde (PIDESC, Art. 12; Comitê dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, Comentário geral n.º 14 (2000), parágrafo 3).
Quando um Estado aplica restrições à expressão, elas devem atender aos requisitos de legalidade, objetivo legítimo e necessidade e proporcionalidade, segundo o parágrafo 3 do Artigo 19 do PIDCP. Esses requisitos costumam ser chamados de “teste tripartite”. O Comitê usa essa estrutura para interpretar os compromissos voluntários de direitos humanos da Meta, tanto em relação à decisão de conteúdo individual sob análise quanto à abordagem mais ampla da empresa à governança de conteúdo. Como afirmou o Relator Especial da ONU sobre liberdade de expressão, embora “as empresas não tenham obrigações governamentais, seu impacto é do tipo que exige que avaliem o mesmo tipo de questões sobre a proteção do direito de seus usuários à liberdade de expressão” (companies do not have the obligations of Governments, their impact is of a sort that requires them to assess the same kind of questions about protecting their users' right to freedom of expression) (A/74/486, parágrafo 41).
I. Legalidade (clareza e acessibilidade das regras)
O princípio de legalidade exige que as regras que limitam a expressão sejam acessíveis e claras, tanto para quem aplica as regras como para quem é afetado por elas (Comentário geral n.º 34, parágrafo 25). As regras que restringem a expressão “podem não conceder liberdade de ação irrestrita para a restrição da liberdade de expressão aos encarregados de [sua] execução” e devem “fornecer instrução suficiente aos encarregados de sua execução para permitir-lhes determinar quais tipos de expressão são propriamente restritas e quais tipos não são” (Ibid). Aplicada às regras sobre as plataformas que regem o discurso online, o Relator Especial da ONU sobre liberdade de expressão disse que eles deveriam ser claros e específicos (A/HRC/38/35, parágrafo 46). As pessoas que usam as plataformas da Meta devem ser capazes de acessar e entender as regras, e os moderadores de conteúdo devem ter orientações claras sobre sua aplicação.
O Comitê avaliou duas regras contidas na política da Meta sobre Suicídio e Automutilação: (i) conteúdo que inclua instruções para perda de peso drástica ou prejudicial à saúde, quando compartilhado com termos associados a distúrbios alimentares; e (ii) conteúdo que promova, incentive, coordene ou forneça instruções sobre distúrbios alimentares. Ambas exigem uma referência a distúrbios alimentares, e a Meta fornece a seus analistas orientações internas para fazer essa determinação.
Embora a Meta afirme que essa lista é “não exaustiva” e não se concentra em um formato específico, os exemplos fornecidos na lista são quase exclusivamente no formato de hashtag. É possível que os moderadores de conteúdo que implementam essa política e usam as diretrizes internas como referência concentrem sua aplicação e remoção nesse tipo de conteúdo mais explícito. Para o Comitê, isso dá a impressão de que as categorias de conteúdos proibidos, que parecem relativamente amplas nos padrões públicos, tenham, na prática, um escopo mais limitado. Essa aparente incoerência dá lugar a sérias preocupações relacionadas com a legalidade, embora, ao serem aplicadas às publicações em questão, as regras públicas tenham providenciado aviso suficiente aos usuários, e os Padrões da Comunidade e as regras internas tenham providenciado orientação suficiente para os moderadores de conteúdo.
II. Objetivo legítimo
Segundo o Artigo 19, parágrafo 3 do PIDCP, a expressão pode ser restringida por uma lista de motivos definida e limitada. Nestes casos, o Comitê considera que o Padrão da Comunidade sobre Suicídio e Automutilação que proíbe conteúdo sobre distúrbios alimentares contribui para o objetivo legítimo de proteger a saúde pública e respeitar os direitos dos outros à saúde física e mental, especialmente de crianças.
III. Necessidade e proporcionalidade
O princípio da necessidade e da proporcionalidade mostra que qualquer restrição à liberdade de expressão “deve ser apropriada para cumprir sua função protetora; ser o instrumento menos intrusivo entre aqueles que podem cumprir sua função protetora [e] ser proporcional ao interesse a ser protegido” (Comentário Geral nº 34, parágrafo 34).
O Comitê considera que a abordagem atual da política sobre Suicídio e Automutilação de exigir um sinal de distúrbio alimentar seja uma restrição adequada à liberdade de expressão para proteger a saúde pública e respeitar o direito dos outros à saúde, permitindo ao mesmo tempo que os usuários discutam e debatam nas plataformas da Meta sobre assuntos relacionados com a saúde. Sem essa exigência, a Meta acredita, e o Comitê concorda, que a política poderia ser excessivamente ampla em escopo e poderia restringir indevidamente a liberdade de expressão e o acesso à informação sobre assuntos relacionados com a saúde pública, incluindo informações sobre dietas prejudiciais à saúde e distúrbios alimentares.
O Comitê considera que as plataformas da Meta devam continuar a ser um espaço em que os usuários possam compartilhar suas experiências positivas e negativas a respeito de estilos de vida específicos e dietas específicas. É importante notar, como observam os especialistas consultados pelo Comitê, que os distúrbios alimentares são distúrbios mentais, e os hábitos alimentares e as dietas podem ser sintomas de um distúrbio alimentar, mas não indicadores conclusivos da presença de um distúrbio alimentar. Portanto, o Comitê considera que a remoção do conteúdo do caso não seria compatível com o direito à liberdade de expressão e o direito de acessar, procurar e compartilhar informações relacionadas com a saúde.
Ao mesmo tempo, o Comitê reconhece também que um conteúdo permissível segundo essa política pode contribuir para gerar danos, mesmo se o conteúdo não atinge o limite de danos que justificaria a sua remoção. Neste caso, os danos podem ser particularmente graves para alguns usuários, incluindo crianças. Nas apelações ao Comitê, os usuários que denunciaram o conteúdo afirmaram que ele promove um estilo de vida prejudicial para a saúde e que pode influenciar outras pessoas, em especial adolescentes, a fazer o mesmo. Eles descreveram o conteúdo como “inaccurate” (impreciso) e afirmam que ele apresenta a anorexia “as a good thing” (como algo bom), o que pode resultar em riscos à saúde das pessoas expostas ao conteúdo. Como observado pelos comentários públicos e pelos especialistas consultados pelo Comitê, os adolescentes são particularmente vulneráveis ao desenvolvimento de um distúrbio alimentar, já que a maioria dos distúrbios alimentares começam na adolescência.
O Comitê da ONU sobre os Direitos da Criança declarou que os direitos das crianças envolvem a liberdade com relação a todas as formas de violência, incluindo a autoagressão, que inclui os distúrbios alimentares (Comentário Geral n.º 13 (2011), parágrafo 28). O Comitê da ONU destacou também os riscos relacionados à exposição das crianças a “anúncios efetivamente ou potencialmente prejudiciais” online (Comentário Geral n.º 13 (2011), parágrafo 31).
Os UNGPs estabelecem que as empresas devem prevenir e mitigar os impactos adversos sobre os direitos humanos diretamente ligados a seus produtos, serviços e atividades (Princípio 13). Também com relação a isso, o Artigo 17 da Convenção dos Direitos da Criança reconhece a importância da mídia para o “bem-estar social, espiritual e moral e a saúde física e mental” das crianças. O Comitê da ONU sobre os Direitos da Criança indicou que o Artigo 17 “descreve a responsabilidade das organizações de meios de comunicação de massa. No contexto da saúde, elas podem… incluir a promoção da saúde e de estilos de vida saudáveis entre as crianças… promovendo o acesso à informação; não produzindo programas de comunicação prejudiciais às crianças e à saúde geral [entre outras responsabilidades]” (Comentário Geral n.º 15, parágrafo 84).
O Comitê tem expressado regularmente o parecer de que a Meta deve explorar os meios menos intrusivos para lidar com conteúdo prejudicial em suas plataformas. O Comitê observou especificamente que “desenvolver mecanismos eficazes para evitar a amplificação do discurso que gera riscos” faz parte dessa responsabilidade (Caso de suspensão do ex-presidente Trump). Neste caso, o Comitê reconhece que as políticas de monetização afetam a liberdade de expressão e outros direitos humanos dos usuários. Para a maioria do Comitê, fornecer um benefício financeiro a usuários influentes para produzir conteúdos que promovem dietas prejudiciais incentiva a criação e a amplificação desses conteúdos. A remoção desse incentivo está dentro do controle da empresa e é compatível com a abordagem atual da Meta com relação a outros tipos de conteúdo que não violam os Padrões da Comunidade, mas que a empresa restringe em conformidade com as Políticas de Monetização de Conteúdo.
Acadêmicos da área de comunicação e especialistas da área de saúde têm enfatizado que a capacidade dos influenciadores de atrair e persuadir encontra-se na sua adoção de estilos de comunicação que dão a percepção de que eles são exatamente como pessoas quaisquer. Como constatado nesse conteúdo, em vez de incitar diretamente os usuários a executarem atos específicos, os influenciadores narram suas histórias pessoais ou mostram, por meio de experiências diretas, os supostos benefícios de mudanças na dieta e no estilo de vida. Esse estilo ajuda os usuários influentes a produzirem conteúdos que serão objeto de um alto engajamento, o que é particularmente atraente quando eles procuram monetizar conteúdo. Considerando a ubiquidade dos influenciadores da área de bem-estar nas plataformas da Meta, assim como o amplo conjunto de conteúdos com os quais a Meta renuncia a obter lucro em conformidade com as Políticas de Monetização de Conteúdo, a omissão dos conteúdos relacionados com dietas prejudiciais é conspícuo e preocupante.
O Comitê recomendou anteriormente que a Meta revise suas políticas sobre conteúdo de marca para “esclarecer o significado do rótulo ‘parceria paga’ e assegurar que os moderadores de conteúdo estejam equipados para aplicar as políticas sobre conteúdo de marca quando pertinente” (caso “Promoção da cetamina para tratamentos não aprovados pela FDA”). De forma semelhante, a maioria do Comitê recomenda, no caso em questão, que a Meta inclua “conteúdos relacionados com dietas extremas e prejudiciais” como categoria restrita em suas Políticas de Monetização de Conteúdo.
Essa decisão gerou várias opiniões minoritárias diferentes. Para um grupo da minoria, a desmonetização pode afetar negativamente a liberdade de expressão. Para essa minoria, mesmo pressupondo que a Meta tenha a responsabilidade de mitigar o risco de danos potenciais indiretos em usuários vulneráveis por meio da desmonetização, essa abordagem poderia resultar em uma ampla restrição da expressão que diminuiria a oportunidade de os usuários procurarem e compartilharem informações. Portanto, a desmonetização é sujeita a requisitos de proporcionalidade. A Meta deveria apurar se a desmonetização é o meio menos intrusivo para assegurar o respeito dos direitos de usuários vulneráveis.
Para outra minoria, a desmonetização é necessária, mas não suficiente; a Meta deveria também restringir os conteúdos relacionados com dietas extremas e prejudiciais a adultos com mais de 18 anos de idade, e explorar outras medidas, como adicionar uma etiqueta ao conteúdo com informações confiáveis sobre os riscos à saúde ligados a distúrbios alimentares. Para esses Membros do Comitê, considerando-se a quantidade crescente de pesquisas (descritas na seção 2 acima) que indicam que o uso das redes sociais, a exposição a corpos idealizados e as tendências denominadas “fitspiration” e “thinspiration” levam a uma insatisfação com o corpo, a distúrbios alimentares e a desfechos negativos em termos de saúde mental, especialmente para mulheres e meninas adolescentes, é necessário e adequado que a Meta modifique o Padrão da Comunidade sobre Suicídio e Automutilação. A ubiquidade dos conteúdos relacionados com beleza, dietas e forma física nas redes sociais, juntamente com algoritmos de recomendações que os agrupam e os promovem ainda mais, tornam real e grave o risco desse tipo de conteúdo para a saúde mental e física dos usuários jovens. Assegurar que as políticas da Meta lidem com conteúdos relacionados com dietas prejudiciais é particularmente necessário em virtude do fato de que usuários influentes muitas vezes enquadram práticas dietéticas extremas em termos de alimentação “saudável” ou “limpa”, sem jamais se referirem explicitamente a um distúrbio alimentar. Para esses Membros do Comitê, a abordagem atual da Meta no Padrão da Comunidade sobre Suicídio e Automutilação não lida com essa realidade. Restringir os conteúdos relacionados com dietas extremas e prejudiciais aos adultos e fornecer mais informações aos usuários sobre possíveis efeitos sobre a saúde assegura que o impacto sobre a liberdade de expressão seja o menos intrusivo possível, lidando ao mesmo tempo com o risco de danos às crianças.
9. Decisão do Comitê de Supervisão
O Comitê de Supervisão mantém as decisões da Meta de deixar ativas as duas publicações no Facebook.
10. Recomendações
Política de conteúdo
1. Com a finalidade de não criar incentivos financeiros para que usuários influentes criem conteúdo prejudicial, a Meta deveria restringir os conteúdos relacionados com dietas extremas e prejudiciais em suas Políticas de Monetização de Conteúdo.
O Comitê considerará a recomendação implementada quando as Políticas de Monetização de Conteúdo da Meta tiverem sido atualizadas no sentido de incluírem uma definição e exemplos daquilo que constitui um conteúdo relacionado com dietas extremas e prejudiciais, da mesma forma em que ela define e explica outras categorias restringidas pelas Políticas de Monetização de Conteúdo.
*Nota processual:
As decisões do Comitê de Supervisão são preparadas por grupos com cinco membros e aprovadas pela maioria do Comitê. As decisões do Comitê não representam, necessariamente, as opiniões pessoais de todos os membros.
Para a decisão sobre esse caso, uma pesquisa independente foi solicitada em nome do Comitê. O Comitê recebeu assistência da Duco Advisors, uma empresa de consultoria especializada na intercessão entre as áreas de geopolítica, confiança e segurança, e tecnologia. A Memetica, uma organização dedicada à pesquisa de código aberto sobre tendências nas redes sociais, também forneceu análises, além de ter auxiliado o Comitê.
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